Como é o tráfico na favela?
Os criminosos se organizam em uma hierarquia preocupada em garantir duas coisas: o abastecimento constante de cocaína, maconha e outros entorpecentes e o sistema de proteção contra a polícia ou quadrilhas rivais.
José Carlos da Silva
Os pontos de tráfico de drogas, conhecidos como “bocas”, operam como empresas, escondidos em favelas e bairros pobres das grandes cidades. Os criminosos se organizam em uma hierarquia preocupada em garantir duas coisas: o abastecimento constante de cocaína, maconha e outros entorpecentes e o sistema de proteção contra a polícia ou quadrilhas rivais.
Para garantir a eficiência do negócio, são contratados diversos funcionários. O esquema de segurança e a acirrada disputa entre traficantes põem em risco a vida de compradores e moradores da favela. “Até chegar à boca, o usuário tem que andar na favela. Ele é avaliado e nem percebe. Se os seguranças pensarem que ele é um policial disfarçado, atiram”, diz o delegado Carlos Roberto Alves de Andrade, da Delegacia de Repressão ao Crime Organizado do Departamento de Narcóticos de São Paulo.
Crime organizado
Vários funcionáriosestão envolvidos noesquema de tráfico
Aviõezinhos
Os garotos que levam a droga da boca para os clientes são mais comuns no Rio de Janeiro. Em São Paulo, onde as favelas são planas, a distância entre a boca e o consumidor é pequena e o serviço deles nem sempre é necessário
Alto escalão
Traficantes de maior hierarquia ficam posicionados sobre lages e barracos, onde podem se proteger melhor e atirar em caso de tentativa de invasão. Carregam fuzis, ideais para combates a longa distância
A boca
Geralmente fica perto de riachos, esgotos ou barrancos, para dificultar a chegada da polícia. Em uma mesma favela, podem existir várias bocas e nem toda a droga fica aqui. Barracos conhecidos como “paiol” são usados para armazenamento de grandes quantidades e da munição da quadrilha
Gerente da boca
É responsável pela chegada da droga e pela contratação do pessoal. É ele que comanda toda a operação dentro da favela e, por isso, é sempre alguém de muita confiança do dono da boca
Seguranças
A função deles é proteger os arredores da boca da polícia e de traficantes rivais. Eles usam armas próprias para combate a curta distância
Enquanto isso
O dono da “boca” não lida diretamente com a venda da droga. Ele comanda o tráfico de um barraco ou casa afastada, por meio dos gerentes. Bocas bem-sucedidas podem transformar traficantes em homens ricos e bem de vida
Ação na Boca
Como a polícia deveria agir?
Henrique Camargo
Uma investigação prévia que inclua levantamento topográfico e informações de um policial à paisana. Policiais treinados em artes marciais e com preparo para enfrentar situações de risco sem recorrer às armas de fogo. Um planejamento da ação na favela. Nenhuma morte. Segundo o delegado Clóvis Ferreira de Araújo, supervisor do GOE (Grupo de Operações Especiais), essa é a fórmula ideal para derrubar uma boca. Infelizmente, poucos grupos estão capacitados para esse tipo de ação no Brasil. Na Grande São Paulo, que tem 16 milhões de habitantes, o GOE tem apenas 200 policiais com esse treinamento. “Sem preparação, fica difícil fazer uma incursão eficiente dentro de uma favela, onde o ambiente é hostil para quem não o conhece”, diz Araújo.
Invasão ideal
Como agem osgrupos mais bemtreinados da polícia
Formação de grupo
A equipe que faz a invasão da boca de maior movimento reúne os policiais mais bem treinados. Ela é formada por seis homens organizados de forma que todos estejam protegidos em caso de ataque dos traficantes
Policial paisanao
Disfarçado de morador da favela, o policial à paisana investiga a localização e o esquema de trabalho das bocas, quem são os donos e seguranças e o tipo de armamento utilizado. Durante a ação, ele só participa se for necessário
Entrando na boca
A polícia conta com um especialista em explosivos para o caso de os traficantes se esconderem nos barracos. Bombas de efeito moral, como gases pimenta ou lacrimogêneo, são usadas primeiro. Em último caso, são utilizados explosivos para arrombar portas, janelas e paredes
Olho poe olho
A troca de tiros só deve ocorrer se os traficantes começarem a atirar. “Eles decidem as armas que vamos usar: se querem fogo, usamos fogo”, diz o delegado Clóvis de Araújo, do GOE. Armas não letais, que não colocam a vida de ninguém em risco, devem ter prioridade
Negociador
O negociador entra em ação quando há algum refém. Ele tem que tentar convencer o bandido a soltar o prisioneiro sem que, para isso, haja necessidade de confronto
Imobilização
Os policiais passam por um treinamento de artes marciais com enfoque na imobilização do inimigo. É uma mistura de várias lutas, como judô, jiu-jítsu, tae kwon do. Devem usar essas habilidades sempre que for possível evitar o uso de armas de fogo