Nosso cérebro está encolhendo. Mas há populações humanas cada vez mais resistentes a doenças e ao ar rarefeito de grandes altitudes. Será que a civilização nos tornou imunes à seleção natural? Ou nossa espécie ainda muda?
Texto: Bruno Vaiano | Design: Juliana Krauss | Ilustrações: Guilherme Henrique | Edição: Alexandre Versignassi
Em 2002, o arqueólogo Michel Brunet descreveu o crânio de um primata que viveu há 7 milhões de anos no atual território do Chade, na África. O Sahelanthropus tchadensis tinha um terço do volume cerebral humano, e uma espessa arcada óssea sob as sobrancelhas. Lembrava, em certos aspectos, um chimpanzé.
Mas com uma peculiaridade: o forame magno – buraco por onde a medula espinhal entra na cabeça – ficava na base do crânio, e não atrás. Indício de postura ereta: a cabeça ficava em cima da coluna, e não pendurada na sua extremidade. Isso torna o tchadensis o mais antigo membro conhecido da linhagem humana.
A história dessa linhagem começa mais ou menos há 8 milhões de anos, quando existia, na África, um macaco que não era nem chimpanzé, nem humano. Um dia, a população desse macaco foi dividida por uma barreira geográfica. Pode ser um lago, se você quiser. Tanto faz. O importante é que as exigências de sobrevivência eram diferentes de cada lado do lago.
Talvez houvesse menos árvores ao Sul, e mais árvores ao Norte. Assim, os macacos mais aptos a se pendurar em galhos se deram bem no Norte. E os que eram melhores em andar prosperaram no Sul. Com o tempo, graças a diferenças de habitat, os macacos de cada lado do lago tomaram rumos evolutivos diferentes. Até se separarem de vez, isto é: não conseguirem mais fazer bebês entre si.
É assim que surgem novas espécies na natureza. Esqueça a imagem da escadinha – em que um chimpanzé se torna, em passos sucessivos, um Homo sapiens. Ela está errada, porque os chimpanzés não são nossos avós: eles também são netos. Netos de um mesmo avô, que viveu há milhões de anos.
Quando a população desse ancestral se dividiu, parte dela deu origem a nós, outra parte deu origem aos chimpanzés. Eles são só animais diferentes, que seguiram seu próprio rumo do outro lado de uma barreira geográfica. A evolução é apenas mudança, e não mudança em direção a um estado que nós consideramos mais virtuoso.
Isso não vale só para essa primeira divisão entre chimpanzés e humanos. Vale para todos os hominídeos intermediários que vieram depois. Pegue o exemplo do Homo erectus – um parente mais antigo do Homo sapiens que já era plenamente bípede, mas ainda tinha cérebro pequeno e mandíbula avantajada. Alguns erectus se ramificaram e deram origem a nós. Outros continuaram idênticos, e dividiram espaço com o sapiens até 140 mil anos atrás. Nós não os suplantamos como se fossem iPhones desatualizados.