Fernando Brito
Isso pode doer no coração e no bolso, mas a verdade é que não chegaríamos muito longe sem tributos. Grandes conquistas da civilização só foram possíveis graças à riqueza acumuladas com os impostos. Foi com dinheiro público que reis, imperadores e presidentes nos levaram a conquistas, desde as mais simples – como a construção de estradas – até as mais complexas – como a chegada do homem à Lua.
Até o próprio governo como o conhecemos só existe por causa dos impostos. Tudo começou como uma forma de reverência: nas primeiras civilizações, os tributos serviram como oferenda a reis que se consideravam divindades. Não eram revertidos em nenhum serviço à população. Tinham a função de diferenciar os senhores dos súditos. (Não à toa a palavra “tributo” serve tanto para imposto como para homenagem.) Era essa divisão que dava status e legitimidade aos líderes.
Se o imposto não tivesse surgido, os primeiros governantes seriam fracos. Fariam mandatos sem muitas realizações. Ainda que estivessem determinados a organizar a vida da comunidade, não teriam estímulo para tomar decisões importantes: não receberiam salário pela função nem contariam com caixa para financiar grandes empreitadas, como guerras ou reformas relevantes. Assim, o desenvolvimento da sociedade dependeria de iniciativas individuais ou de grupos organizados, que juntariam seus recursos e esforços para melhorar a vida.
Não teríamos ido muito além das tribos primitivas que ainda existem, como indígenas, esquimós e aborígenes. Democracia, direitos fundamentais, conhecimento tecnológico, tudo avançaria pouco. Nossa vida seria bem mais simples, como você vê a seguir.
Afrouxem os cintos, o Leão sumiu
Livres de impostos, presos na Idade Média
Privatização
Todos os serviços seriam cobrados, mesmo os mais básicos. Quer andar em rua pavimentada? Precisa pagar. Sua casa pegou fogo e os bombeiros apareceram? Prepare-se para receber a conta. O mesmo vale para educação, iluminação pública… Em compensação, só pagaríamos pelo que realmente usássemos.
Vida breve
Morre-se mais cedo em uma sociedade tribal. Entre os índios brasileiros, a expectativa de vida é de 46 anos, contra 73 na população em geral. Sem vacinação nem assistência públicas, até diarreia e sarampo podem matar. Uma grande população doente deixaria vulnerável até quem pagasse por serviço de saúde particular.
Credos de sobra
Milhares de seitas conviveriam sem que nenhuma fé se impusesse. Religiões, historicamente, sempre se associaram ao Estado para se fortalecer. A católica, por exemplo, só se disseminou ao virar a religião oficial do Império Romano. Em alguns casos, fé e governo eram quase a mesma coisa – no Brasil, a separação entre Igreja e Estado veio com a proclamação da República.
Só na carroça.
A inovação viria de empresas, mas faltaria fôlego para grandes investimentos. E serviço que não desse lucro não seria explorado. Carros elétricos, por exemplo, rodam hoje graças a subsídios que os tornam acessíveis – sem ajuda governamental, os fabricantes não venderiam nada. Por isso, uma sociedade sem tributos seria menos desenvolvida.
Vida lôka
Sem dinheiro, o governo não teria como manter polícia ou Poder Judiciário. Teríamos menos segurança nas ruas. (Até porque nem iluminação pública existiria.) E o pessoal faria justiça com as próprias mãos. Pena de morte e castigos físicos seriam corriqueiros, já que faltaria dinheiro para manter cadeias.
Fonte Henrique Oliveira, advogado tributarista do escritório Trigueiro Fontes; Departamento do Tesouro dos EUA; Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário; Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento; Fundação Heritage; Banco Mundial; Chutando a Escada, Ha-Joon Chang.