Pesquisadores descobrem rituais fúnebres de 10,5 mil anos atrás
Nossos antepassados tinham costumes mórbidos quando lidavam com os mortos
André Strauss, arqueólogo da Universidade de Tübingen, na Alemanha, coordena um grupo de pesquisadores que descobriram no Brasil sangrentos rituais fúnebres de 10.500 anos atrás – os mais antigos do País. Batemos um papo com ele.
Qual foi a descoberta de vocês?
Estudamos 26 sepultamentos humanos em Lapa do Santo, Minas Gerais. Eram corpos de velhos, crianças, adultos, homens e mulheres entre 10.500 e 8 mil anos atrás. Todos tinham sinais de rituais mortuários: alguns estavam queimados, outros pintados de vermelho; outros combinavam crânios de crianças com corpos de adultos, ou dentes de uma pessoa com a arcada de outra. O mais interessante é que esses sinais eram diferentes dependendo da idade arqueológica do esqueleto, como se os povos tivessem alterado sua forma de tratar os corpos dos mortos. Isso é inédito na arqueologia brasileira.
Por que ninguém falava desses rituais?
A região já recebeu centenas de expedições de vários lugares do mundo, mas o foco era a relação dos seres humanos com a megafauna da época [como a preguiça gigante]. Ninguém estudava os rituais fúnebres, pois era quase consenso que esses grupos sociais não faziam esse tipo de rito. A nossa descoberta mostra o contrário.
Como eram os rituais?
Infelizmente, não há como saber o que se passava na cabeça das pessoas. O que é possível descobrir, por enquanto, é o que se fazia com os corpos. Por meio de microscópios 3D percebemos que esses grupos não mexiam apenas nos ossos: as intervenções aconteciam logo após a morte, com o corpo de uma pessoa que havia acabado de morrer.
Qual a importância dessa descoberta para a nossa história?
Ela revela um grau de sofisticação dos grupos mais antigos da América muito maior do que a gente imaginava. Ainda não sabemos, mas pode ser que a descoberta mostre também uma diversidade cultural que já estava presente desde o primeiro momento de povoamento do Brasil. Também é importante para lembrar do nosso potencial arqueológico, que é pouquíssimo explorado. Na Europa, a cada 15 km você encontra um sítio arqueológico muito bem preservado. Aqui, não: os maiores parques estão sem proteção, caindo aos pedaços.