O segredo de Leonardo
Qual o mistério de O Código Da Vinci, livro que vendeu milhões misturando teorias conspiratórias e personagens bíblicos nem sempre muito confiáveis?
Alexandre Matias e Vladimir Cunha
Ao pressentir a proximidade da morte, o curador do Museu do Louvre olha para as obras de arte ao seu redor e tenta encontrar uma maneira de passar adiante um segredo secular. Usando o próprio corpo como mensagem e o sangue como tinta, posiciona-se de maneira excêntrica ao lado de um intrigante texto, que fala em santas, números e demônios. Na escuridão do museu, ele exala seu último suspiro na esperança de que sua mensagem seja compreendida.
Assim começa um dos maiores fenômenos pop do ano. Com mais de 14 milhões de exemplares vendidos no mundo inteiro (160 mil só no Brasil, onde não saiu da lista dos mais vendidos desde que foi lançado, em março deste ano – são 25 semanas entre os bestsellers, segundo a revista Veja) e traduzido em mais de 40 países, O Código Da Vinci acertou em uma veia sensível do imaginário popular ao cruzar, em ritmo cinematográfico, personagens bíblicos, sociedades secretas e história da arte em uma trama de cenário real, com evidências que podem ser encontradas em algumas das mais famosas obras do herói renascentista que empresta o nome ao título desse thriller histórico.
Considerado anticristão ao ponto de ser banido do Líbano no mês passado, o livro do escritor inglês Dan Brown vem incomodando historiadores e grupos religiosos. Sua principal virtude é ir fundo nas teorias conspiratórias que desconstroem a realidade como a conhecemos, oferecendo uma versão convincente – e mais fascinante – da história da civilização. Adepta do silêncio em meio ao tiroteio de versões e contraversões, a Igreja Católica preferiu não comentar essas teorias, sobretudo aquela que a acusa de manipular e adulterar toda a história de Jesus Cristo.
Por seu lado, o mercado editorial não poderia estar mais radiante com o desempenho de O Código, que segue gerando filhotes sobre os temas abordados no romance original. Só no Brasil, já são três os descendentes dessa linhagem: Quebrando o Código Da Vinci, em que o professor Darrell L. Bock desmente as principais acusações de Brown; Revelando o Código Da Vinci, no qual o pesquisador Martin Lunn separa o que é verdade e o que é ficção no livro; e Decodificando Da Vinci, em que a inglesa Amy Welborn desconfia seriamente do original. Nos Estados Unidos, onde foi lançado em 2003 pela editora Doubleday, a febre já virou epidemia, com mais de meia centena de livros publicados na esteira do sucesso de Brown.
O dono dos direitos do livro no Brasil, Marcos da Veiga Pereira, da editora Sextante, tem na ponta da língua a explicação para o sucesso relâmpago: “Trata-se de um Harry Potter para adultos”. Nada mau para um pequeno calhamaço de quase 500 páginas.
A Conspiração
Em O Código Da Vinci, o historiador da Universidade de Harvard Robert Langdon é envolvido em uma perseguição que tem início com o assassinato de Jacques Saunière, curador do museu do Louvre, em Paris. Encontrado morto em circunstâncias misteriosas dentro do museu, o curador deixa pistas cifradas que serão seguidas por Langdon e pela criptógrafa Sophie Neveu por toda uma noite em pontos turísticos de Paris e de Londres, como a Igreja de Saint Suplice, a Igreja do Templo, o túmulo de Isaac Newton, a Abadia de Westminster e o próprio Louvre.
O fascínio despertado pela aventura foi tamanho que levou a série de guias turísticos Fodor’s a lançar o “Itinerário Da Vinci”, um roteiro com os locais citados em Paris. O museu do Louvre também entrou na onda e, ao preço de 133 dólares por cabeça, passou a oferecer uma turnê de duas horas e meia cujo tema é “Quebrando o Código Da Vinci”. Na Itália, o fluxo de turistas aumentou na Igreja Santa Maria delle Grazie, em Milão, onde está A Última Ceia, de Da Vinci, e até mesmo a capela de Rosslyn, na Escócia, nunca foi tão visitada.
Ao longo da trama, Langdon, uma mistura de Sam Spade com Indiana Jones, e Sophie, uma atraente francesinha, seguem as pistas escondidas por Leonardo da Vinci em algumas de suas obras mais conhecidas, como a Mona Lisa, a primeira versão da Virgem das Rochas, o Homem Vitruviano e A Última Ceia. As indicações os levam ao Priorado de Sião, uma sociedade secreta cuja existência é incerta e que teria tido como grãos-mestres o alquimista Nicolas Flamel, o escritor Victor Hugo, o pintor Sandro Botticelli, o físico Isaac Newton, o compostor Claude Debussy e o cineasta Jean Cocteau, além de, é claro, o próprio Da Vinci.
O Priorado de Sião, que seria o braço intelectual da Ordem dos Cavaleiros Templários, um grupo igualmente sombrio e de atuação controversa, teria sido fundado para propagar um dos maiores segredos da história, a tal “conspiração de 2 mil anos”. Segundo essa versão, a Igreja Católica foi fundada sobre uma grande mentira: que Jesus Cristo seria o filho de Deus. Para os defensores dessa tese, Jesus teve sua biografia manipulada durante a edição da Bíblia. E mais: que Cristo não morreu na cruz, mas fugiu para o sul da França, onde se casou com Maria Madalena e deu início a sua casa real, conhecida como Linhagem Sagrada.
Enquanto a dupla se ocupa de desvendar esses segredos (e descobrir o assassino do curador Saunière), a polícia francesa segue em seu encalço ao mesmo tempo que um misterioso monge da irmandade cristã Opus Dei inicia sua busca por algo que pode tornar sua organização mais poderosa do que nunca. Na versão de Brown, tanto a Opus Dei como a Igreja Católica são tratados como grandes conspiradores.
A reação
“A idéia de que os primeiros cristãos não consideravam Jesus divino antes do Concílio de Nicéia em 327 não se sustenta e essa é a grande fraqueza da teoria bem amarrada de Dan Brown”, afirma o pastor e doutor em teologia do Seminário Teológico de San Francisco, o americano Wesley Tracy. Na trama, a Igreja reuniu seus bispos e criou toda a teoria da suposta divindade de Jesus no encontro de Nicéia, na Turquia. “Apesar de ele colocar tais afirmações na boca de alguns personagens ‘acadêmicos’, a premissa é falsa. Há documentos pré-Nicéia e pré-Constantino (o primeiro imperador romano cristão) que asseguram a divindade de Cristo. A cópia parcial do evangelho de João do ano 125, que está na biblioteca Rylands, em Manchester, é uma dessas provas”, diz.
“Sabemos que a Ordem de Sião realmente existiu na Idade Média, que era conectada aos templários e que foi santificada pela Igreja”, afirma a pesquisadora Tracy Twyman, editora da revista Dagobert’s Revenge, cuja linha editorial aborda diferentes aspectos do mistério do Graal e da Linhagem Sagrada. “Podemos assegurar que existe ainda hoje um moderno Priorado de Sião, com uma agenda política atualizada e integrantes nos governos francês e inglês. Mas é impossível provar que o Priorado de Sião moderno é uma continuação da ordem original, assim como não há provas de que Da Vinci e Isaac Newton tenham sido seus grãos-mestres.”
“Muita bobagem já foi e continua sendo escrita sobre os templários”, diz Diarmaid McCulloch, professor de teologia na Universidade de Oxford, Inglaterra. “O que se sabe é que eles foram uma ordem militar de cavaleiros que acumulou uma grande quantidade de terras em nome de um projeto que visava proteger o caminho para a Terra Santa”, diz. O fracasso da proposta e o crescimento do poder dos templários incomodou monarcas europeus, que decidiram destruí-los. “Foi quando surgiram acusações de crimes e heresias”, afirma o professor.
Segundo McCulloch, a conspiração que inclui Jesus Cristo, o Priorado de Sião e o Santo Graal é produto de conflitos entre Igreja e Estado na França do século 19, apimentados por um curioso personagem, o padre Bérenger Saunière. Vigário em Rennes-le-Château, ele teria acumulado fortuna de forma rápida e suspeita. Para justificar o enriquecimento, Saunière fez circular histórias fantasiosas sobre a existência do tesouro dos templários e do cálice sagrado. “No frágil estado da política francesa, suas atividades misteriosas encaixaram-se bem na rede de conspirações de extrema direita da época”, diz McCulloch. “Tais fantasias continuam a florescer até hoje”, completa.
Para Nora Berend, professora de história medieval na Universidade de Cambridge, Inglaterra, as teorias do livro de Brown não passam de invenção. “É tudo especulação. Por que há tanta teoria da conspiração? Pela mesma razão por que as pessoas especulam sobre a morte de John Kennedy: a insaciável curiosidade sobre a vida de figuras históricas e pessoas famosas”, diz Nora.
“O Código Da Vinci é um divertido passeio por todas essas histórias e conspirações num modelo que o italiano Umberto Eco já havia feito em O Pêndulo de Foucault”, diz McCulloch. “Justamente por tudo se encaixar tão bem é que o livro deve ser tratado apenas como entretenimento, não história”, diz.
O conspirador
Por mais que Dan Brown tenha sido tachado de herege, seus interesses parecem ser outros. Há pelo menos quatro anos, ele tenta ingressar no mercado de best sellers, tateando temas potencialmente explosivos como privacidade pessoal e vigilância digital (Digital Fortress, de 2000) e bastidores da política americana (Deception Point, de 2001). Sua veia histórico-conspiratória, no entanto, começou a despontar quando enviesou por temas obscuros, como os “iluminatti” (outra sociedade secreta do século 15) em Anjos e Demônios, sua primeira aventura com o professor Robert Langdon (2001), que chega às livrarias brasileiras este mês. O tão almejado estouro aconteceria em 2003, com o lançamento de O Código Da Vinci no mercado americano.
Atualmente, o autor, que aos 38 anos vive na Inglaterra, não dá entrevistas sob a justificativa de estar terminando seu novo romance, uma conspiração que interliga Washington e Maçonaria. De olho em um mercado ainda maior, Brown já vendeu os direitos de O Código para o diretor Ron Howard, que prevê o lançamento do filme em 2005. Entre os cotados para viver Langdon estão Russell Crowe, George Clooney e Hugh Jackman, ainda que o professor seja descrito pelo autor como “um Harrison Ford num terno tweed”.
Em seu site, o escritor afirma que controvérsia é saudável. “A religião tem apenas um inimigo verdadeiro, a apatia, e o debate é um antídoto soberbo”, diz. Filosofia à parte, o fato é que, com uma escrita leve e uma bagagem cultural considerável, Dan Brown descobriu uma fórmula capaz de interligar personagens históricos e religiosos num universo paralelo de paranóia e segredos semelhante a fenômenos do pop, como Arquivo X e Matrix. Assim, ainda que logo no início do romance o autor faça questão de avisar que todas as descrições de obras de arte, arquitetura, documentos e rituais secretos correspondam “rigorosamente à realidade”, O Código Da Vinci, com suas supostas verdades, não passa de um divertido livro de ficção. Ou não?
Leonardo Da Vinci
O “Homem da Renascença” original, Leonardo da Vinci foi arquiteto, inventor, escultor, cientista, matemático e pintor. Apesar de emprestar seu nome ao Código Da Vinci, não participa efetivamente da trama, mas suas obras e feitos têm destaque fundamental na perseguição de Robert Langdon e Sophie Neveu ao Santo Graal, já que esconderiam pistas e segredos.
O flanco aberto pelo próprio Da Vinci para que ele seja visto como um grande conspirador é considerável. Inventou sua própria linguagem em código (escrevia de forma invertida – seu texto só era legível de frente para um espelho) e espalhou uma série de cifras em seus quadros – que vão dos citados por Dan Brown em seu livro até a sua própria representação como João Batista e o anjo Gabriel em algumas obras.
Além disso, era notório estudioso de festividades pagãs e inseriu uma série de símbolos não-cristãos em pinturas encomendadas pela Igreja Católica, como é o caso da Virgem das Rochas (em que as plantas reproduzidas supostamente seriam utilizadas em rituais mágicos). Ele também dissecava cadáveres para seus estudos de anatomia, fato considerado heresia pela Igreja da época.
Nascido em 1452 na cidade de Vinci (daí o seu sobrenome), não existem registros que liguem Leonardo ao Priorado de Sião, como sugerido no livro de Dan Brown. Da Vinci morreu em 1519 na França e deixou um legado que inclui, além de pinturas famosas como a Mona Lisa e a Última Ceia, protótipos de invenções que só seriam concretizadas séculos depois, como o pára-quedas e o tanque de guerra.
Enigmas à mesa
Pintura de Da Vinci esconde pistas ou tudo não passa de ficção?
1. JUDAS E A FACA
O apóstolo traidor é o único de costas para o espectador do quadro e que está à sombra. Outros símbolos, como uma estranha mão com uma faca saindo por suas costas e um saleiro derrubado a sua frente, enfatizariam a traição, que é o tema da caracterização mais famosada Santa Ceia. A mensagem por trás do quadro seria a de que a própria Igreja Católica teria traído os ideais cristãos
2. JOÃO OU MARIA?
Segundo O Código, o discípulo delicado e amável ao lado direito de Jesus Cristo não era sequer um homem, e sim Maria Madalena, de mãos dadas com o Messias, confirmando o casamento dos dois
3. CORES E FORMAS
As roupas de Cristo e de João/Maria são das mesmas cores, enfatizando sua união. Os braços de ambos formam uma seta apontada para baixo – ou um “V” – ícone antigo do poder da mulher. Com ambos corpos acrescidos aos braços, o “V” torna-se um “M”, de “Maria” ou “matrimônio”
MAUS BOCADOS
Pintada entre 1495 e 1498 na parede do refeitório da Igreja Santa Maria delle Grazie, em Milão, A Última Ceia passou por adversidades até chegar ao século 21. Em 1652, uma porta foi aberta na parede onde estava, cortando os pés de Cristo. O local foi usado em 1796 pelas tropas de Napoleão e quatro anos depois foi inundado por uma enchente
Maria Madalena
Prostituta, mulher piedosa que recolheu o sangue de Cristo ao pé da cruz, primeira apóstola, símbolo do feminino no universo cristão… Muito se especula sobre quem teria sido Maria Madalena, mas a verdade é que pouco se sabe sobre ela. Alguns teóricos da conspiração não têm dúvidas de que ela seria a mãe do filho de Jesus, que não teria morrido na cruz como retratado pelos evangelhos, mas fugido com ela para o sul da França, onde teria dado origem a uma linhagem sagrada. Tais fatos jamais foram comprovados.
Dan Brown decidiu não escolher uma definição apenas, preferindo montar uma colcha de retalhos com as lendas existentes sobre uma mulher que é pouco retratada na Bíblia, mas que, graças ao Código Da Vinci e à atriz Monica Belucci no filme A Paixão de Cristo, de Mel Gibson, têm sua reputação revista em grande escala. Há a discussão, inclusive, que a mulher que Jesus salvou da morte com a famosa frase “Atire a primeira pedra aquele que nunca pecou” não seria a mesma que o acompanha durante o calvário, esta identificada por alguns como Maria de Betânia.
Pela Bíblia, sabemos que Maria Madalena foi exorcizada por Cristo (em Lucas, 8;2) e passou a segui-lo desde então. Ela acompanhou a crucificação e descobriu o sepulcro de Jesus vazio, correndo para contar aos apóstolos Pedro e João. O escritor grego Nikos Kazantzakis, autor de A Última Tentação de Cristo (transformado em filme por Martin Scorsese, em 1988), no entanto, cogita que ela teria inventado a ressurreição por amor a Jesus e, por não aceitar sua morte, passado a pregar o renascimento do messias.
O mistério em torno de Maria Madalena aumentou com uma história envolvendo o padre Bérenger Saunière. Em 1891, ao reformar uma pequena igreja dedicada a ela construída onde antes havia um templo visigodo em Rennes-le-Château, no sul da França, Saunière teria encontrado um tesouro que, especula-se, teria sido trazido da Terra Santa pelos Cavaleiros Templários. Além de transformar o padre em um homem rico, a descoberta comprovaria a existência da linhagem sagrada e o fato de até hoje existirem descendentes diretos de Jesus Cristo.
O Priorado de Sião
A história do Priorado de Sião começa em 1956, quando ganhou força na França a teoria conspiratória expressa nos chamados “dossiês secretos”, que provariam a ligação entre o Priorado e descendentes de Cristo. A entidade protegeria a linhagem divina esperando o momento certo para anunciar a segunda vinda do messias e a queda da Igreja Católica, acusada de usurpar a herança sagrada.
Segundo o livro O Santo Graal e a Linhagem Sagrada, de Michael Baygent, Henry Lincoln e Richard Leigh, os dossiês foram escritos por um certo Leo Schidlof, que pouco antes de morrer, em 1966, os teria colocado em uma maleta confiada ao courier Fakhar il Islam, que os entregaria a um agente do Priorado em Genebra. Segundo o livro, Fakhar não chegou ao seu destino e em 20 de fevereiro de 1967 seu corpo foi achado decapitado em uma ferrovia em Melan, fato registrado em jornais da época. A maleta com os documentos, se é que existiu, jamais foi encontrada.
Segundo Brown, o Priorado é uma sociedade secreta originada a partir dos próprios Cavaleiros Templários, com relações com os rosacruzes e a Maçonaria.
O único fato concreto sobre o Priorado de Sião é sua menção no Journal Officiel, publicação do governo francês na qual todos os grupos e sociedades civis devem ser registrados. Na edição de 20 de julho de 1956, ele é descrito como “Monastério do Sinai. Objetivos: Estudos e Ajuda Mútua a Membros”. Em 1989, Pierre Plantard, que se autoproclamava grão-mestre da ordem, afirmou que a organização existia e fora fundada em 1681. Plantard seria o 34º grão-mestre de uma ordem que supostamente teve em seus quadros figuras como o alquimista Nicolas Flamel, Da Vinci, o físico Isaac Newton e o escritor Victor Hugo. Nada disso, no entanto, tem qualquer base comprovada.
Dose dupla
Cena tem versãosubversiva e outramais comportada
A VIRGEM DAS ROCHAS
O primeiro quadro, encomendado pela Confraria da Imaculada Conceição de Milão em 1483, mostra o encontro entre Jesus e João Batista. Exposto no Louvre, traz supostas mensagens cifradas (veja ao lado). Provavelmente finalizada por outro artista, a segunda versão da cena está na Galeria Nacional de Londres. As tais mensagens foram suprimidas e as auréolas, ausentes na primeira pintura, incluídas
1. A BÊNÇÃO
Concluída em 1508, a tela mostra João Batista (à dir.) abençoando Jesus (acima) e não o contrário, como era de se esperar
2. A AMEAÇA
Neste ponto, Maria aparece com uma das mãos sobre a cabeça do pequeno João em um gesto ameaçador – os dedos lembram garras de águia agarrando uma cabeça invisível
3. A DECAPITAÇÃO
Por fim, um detalhe ainda mais intrigante: sob os dedos curvos de Maria, o anjo Uriel faz um gesto de quem decepa uma cabeça, como se cortasse o pescoço da cabeça invisível que estava na mão de Maria
O HOMEM VITRUVIANO
Inspirado no livro do arquiteto romano Vitruvius Pollio (70 a.C.-?), De Architetura (que explica a relação entre simetria e perfeição), o desenho mais famoso de Leonardo seria um pentagrama humano, com o corpo de um homem dentro de um círculo simbolizando o equilíbrio entre masculino e feminino. Foi nessa posição que o corpo do curador do Louvre, Jacques Saunière, foi encontrado, fornecendo a primeira pista sobre os mistérios de Da Vinci
AUTO-RETRATO
Em 1992, a artista gráfica Lillian Schwartz colocou lado a lado o auto-retrato de Leonardo e a Mona Lisa. O alinhamento perfeito sugere que a mulher na tela de 77 x 53 cm seja o próprio artista travestido. Conhecida como Gioconda, Mona Lisa seria Lisa Gherardini, mulher do comerciante Francesco del Giocondo
MONA LISA
Este seria o motivo do enigmático sorriso, segundo Brown: vestido de mulher, Leonardo uniria o masculino e o feminino em uma mesma imagem ambígua, cujo título permitiria anagramas como “Amon L’Isa” (reunindo os deuses egípcios Amon e Ísis) e “Sol Anima” (reunindo os ícones masculino, Sol, e feminino, Anima – Alma)
A dinastia merovíngia
A dinastia merovíngia foi a primeira casa real da França a emergir dos escombros do Império Romano. Fundada em cerca de 450 por Mérovée, um rei guerreiro de origem obscura, gozou de um período de paz e prosperidade até entrar em decadência com Dagoberto I (623-639). Em 751, Childeric III, o último rei merovíngio, foi deposto por Pepino III, que daria origem à dinastia carolíngia.
Na versão subversiva da história, a dinastia merovíngia seria composta por descendentes diretos de Jesus Cristo. Dessa forma, grupos como o Priorado de Sião fariam parte de uma conspiração muito mais antiga e ambiciosa: a manutenção da linhagem sanguínea de Cristo até os dias de hoje.
Os cavaleiros templários
De todos os mistérios medievais, nenhum está envolto em mais controvérsias do que a Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão ou Cavaleiros Templários. Uma das narrativas mais conhecidas foi escrita entre 1175 e 1185 por Guillaume de Tyre e afirma que ela foi fundada em 1118 pelo nobre Hugues de Payen.
Ao lado de oito cavaleiros, Hugues teria se apresentado ao rei Baudoin I, de Jerusalém, oferecendo-se para guardar os caminhos que levavam à Terra Santa. Baudoin aceitou a oferta, dando início ao crescimento da ordem. Sob rígidos códigos de conduta (eram obrigados a fazer voto de obediência, pobreza e castidade), os Templários distinguiam-se por vestir uma grande túnica e pelo fato de serem impedidos de deixar o cabelo crescer e de fazer a barba.
Essa é a narrativa oficial. No entanto, alguns fatos ainda permanecem sem explicação. O principal deles diz respeito ao suposto tesouro que a ordem teria encontrado no Templo de Salomão, local sagrado de Jerusalém. Especula-se que seu valor seria inestimável não apenas pelo ouro, mas sobretudo por conter a prova de que Cristo não teria morrido na cruz, e sim escapado para a França, onde teria dado início a uma dinastia sagrada. Seja como for, a descoberta conferiu aos templários um enorme poder político, militar e financeiro.
Ironicamente, o acúmulo de poder seria a ruína da ordem. Em 1314, em meio a conspirações, os templários foram condenados por heresia e seus membros lançados à fogueira. Entre as acusações, sodomia, profanação da cruz e da figura de Cristo. Torturados pela Inquisição, vários membros teriam se referido a uma misteriosa entidade – ou artefato – denominada Baphomet. O nome seria derivado da expressão árabe abufihamet, “pai da compreensão”.
Teorias relacionam o Baphomet a uma criatura meio bode meio humana, posteriormente transformada pela Igreja na representação de Satanás. Seja como for, a posse de tal “tesouro” serviu para fortalecer ainda mais as teorias que ligavam os templários ao segredo da linhagem de Cristo, retratadas no romance Parzival, escrito no século 12 por Wolfram von Eschenbach. Ao descrever os cavaleiros como guardiões do Santo Graal, ele colaborou ainda mais para estreitar os limites que separavam a história da especulação.
O Santo Graal
Para algo que sequer é citado na Bíblia, é de espantar a popularidade do cálice sagrado. Descrito como a taça usada por Cristo na última ceia ou como o cálice que aparou o sangue de Jesus na cruz, a existência do Graal jamais foi comprovada. E mesmo o significado de seu nome é controverso. A versão mais conhecida afirma que Santo Graal seria uma derivação de Sangreal (“sangue real”), uma metáfora para a linhagem sanguínea da dinastia merovíngia, supostamente fundada por descendentes diretos de Jesus Cristo.
Os romances de cavalaria do final do século 12 – especialmente o poema “Conte del Graal”, escrito por Chrétien de Troyes – seriam mensagens cifradas destinadas a um grupo responsável por manter intacta a linhagem de Cristo, um dos temas centrais de O Código Da Vinci.
Inicialmente, os romances sobre a busca pelo Graal eram centrados na saga do cavaleiro Percival. O romance A História do Graal, de Robert de Boron, porém, o associa ao cristianismo descrevendo-o como o cálice que recolheu o sangue de Cristo. Com o passar dos anos – e com a chegada do mito francês à Inglaterra – foram incorporados personagens como o rei Artur, Lancelot e demais cavaleiros da Távola Redonda.
Para saber mais
Na livraria:
A Linhagem do Santo Graal – Laurence Gardner, Madras, 2004
The Woman with the Alabaster Jar – Margaret Starbird, Bear & Company, EUA, 1993
O Santo Graal e a Linhagem Sagrada – M. Baygent, R. Leigh e H. Lincoln, Nova Fronteira, 1993
Na Internet:
https://www.dagobertsrevenge.com
A Opus Dei
Retratada em O Código Da Vinci como uma ordem de fanáticos religiosos adeptos de práticas medievais, incluindo aí a autoflagelação, a Opus Dei é na verdade uma prelazia da Igreja Católica com cerca de 85 mil membros em 60 países. De acordo com seu site oficial, seu principal objetivo é espalhar o evangelho por meio da santificação do trabalho.
No entanto, a descrição negativa que Dan Brown faz da organização não é novidade. Desde sua fundação – em 1928 pelo padre Josemaría Escrivá, mais tarde canonizado pelo papa João Paulo II – a Opus Dei vem sendo alvo de críticas tanto de organizações seculares quanto de grupos católicos.
A principal delas diz respeito a uma suposta tendência ao conservadorismo político e religioso. Incluindo aí conexões com organizações de ultradireita e seitas de inspiração medieval.
Em seu site, a Opus Dei se defende, descrevendo-se apenas como uma organização com objetivos puramente espirituais. “O livro retrata a Opus Dei de maneira falsa, como sendo uma organização preocupada apenas com lucro e poder. A verdade é que a Opus Dei tem como meta ajudar as pessoas a incrementar sua fé, integrando-a àssuas atividades cotidianas,e não implementar qualquer tipo de programa político”,diz o comunicado da organização em seu site.
Dan Brown, no entanto, afirma que a forma como a Opus Dei é retratada foi baseada em mais de uma dezena de livros a respeito da organização, assim como em entrevistas com ex-membros e integrantes da organização.