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Mistérios elucidados sobre os maçons

Entramos num templo maçom, bisbilhotamos cada canto e comprovamos: a sociedade secreta já não é tão secreta assim - mas continua uma das mais influentes do mundo

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Atualizado em 31 out 2016, 18h54 - Publicado em 31 out 2008, 22h00

Texto Eduardo Szklarz, de Buenos Aires

A maçonaria já foi acusada de tudo: fazer rituais sinistros, promover orgias, querer dominar o mundo… Até de estar por trás dos assassinatos de Jack, o Estripador. Muita gente acredita que a organização controla governos e que seus integrantes usam cargos públicos para se ajudar mutuamente. Os maçons, no entanto, garantem que quase tudo isso é besteira. Eles não passariam de um grupo filosófico, filantrópico e progressista. Reconhecem que ajudam uns aos outros, mas que o dever de auxiliar um irmão está sempre sujeito à obrigação maior de cumprir a lei. Afinal, qual é a verdade sobre essa sociedade secreta?

Para começar, a maçonaria não é tão secreta assim. Em vários países, inclusive no Brasil, todo mundo sabe onde ficam as lojas maçônicas e quem são seus membros. Maçons publicam revistas e divulgam suas idéias em sites da internet. E, se antes mantinham seus templos imersos numa aura de mistério, hoje permitem visitas. Nossa reportagem entrou no templo da Grande Loja da Argentina de Maçons Livres e Aceitos, situada na rua Perón, 1242, em Buenos Aires. Durante 3 horas, conversamos com diversos integrantes da maçonaria – e muitos nos entregaram cartões em que se identificavam como membros da ordem.

A julgar por iniciativas desse tipo, parece que a organização nunca foi tão aberta como hoje. Será que o grande segredo da maçonaria é não ter segredo algum, como dizem alguns irmãos? Pode ser. Mas o certo é que eles ainda mantêm sessões a portas fechadas. Angel Jorge Clavero, grão-mestre da Grande Loja da Argentina, tem uma explicação para isso. “A maçonaria não é secreta, mas discreta. As cerimônias que realizamos aqui só interessam a nós, são reservadas aos iniciados.” Para Clavero, é exatamente o que ocorre em qualquer reunião, seja de condomínio ou da diretoria de uma multinacional. “Se você não é dono de um apartamento no prédio ou diretor da empresa, não vão deixá-lo entrar.

VÁRIAS MAÇONARIAS

O argumento do grão-mestre faz sentido. Por outro lado, diretores de empresas não costumam se reunir para debater filosofia, vestidos com aventais coloridos e rodeados de objetos simbólicos. Além disso, nem você nem seus vizinhos de apartamento precisam jurar segredo absoluto sobre o que foi discutido na reunião de condomínio. Na maçonaria, é assim que as coisas funcionam. Para entender os porquês disso tudo, o primeiro passo é levar em conta que não existe uma só, mas várias maçonarias.

A organização é uma rede global, hoje composta de cerca de 6 milhões de integrantes espalhados pelos 5 continentes. Os rituais variam muito, de um país para outro. Cada loja tem autonomia, mesmo que pertença a uma federação nacional ou continental. Algumas usam a Bíblia em suas reuniões. Outras, a Torá ou o Alcorão. Essa diversidade permite que os símbolos maçônicos tenham várias interpretações. E foi graças a ela que personalidades extraordinariamente distintas já vestiram o avental da irmandade: de Mozart a dom Pedro 1º, de Winston Churchill a Hugo Chávez (leia mais no quadro das págs. 14 e 15).

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Mas as maçonarias também têm muito em comum. Todas elas, independentemente do país, defendem os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. Veneram o Grande Arquiteto do Universo – como se referem a Deus. E exigem requisitos dos iniciados, que, depois de passar por uma cerimônia de iniciação, vão galgando postos e acumulando mais e mais conhecimentos. Embora proíbam falar de política e religião dentro do templo, os maçons continuam tendo o poder e a influência de sempre. A mesma que eles usaram para orquestrar capítulos decisivos da história, como a independência do Brasil, dos EUA e de quase todos os países da América Latina.

A origem da maçonaria é um mistério até para os maçons. Uma das teorias diz que ela surgiu há cerca de 3 mil anos, durante a construção do Templo de Salomão, em Jerusalém. O rei israelita teria recrutado o arquiteto Hiram Abif, mestre na arte de talhar pedras, que ensinava os mistérios do ofício apenas a pedreiros escolhidos a dedo. No fim da obra, 3 artesãos exigiram que ele lhes contasse os segredos. Abif recusou-se e acabou sendo assassinado por isso.

O martírio do arquiteto jamais foi comprovado. Mesmo assim, significa muito para os maçons. Em The Meaning of Masonry (“O Significado da Maçonaria”, inédito no Brasil), o maçom britânico W.L. Wilmshurst interpreta a morte do mestre como um desastre moral para a humanidade – como se a chama do conhecimento tivesse sido apagada. “Agora, neste mundo escuro, ainda temos os 5 sentidos e a razão, que vão nos proporcionar os segredos substitutos”, escreve Wilmshurst. A maçonaria, portanto, seria um sistema filosófico que discute o Universo e nosso lugar dentro dele. Quanto mais o maçom sobe os degraus da confraria, mais perto ele chega da Luz – ou seja, o pensamento racional.

Outra tese afirma que os maçons são herdeiros dos templários, os cavaleiros que viajaram à Terra Santa no século 12 para defender os cristãos, mas acabaram perseguidos pela Igreja. E existe também quem defenda uma origem ainda mais remota, no Egito dos faraós ou na Grécia antiga. Para a maior parte dos historiadores , contudo, foi na Europa medieval que a maçonaria assentou suas bases. Ela teria começado na forma de sindicatos de pedreiros (masons, em inglês), que construíam monumentos para religiosos e monarcas – entre eles a Ponte de Londres e a Catedral de Westminster, também na capital da Inglaterra.

“Os pedreiros ingleses almoçavam e deixavam suas ferramentas em pequenas casas chamadas lodges [lojas]”, explica o jornalista americano H. Paul Jeffers no livro Freemasons (“Maçons”, sem tradução para o português). Assim como Abif, eles mantinham em segredo seus métodos de construção, pois eram a garantia de melhores salários.

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Esses sindicatos floresceram até o século 16, quando os pedreiros tiveram uma surpresa. Abalada pela Reforma Protestante e pela rixa com o rei Henrique 8º, a Igreja parou de construir catedrais. Resultado: contratos para novas obras minguaram. “A maçonaria entrou em crise e sofreu uma grande mudança. Tudo que era ligado à prática do ofício na pedra passou a ser alegórico, e as ferramentas viraram símbolos na contemplação dos mistérios da vida”, diz Jeffers. A ordem deixou de ser “operativa” para ser “especulativa”. E as lojas maçônicas passaram a interpretar esses símbolos por meio de conceitos morais, éticos e filosóficos. A sociedade foi aberta a outros profissionais, como os cientistas, e deixou-se influenciar até pela alquimia.

Em 1717, 4 lojas de Londres se uniram na Grande Loja Unida da Inglaterra, que marcou o início da maçonaria atual. Em 1723, o maçom James Anderson compilou a tradição oral da irmandade numa constituição, cujos lemas eram ciência, justiça e trabalho. Quem não gostou de nada disso foi a Igreja, sentindo seu poder ameaçado por um grupo que rejeitava dogmas, aceitava seguidores de outras crenças e era contra a influência da religião na vida pública. Pior: discutia seus assuntos em segredo, o que só aumentava a desconfiança da Santa Sé. Em 1738, o papa Clemente 12 emitiu uma bula em que excomungava a maçonaria – ratificada em 1983 pelo cardeal Joseph Ratzinger, atual papa Bento 16.

O tiro saiu pela culatra. Quanto mais a maçonaria era difamada, mais ela atraía revolucionários – entre eles, o libertador sul-americano Simon Bolívar e o herói da independência americana Benjamin Franklin. A Revolução Francesa também assumiu os valores maçônicos, mas não com a intensidade que muitos imaginam. “Do mesmo jeito que alguns revolucionários franceses eram maçons, como Jean-Paul Marat, alguns opositores da revolução também eram”, diz o historiador inglês Jasper Ridley no livro The Freemasons (“Os Maçons”, inédito no Brasil). No século 20, a Igreja continuaria no encalço da maçonaria.

CÓDIGOS SECRETOS

A história de perseguição explica por que os maçons desenvolveram códigos para se reconhecer no meio de outras pessoas. No aperto de mão, por exemplo, um tocaria com o indicador no pulso do outro. Ao se abraçar, eles colocariam um braço por cima, outro por baixo, em X, e bateriam 3 vezes nas costas. Mais uma forma de comunicação em lugares públicos seria ficar em posição ereta e com wos pés em forma de esquadro.

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Em seus textos, os maçons abreviam as palavras usando 3 pontos em forma de delta. Exemplos: “Ir” é irmão, “Loj” é loja. Hoje, boa parte desses segredos já virou de domínio público. Tanto que o termo usado pelos maçons para se referir a Deus – Jahbulon, resultado da união dos nomes Javé, Baal e Osíris – aparece em quase 30 mil páginas na internet.

Para ingressar na maçonaria, é necessário ter ficha limpa, ser maior de idade e acreditar em um deus, seja ele qual for. O candidato precisa ser convidado por um maçom e só se torna aprendiz após ser aceito numa cerimônia de iniciação no templo, onde se compromete a não revelar o que escutar ali dentro.

“Nossa meta é formar homens melhores, ensiná-los a se libertar dos dogmas e a pensar por si mesmos”, diz o grão-mestre argentino Jorge Clavero. “A maçonaria não é como um partido político, que fixa posições. Ela atua na sociedade por meio de seus homens, silenciosamente. O iniciado faz sua obra entre a família, os amigos e em seu local de trabalho.”

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Degraus do conhecimento

No Brasil, o rito mais praticado é o escocês, mas o de York prevalece no resto do mundo

RITO ESCOCÊS

1º grau – Aprendiz iniciado

2º grau – Companheiro de ofício

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3º grau – Mestre maçom

4º grau – Mestre secreto

5º grau – Mestre perfeito

6º grau – Secretário íntimo

7º grau – Preboste e juiz

8º grau – Intendente dos edifícios

9º grau – Mestre eleito dos 9

10º grau – Mestre eleito dos 15

11º grau – Cavaleiro eleito dos 12

12º grau – Grão-mestre arquiteto

13º grau – Mestre do 9º arco

14º grau – Grão-eleito perfeito e sublime

15º grau – Cavaleiro do Oriente

16º grau – Príncipe de Jerusalém

17º grau – Cavaleiro do Oriente e do Ocidente

18º grau – Cavaleiro Rosacruz

19º grau – Grão-pontífice

20º grau – Mestre ad Vitam

21º grau – Patriarca noaquita

22º grau – Príncipe do Líbano

23º grau – Chefe do tabernáculo

24º grau – Príncipe do tabernáculo

25º grau – Cavaleiro da serpente de bronze

26º grau – Príncipe da mercê

27º grau – Comendador do templo

28º grau – Cavaleiro do Sol

29º grau – Cavaleiro de Santo André

30º grau – Cavaleiro kadosh

31º grau – Grão-inspetor inquisidor comendador

32º grau – Sublime príncipe do real segredo

33º grau – Soberano grão-inspetor geral

RITO DE YORK

Mestre de marca

Past master (virtual)

Mui excelente mestre

Maçom do real arco

Mestre real

Mestre eleito

Mestre superexcelente

Ordem da Cruz Vermelha

Ordem dos Cavaleiros de Malta

Ordem dos Cavaleiros Templários

Rumo ao topo da pirâmide

A escalada na hierarquia pode levar uma vida inteira

A estrutura da maçonaria tem a forma de duas escadas que começam e terminam juntas. O 1º passo do candidato é se tornar aprendiz. O 2º nível é o de companheiro de ofício e o 3º, de mestre maçom. Os 3 degraus iniciais são comuns ao rito escocês e ao de York. Depois disso, quem quiser subir na hierarquia deve escolher entre os dois sistemas ritualísticos. No escocês são 33 graus, enquanto o de York tem apenas 10. A história dos ritos também é diferente: para muitos estudiosos da maçonaria, o ritual escocês foi fundado na França por imigrantes que fugiam de perseguições. Já o de York surgiu na cidade inglesa de mesmo nome, onde teria sido aberta a primeira loja maçônica da Grã-Bretanha. No Brasil, o rito mais praticado é o escocês, mas estima-se que 85% dos maçons em todo o mundo pratiquem o de York.Alguns personagens importantes da tradição maçônica aparecem sobre os degraus desta ilustração, publicada pela primeira na revista americana Life, em 1956. Entre eles, o rei Salomão (indicando o caminho na base do rito escocês), que construiu o 1º Templo de Jerusalém, e George Washington (no 20º grau do mesmo rito, mestre ad Vitam), primeiro presidente dos EUA. Sob o arco estão as organizações irmãs da maçonaria. Mestres maçons são aceitos na Grotto e na Altos Cedros do Líbano. Meninas que têm um maçom na família podem ingressar na Filhas de Jó ou na Ordem das Garotas do Arco-Íris; mulheres, na Estrela do Oriente; e rapazes, na DeMolay. Apenas maçons de grau 32 e Cavaleiros Templários podem entrar para o Shrine. E a mulher de um Shrine pode ser uma Filha do Nilo.

Até na lua!

De presidente a astronauta, maçons que entraram para a história

GEORGE WASHINGTON – 1732-1799

Foi o primeiro e único a exercer ao mesmo tempo os cargos de mestre de uma loja e presidente dos EUA. Um terço dos presidentes americanos foram da maçonaria.

AMADEUS MOZART – 1756-1791

Um dos maiores compositores de todos os tempos, ingressou na maçonaria a convite de Joseph Haydn, outro gênio da música, membro de uma loja em Viena.

DOM PEDRO 1º – 1798-1834

Chegou ao posto de grão-mestre no Brasil. Deixou a maçonaria assim que foi declarado imperador e proibiu os trabalhos da organização no país, temendo que seu poder fosse contestado.

WINSTON CHURCHILL – 1874-1965

Primeiro-ministro britânico durante a 2ª Guerra Mundial, foi iniciado em 1901, aos 26 anos de idade, na loja maçônica Studholme, em Londres, quando já era parlamentar.

HUGO CHÁVEZ – 1954-

Iniciado por um guarda-costas, segue os passos de outros maçons históricos que ele adora citar em discursos, entre eles: Simon Bolívar, José Martí e San Martín.

NEIL ARMSTRONG – 1930-

O primeiro homem a pisar na Lua era maçom. Ele teria vestido seu avental sobre o traje lunar durante a missão da Apolo 11, mas não há provas de que isso realmente tenha acontecido.

Para saber mais

• Freemasons

H. Paul Jeffers, Kensington Publishing, 2005 (em inglês).

Por dentro do templo maçônico

Um passeio pela Grande Loja da Argentina de Maçons Livres e Aceitos, com explicação para tudo que você veria lá dentro

• ALTAR

Corresponde ao Santo dos Santos, o lugar mais sagrado do antigo Templo de Jerusalém. A poltrona central é usada apenas pelo venerável-mestre, que conduz os rituais.

• COMPAS E ESQUADRO

Remetem ao tempo em que os maçons eram pedreiros. Por desenhar círculos perfeitos, o compasso representa a busca da perfeição. Já o ângulo reto do esquadro sugere honestidade. A letra “G” vem de God – “Deus” em inglês.

• L E CÉU AZUL

São vários os significados atribuídos ao Sol na maçonaria. Rente ao teto do templo, ele pode ser interpretado como conhecimento e esclarecimento mental ou intelectual. O céu azul simboliza a natureza e o Universo.

• CIÊNCIA, JUSTIÇA E TRABALHO

Os 3 adultos à esquerda, neste quadro do italiano Enrique Fabris, representam a ciência (ancião com a tocha da razão), a justiça (mãe carregando o filho) e o trabalho (homem vigoroso com ferramentas). A esfinge central refere-se à sociedade iniciática e o longo caminho a ser seguido pelo homem na busca do conhecimento. O Sol simboliza a natureza, presente em seus 4 elementos: água, fogo, ar e terra. Deles, apenas a água não pode ser dominada pelo homem – daí o mar revolto no quadro.

• AVENTAL

Símbolo de trabalho, ele protege o maçom e indica seu grau (na foto, Angel Jorge Clavero, grão-mestre da Loja Argentina de Maçons Livres e Aceitos). As luvas, sempre brancas, significam pureza, retidão moral e igualdade.

• ESTRELA DO ORIENTE

Com 5 pontas, ela simboliza o homem em seus 5 aspectos – físico, mental, emocional, intuitivo e espiritual. Ao fundo, observa-se a pirâmide com o olho que tudo vê, uma alusão a Deus.

• PI XADREZ

Representa povos do mundo unidos pela maçonaria. Os triângulos e quadrados simbolizam a harmonia que pode existir na diversidade. Também sintetizam os contrários: Bem e Mal, corpo e espírito.

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