“Eu surpreendi o mundo. Eu devo ser o maior de todos”, repetia Muhammad Ali, então com 22 anos, ao final da luta que o sagrou campeão mundial dos pesos-pesados em 1964. “Derrotei Sonny Liston e não tenho um arranhão sequer no rosto. Sou a melhor coisa que já existiu.” Antes do duelo, Liston havia subido ao ringue 39 vezes, e perdido uma única luta. As casas de apostas davam como certa a vitória do veterano, e prometiam multiplicar por sete o dinheiro de quem ousasse apostar contra a lógica. Mas Ali tinha uma carta na manga: a autoconfiança extrema, quase delirante, que exalava por todos os poros do corpo. “Voe como uma borboleta, ferroe como uma abelha. Suas mãos não podem atingir o que os seus olhos não podem ver”, disse à imprensa antes da luta. Por seis assaltos, Ali lutou como nunca se vira antes: ele parecia dançar no ar, evitando os golpes do adversário sem sequer levantar a própria guarda. Era impossível de atingir. Ao final do sexto assalto, Liston jogou a toalha: desistiu do embate, alegando dores no ombro.
Ali era o maior porque tinha certeza de que era mesmo. E vivia repetindo isso, para quem quer que fosse. Rápido nos movimentos e dono de uma condição física invejável, o pugilista arrematou um ouro nos Jogos Olímpicos de 1960 e conseguiu o cinturão dos pesados por três vezes – feito jamais repetido por outro boxeador. Suas lutas mais acirradas, porém, aconteceram fora do ringue.
Ali era bom com as luvas, mas era ainda melhor em provocar. Nascido Cassius Clay, enfrentou ódio ferrenho ao se converter ao islamismo e virar Muhammad. Não bastasse, peitou também o governo: a recusa em servir o Exército americano na Guerra do Vietnã, em 1964, o afastou das lutas por quase quatro anos. Além de muçulmano e desertor, era, também, negro. Tudo isso fez com que suas bravatas incomodassem ainda mais. Com tons de humor e exagero, Ali aparecia na TV discursando de forma aparentemente improvisada. Mas suas frases eram calculadas para repercutir na imprensa e chamar a atenção do público. Não é à toa que GOAT, expressão da moda na internet e acrônimo em inglês para greatest of all time, se confunda com o legado do lutador. “G.O.A.T. Inc” foi o nome escolhido por sua esposa, Lonnie Ali, para batizar a empresa que cuidava da propriedade intelectual da lenda do boxe, fundada em 1992 – e vendida por US$ 50 milhões em 2006. O termo, popularizado por Ali, pegou, e virou até verbete do dicionário Merriam-Webster em 2018. Hoje serve para coroar um pequeno grupo de atletas fora de série, lendas vivas do esporte – como as que veremos a seguir.