Deus existe?
Deus criou o homem à sua imagem e semelhança... ou foi a mente humana que criou a figura de Deus?
Rodrigo Cavalcanti
Antes de tentar responder a essa pergunta, é preciso esclarecer qual a concepção de Deus de que se está tratando. Afinal, quando a maioria dos cientistas refere-se à possível existência (ou não) de Deus, não está lidando com a tese de que o velho barbudo de poderes sobrenaturais retratado nos afrescos de Michelangelo possa um dia ser encontrado em laboratório. Tampouco, como diz o zoólogo inglês Richard Dawkins, de nada adiantaria designar por Deus uma constante física recém-descoberta que regesse o Universo. Nesse caso, como diz Dawkins, “ele não teria nada a dizer sobre ética, sobre o que é certo ou errado ou sobre qualquer outra questão moral”.
Para a ciência, a evidência mais próxima da existência de uma concepção divina é a de que Deus possa existir seria a descoberta de indícios de que o Cosmos foi “projetado” seguindo um propósito. Ou seja: não haveria espaço para o acaso e o caos na criação do Universo e no surgimento da vida em nosso planeta. A complexidade dos sistemas biológicos ou dos fenômenos físicos indicaria que houve um projetista guiando todo esse processo. Mas será que o fato de alguns cientistas proporem essa pergunta não faria com que eles partissem necessariamente da necessidade (reconfortante) da existência dessa ordem no Cosmos? Ou seja: a pergunta acima já não nasceria viciada do ponto de vista do método científico?
Nos últimos 100 anos, pelo menos 3 formas de responder ao impasse acima foram exploradas:
Deus não é tema científico
A primeira, defendida por boa parte da comunidade acadêmica, é a de que a existência de Deus não é tema do método científico. Essa visão baseia-se principalmente na obra do filósofo da ciência Karl Popper, para quem a ciência só pode tratar de temas que resistam a refutações, o que ele chamou de critério de “falseabilidade”. Resumidamente, Popper defende que o papel do cientista é buscar falhas na sua teoria – e, quanto mais genérica ela for, como no caso da “existência de Deus”, menos passível ela seria de ser tratada cientificamente. Ou seja: o tema seria apenas assunto da metafísica, parte da filosofia que não trata dos fenômenos físicos.
Deus é fruto do nosso cérebro
A segunda resposta, que não necessariamente invalida a primeira, é a dos cientistas que acreditam que a espécie humana evoluiu biologicamente para acreditar em Deus, assim como para andar sobre duas pernas. Um dos maiores defensores dessa tese é o biólogo americano Edward O. Wilson, para quem a nossa predisposição para a religião seria um traço genético da nossa espécie. Segundo ele, nossa inclinação para acreditar em um ser superior pode ser resultado do comportamento de submissão animal presente em outras espécies, como os macacos Rhesus, em que apenas um macho dominante anda de cabeça e cauda erguidas enquanto a maioria do bando mantém a cabeça e a cauda baixas em sinal de respeito ao líder – na esperança de ser protegido por ele contra um inimigo. “O dilema humano é que evoluímos geneticamente para acreditar em Deus, e não para acreditar na biologia”, diz Wilson. Teses como a de Wilson foram reforçadas por pesquisas com primatas, como a realizada com chimpanzés na Tanzânia pela britânica Jane Goodall. Ao estudar os chimpanzés, Goodall descobriu que eles agem de maneira nada usual diante de uma cachoeira, adotando um comportamento de reverência que ela chamou de senso místico.
Além das pesquisas com os primatas, os neurocientistas já sabem quais partes do cérebro são ativadas durante os estados de meditação e oração. Pesquisas como essa, contudo, não podem provar a existência ou não de Deus – mas no máximo revelar quais regiões são responsáveis pelos estados místicos associados à idéia de uma divindade.
Desenho inteligente
A terceira resposta, conhecida como Teoria do Design Inteligente, defende que algumas das tarefas altamente especializadas e complexas do organismo – como a visão, o transporte celular e a coagulação – não podem ser explicadas apenas pela evolução. Essas tarefas seriam uma prova de que a vida seguira um projeto específico. Defendida pelo bioquímico Michael J. Behe, professor da Universidade Lehigh, na Pensilvânia, e autor do livro A Caixa-Preta de Darwin, a Teoria do Desenho Inteligente refuta as teses de Darwin e, por isso mesmo, tem sido considerada uma versão moderna – e mais sofisticada – do velho criacionismo bíblico, teoria pela qual o Universo e a vida foram criados de acordo com o relato do Gênese.