Além do Líbano: 5 tragédias causadas pela explosão de nitrato de amônio
Ao longo do século 20, o fertilizante foi responsável por muitas detonações de dimensões similares à de Beirute – algumas deixaram mais de 500 mortos.
Uma explosão equivalente a um terremoto de 3,3 graus na escala Richter deixou no mínimo 150 mortos, 5 mil feridos, 300 mil desabrigados e um prejuízo de US$ 15 bilhões em Beirute, a capital do Líbano. O desastre foi produto da detonação acidental de 2,7 mil toneladas do fertilizante nitrato de amônio, confiscadas pela alfândega em 2014 – e armazenadas desde então em um galpão no centro do porto da cidade. Ao longo dos últimos seis anos, as autoridades portuárias enviaram seis cartas ao governo do país informando dos riscos de se armazenar a substância em uma área populosa. A correspondência foi toda ignorada.
O nitrato de amônio (NH4NO3) não é usado apenas em plantações: é um componente típico de explosivos de baixo custo empregados pelas indústrias da mineração e a construção civil – e com frequência entra na receita de armas improvisadas por milícias e organizações terroristas. Embora seja considerada estável em temperatura e pressão ambientes, a substância pode explodir em resposta ao fogo ou à detonação de outro explosivo (uma hipótese é que a tragédia em Beirute tenha sido deflagrada por um incêndio em uma carga de fogos de artifício armazenada ao lado do nitrato).
Ao longo do século 20, explosões acidentais e propositais de nitrato de amônio mataram milhares de pessoas e causaram prejuízos colossais em todo o mundo. Abaixo, conheça os cinco casos mais graves:
1. Texas City, EUA, 16 de abril de 1947
581 mortos, 3,2 mil toneladas de nitrato de amônio.
O navio SS Grandcamp ancorou em uma das principais cidades portuárias do estado do Texas, no sul dos EUA, com 2,3 mil toneladas de nitrato de amônio – ao lado de outra embarcação, o SS High Flyer, que carregava 900 toneladas da mesma substância. Um incêndio acidental aumentou a pressão e temperatura no interior do casco da embarcação o suficiente para detonar o nitrato, desencadeando um incêndio no cargueiro ao lado – que, 5 horas depois, também explodiu.
A onda de choque dupla demoliu mais de mil edificações instantaneamente, quebrou a maioria das janelas em um raio de 16 km, derrubou dois aviões, gerou ondas de 4 m em litorais a 160 km de distância do porto e incendiou refinarias de petróleo, tanques de gás e instalações da Monsanto, que queimaram por uma semana. Dos 32 bombeiros da cidade, 30 morreram na hora. Uma âncora de duas toneladas foi arremessada a mais de 3 km de distância.
2. Oppau, Alemanha, 21 de setembro de 1921
561 mortos, 4,5 mil toneladas de nitrato de amônio.
A BASF armazenava 4,5 mil toneladas de nitrato de amônio em silos – torres ocas usadas para guardar grãos e outras commodities – no distrito de Oppau, parte da cidade de Ludwigshafen am Rhein, na Alemanha. Na época, era uma prática razoavelmente comum usar pequenas cargas de dinamite para deixar o nitrato mais soltinho (ele fica compactado sob o próprio peso, o que dificulta o manuseio). Mais de 20 mil detonações de dinamite haviam sido realizadas em segurança no local (!) até o dia do acidente.
A explosão – que consumiu “só” 10% do total de nitrato no local (450 toneladas) – criou uma cratera de 125 metros de diâmetro, destruiu 80% dos edifícios de Oppau, quebrou todas as janelas em um raio de 30 km e afundou navios no rio Reno. Além dos 561 mortos, houve 1,9 mil feridos e 7,5 mil desabrigados.
3. Tianjin, China, 12 de agosto de 2015
173 mortos, 800 toneladas de nitrato de amônio.
No desastre mais recente, um container de nitrocelulose (um explosivo tão poderoso que no romance Da Terra à Lua, de Júlio Verne, é utilizado para lançar um projétil tripulado para nosso satélite natural) pegou fogo e explodiu no porto de Tianjin, na China – desencadeando uma detonação ainda maior, 30 segundos depois, em uma carga próxima de 800 toneladas de nitrato de amônio. Além dos 173 mortos (cerca de 100 foram bombeiros) e 700 feridos, foram destruídos 304 prédios, 7,5 mil containers com cargas variadas e 12,4 mil carros – em sua maioria, veículos zero quilômetro de montadoras japonesas. Calcula-se US$ 9 bilhões de prejuízo.
4. Oklahoma City, EUA, 19 de abril de 1995
168 mortos, 13 barris de 230 kg com explosivos (ataque terrorista).
Este é o único acontecimento da lista que foi um ataque terrorista, e não um acidente. O segundo pior ataque já realizado em território americano, diga-se – em número de mortes e danos materiais, fica atrás apenas dos atentados de 11 de setembro de 2001. Às 9h da manhã do dia fatídico, Timothy McVeigh acionou um caminhão-bomba na porta em frente ao Murrah building, um prédio do governo federal no centro de Oklahoma City, no sul dos EUA.
O caminhão carregava 2,2 toneladas de nitrato de amônio, nitrometano e diesel. A detonação demoliu um terço do prédio, abriu uma cratera de 9 m de diâmetro e 2,5 m de profundidade e matou 168 pessoas – além de destruir 86 carros e danificar os vidros de 258 prédios nos quarteirões vizinhos. O prejuízo foi de US$ 652 milhões.
5. Faversham, Inglaterra, 2 de abril de 1916
108 mortos, 150 toneladas de nitrato de amônio
A cidade de Faversham era conhecida por abrigar dezenas de fábricas de munição e explosivos, e estava funcionando a todo vapor durante a 1ª Guerra Mundial. Uma das maiores indústrias da região, onde ocorreu o acidente, fazia pólvora e guncotton, um tipo de explosivo que consiste em algodão ensopado de ácido nítrico e ácido sulfúrico. (A reação do ácido nítrico com a celulose presente no algodão forma nitrocelulose, o explosivo que também estava presente no desastre do porto de Tianjin.)
Em um depósito dessa fábrica, estavam armazenadas 15 toneladas de TNT e 150 de nitrato de amônio. Um incêndio, cujas causas até hoje não foram esclarecidas, queimou o depósito. No momento da explosão, bombeiros e funcionários estavam tentando apagar o fogo antes que o pior acontecesse. A maioria deles morreu na hora. Uma cratera do tamanho de um campo de futebol, com mais de 5 metros de profundidade, se abriu no local. A onda de choque da explosão foi ouvida do outro lado do Canal da Mancha, na França. Na época, o governo censurou todas as notícias sobre a tragédia para evitar que a inteligência alemã soubesse do ocorrido.