Arqueólogos encontram dois crânios operados – um medieval e outro de 3500 anos atrás
Ambos os crânios e seus donos tinham características semelhantes, e foram submetidos ao mesmo procedimento cirúrgico: a trepanação.
Dois grupos de pesquisadores trabalhando em áreas diferentes encontraram restos mortais em condições, de certa forma, similares. O primeiro grupo investigava crânios originados entre os séculos 6 e 8, achados na Itália, na Necrópole Lombarda de Castel Trosino; já o segundo estava diante de ossos do fim do Idade do Bronze, encontrado em Tel Megiddo, Israel.
Um dos ossos italianos tinha modificações incomuns – de uma cirurgia em que a paciente teve o topo do crânio raspado. Ele estava bem preservado, e eram visíveis marcas de corte. E a paciente, uma mulher, com cerca de 50 anos, aparentemente se submeteu de forma voluntária a esse procedimento.
Análises microscópicas e de tomografia computadorizada revelaram sinais de pelo menos duas tentativas de raspagem com ferramentas cirúrgicas de metal. Ou seja, a mulher se submeteu ao procedimento mais de uma vez.
Enquanto um dos pontos tinha sinais significativos de cicatrização, sugerindo que a cirurgia foi um sucesso e a paciente sobreviveu, o segundo local mostrou que a próxima modificação não terminou tão bem quanto a primeira – dessa vez, os traços de raspagem não cicatrizaram e, portanto, devem ter sido feitos na hora da morte.
O crânio israelense de 3.500 anos tinha uma característica similar: um buraco quadrado, evidenciando a tentativa de realizar uma forma antiga de cirurgia cerebral. O cirurgião removeu um pedaço quadrado de cerca de 3 centímetros do osso frontal do crânio, aparentemente fazendo vários cortes paralelos e sulcos e depois arrancando pedaços soltos do crânio, que foram encontrados entre os restos do esqueleto.
Os pesquisadores acreditam que o paciente estava vivo durante a operação. Segundo eles, a cor e o chanfro das bordas do buraco mostram que o corte foi feito em osso vivo, tomando cuidado para não perfurar o tecido que recobre o cérebro. Contudo, já que não existem sinais de crescimento ósseo pós-operatório, parece provável que o paciente tenha morrido ou durante a cirurgia ou logo após.
Ambos os esqueletos foram enterrados ao lado de alguém: a mulher foi enterrada com um homem, provavelmente seu esposo; já o jovem “israelense” foi colocado ao lado de um irmão. Análises permitiram identificar que os irmãos dele também sofreram com doenças crônicas e problemas de desenvolvimento.
O tipo de cirurgia aplicada em ambos os casos é conhecida como trepanação. É um procedimento que envolve perfurar, cortar ou raspar o crânio, para tentar abrir um buraco na cabeça. Essas cirurgias ocorreram entre povos antigos em todo o mundo, incluindo na Era Medieval, mas é relativamente raro encontrar evidências de trepanação no Oriente Médio.
A hipótese dos pesquisadores do crânio israelense é de que as condições econômicas e o status social do falecido tenham lhe proporcionado mais recursos para combater sua doença – o que teria dado acesso à cirurgia. Depois que um irmão morreu, o outro pode ter procurado a cirurgia de crânio em uma tentativa de aliviar seus sintomas debilitantes, mas sem sucesso.
O estudo das posições do túmulo e do corpo mostra que um dos irmãos morreu na transição entre a adolescência e a idade adulta, e foi enterrado de um a três anos antes do outro. Depois do fracasso cirúrgico de seu irmão, que devia ter seus 21 anos ou mais, o já falecido foi exumado para que os dois pudessem ser enterrados juntos, sob sua casa – uma prática comum na área durante a Idade do Bronze.
A mulher, curiosamente, também parecia vir de posição privilegiada. Os bens postos dentro do túmulo incluíam um broche de bronze, pente e filamentos de ouro, indicando riqueza. Por causa desse possível posto de elite, os pesquisadores descartaram que a trepanação tenha sido uma forma de punição. O caso foi, provavelmente, uma tentativa voluntária, planejada e recorrente de obter um resultado terapêutico.
A razão exata para a realização das cirurgias é difícil de apontar. Enquanto no caso israelense pode ter sido uma terapia de último recurso para aliviar as dores do paciente, o caso italiano ainda é inconclusivo.