O Brasil já foi palco de um show de orcas – que terminou em tragédia
Uma dupla de orcas se apresentou no Playcenter, em São Paulo, nos anos 1980. Em pouco tempo, porém, uma delas foi encontrada morta no tanque.

Entre 1984 e 1988, as orcas Nandu e Samoa se tornaram atração principal do parque de diversões Playcenter, em São Paulo. Foi a primeira e única vez que o Brasil teve um show de orcas ao estilo Sea World. Conheça a história do “Orca Show” e como o caso levantou questionamentos sobre o uso de animais selvagens como entretenimento.
Em novembro de 1983, um grupo de três orcas jovens — Tilikum, Nandu e Samoa — foram capturadas nas águas geladas da Islândia. Após a captura, os animais foram mantidos temporariamente no aquário Saedyrasafnid, também na Islândia, à espera de seus destinos finais.
Tilikum foi comprado pelo parque canadense Sealand of the Pacific e transferido em novembro de 1984. Mais tarde, ele seria movido para o SeaWorld Orlando, onde foi protagonista de três mortes envolvendo os apresentadores do show de animais marinhos. A história de Tilikum é contada em detalhes no documentário Blackfish, de 2013
Já Nandu e Samoa estavam disputados, pois Itália e França queriam os bichanos. Mas ambos acabaram adquiridas pelo Playcenter, no Brasil. A dupla foi transportada em um Boeing 737 da Eagle Air of Iceland até Frankfurt. De lá, embarcaram em um voo fretado da Lufthansa com destino a São Paulo.
O Playcenter, um parque de diversões na zona oeste de São Paulo, recebeu os animais ainda bebês. Estima-se que Nandu e Samoa tenham nascido em 1980, então elas tinham cerca de três anos de idade no momento da captura. (Na natureza, as orcas vivem de 50 a 80 anos.) Separados de seus grupos familiares no oceano Ártico, eles seguiram para o palco no hemisfério sul. A aquisição das orcas, inicialmente planejada para ser sigilosa, foi revelada por uma empresa de seguros.

O “Orca Show” estreou em junho de 1985, com apresentações diárias que logo se tornaram uma sensação nacional. Milhares de espectadores lotavam as arquibancadas para ver a dupla de cetáceos. Veja o comercial do show:
Apesar da recepção calorosa do público, a vida das orcas era menos brilhantes. Samoa evitava ingerir itens arremessados pelos espectadores, enquanto Nandu, curiosamente menos seletivo, acabou consumindo alimentos e objetos impróprios.
Em março de 1988, Nandu foi encontrado morto em seu tanque. A necropsia, realizada na Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de São Paulo, revelou úlcera e câncer no fígado. Segundo o jornal Estadão da época, o parque tentou manter o ocorrido em segredo, fechando a atração por uma semana.
Atualmente, o esqueleto de Nandu está preservado no Museu de Anatomia Veterinária da USP.
Samoa permaneceu sozinha com quatro golfinhos-nariz-de-garrafa, no tanque projetado para performances.

Pouco tempo depois, Samoa foi vendida ao parque Sea World, nos Estados Unidos. Ali, reencontraria outras orcas – entre elas Kalina, a primeira orca a nascer e sobreviver em cativeiro.
Apesar de parecer promissora, a nova fase de Samoa também terminou em tragédia. Em 1992, após um parto exaustivo de quase quatro horas, a orca deu à luz uma cria morta — e faleceu poucas horas depois devido às complicações.
A morte de Nandu e, posteriormente, de Samoa – somada a casos como o trágico ataque de leões a uma criança em Pernambuco no ano 2000 – contribuiu para acender um debate nacional sobre o uso de animais em espetáculos no Brasil.
A partir desse episódio, Pernambuco se tornou o primeiro estado a proibir oficialmente apresentações com animais em circos, dando início a um movimento que se espalhou pelo país. Atualmente, 12 estados brasileiros, incluindo São Paulo, já baniram esse tipo de prática, embora ainda não exista uma legislação nacional definitiva. O projeto de lei 7291/2006 segue em tramitação no Congresso.