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Justiça – De homem para mulher no Irã

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h19 - Publicado em 9 Maio 2012, 22h00

Willian Vieira

Depois de perder o emprego na TV estatal e ser mandada a um hospital psiquiátrico, Maryam Molkara convenceu o aiatolá Khomeini a legalizar a mudança de sexo na república islâmica

O ano era 1983, e o véu da revolução islâmica de 1979 mal havia assentado sobre a sociedade iraniana. Foi quando o jovem Fereydoon – de terno masculino escondendo os seios mantidos à base de hormônios femininos e coberto de sangue após uma surra dos seguranças oficiais – jogou-se aos pés do aiatolá Khomeini pedindo compreensão. Embora o religioso já houvesse escrito em 1963 num livro que a religião não impedia que um hermafrodita passasse por uma cirurgia de adequação de sexo, nada sabia dizer sobre transexuais. Mas, diante de Fereydoon, o líder supremo do mesmo país que prescrevia a pena de morte para homossexuais permitiu a cirurgia de mudança de sexo, por meio de uma fatwa (édito religioso com peso de lei). O jovem se tornaria Maryam Khatoon Molkara e mudaria a vida de milhares de mulheres presas em corpos masculinos.

Uma vida sempre difícil, como a biografia de Maryam mostra bem. Única criança do segundo de 8 casamentos do pai, ela se sentia menina desde que se entendeu por gente. “Quando eu era muito pequena, gritava quando tentavam me vestir como um menino, e nas lojas de brinquedos sempre queria as bonecas”, contou ao jornal britânico The Independent. “Toda noite eu rezava por um milagre – mas de manhã eu olhava para meu corpo e percebia que ele não acontecia.”

Adolescente, sentia-se discriminada dentro e fora de casa. Sua vida ganhou um norte somente quando foi trabalhar num hospital e ouviu de um médico que poderia trocar de sexo com uma cirurgia.

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Maryam passou a pedir ajuda a todos: juízes, clérigos, governo. Mas todos rechaçavam a ideia. Nem mesmo a mulher do então xá Reza Pahlevi escapou das investidas de Maryam. Parecia uma luz no fim do túnel. Mas, quando ela finalmente ganhou a simpatia da primeira-dama e espaço para debater a questão, o regime do xá caiu e foi substituído pelo dos aiatolás. Era a gota d¿água.

A perseguição a homossexuais foi institucionalizada, com a pena de morte sondando o destino de gays, às vezes assassinados nas ruas. Maryam foi demitida de seu emprego na televisão estatal e forçada a ir para um hospital psiquiátrico, onde recebeu por muito tempo altas doses de antidepressivos e hormônios masculinos.

Isso não a fez desistir. De próprio punho escreveu diversas cartas endereçadas a Khomeini. Graças a contatos dentro do próprio regime, conseguiu chegar perto do aiatolá. Certo dia, com o Corão na mão e sapatos amarrados em volta do pescoço (símbolo religioso xiita para quem busca abrigo), invadiu o palácio do líder supremo. Familiares de Khomeini a salvaram da agressão dos guardas e, tocados pela história de desespero, levaram-na à sala do líder supremo.

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Ela conta que Khomeini a recebeu carinhosamente, confessando desconhecer a situação dos transexuais. Pediu-lhe então a chance de ser mulher, explicando que se sentia presa num corpo incompleto. Funcionou. Desde então, mais de mil iranianos trocam de sexo por ano – o que faz do Irã o segundo país em número de operações do tipo, atrás apenas da Tailândia. E com subsídio do Estado, embora o país ainda puna a homossexualidade com morte.

Mas ela ainda teria de esperar por sua vez. Mesmo vivendo com o namorado, não tinha coragem de passar pela cirurgia. Afinal, nada convencia sua mãe a aceitar sua orientação sexual. Enquanto isso, limitou-se a tomar hormônios. Foi só em 1997, com a mãe já doente e com o Irã sob o governo reformista de Mohammad Khatami, que teve coragem de ir à Tailândia, país reconhecido pela quantidade e qualidade de cirurgias de readequação de sexo. Com ajuda financeira do governo islâmico, ganhou finalmente sua vagina.

Maryam sabia que o rapaz nunca mais voltaria. Não após ter passado por uma odisseia de sofrimentos pessoais e ter vencido sob a ditadura dos aiatolás. Mesmo que isso lhe tenha custado os direitos garantidos pelo regime apenas aos homens. Mesmo que ela seja obrigada a cobrir a cabeça com o véu toda vez que aparece nas delegacias de Teerã para tentar soltar um transexual não operado preso pela Guarda Revolucionária.

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Para saber mais

Be Like Others. Documentário de Tanaz Eshaghian, 2008.

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