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Santo Sudário não foi feito pelo contato com um corpo, aponta estudo brasileiro

A imagem se assemelha mais a uma representação artística, indica nova análise que se soma a décadas de polêmicas envolvendo a origem da peça.

Por Luiza Lopes
Atualizado em 31 jul 2025, 22h57 - Publicado em 31 jul 2025, 19h00

Diz a lenda que o Sudário de Turim, também conhecido como Santo Sudário, foi o pano usado para envolver o corpo de Jesus Cristo após sua morte – e sua imagem teria ficado marcada no tecido. Outra versão da história, no entanto, considera o artefato como uma obra medieval ou mesmo uma falsificação produzida séculos depois dos eventos descritos nos evangelhos.

A peça, feita de linho e medindo cerca de 4,4 metros de comprimento por 1,1 metro de largura, exibe a imagem frontal e traseira de um homem adulto com barba e cabelo longo, mãos cruzadas sobre o baixo-ventre e marcas que sugerem ferimentos causados por flagelação e crucificação. A imagem aparece no tecido de forma semelhante a um negativo fotográfico, o que contribui para o mistério em torno de sua origem.

A primeira menção histórica ao sudário data de 1355, quando ele surgiu na cidade de Lirey, no norte da França, sob a guarda de um cavaleiro. Desde então, passou a ser venerado por fiéis, mas também alvo de ceticismo. Poucos anos depois, em 1389, o bispo local chegou a declarar que a peça era uma falsificação e proibiu sua exposição.

Apesar disso, ela continuou sendo protegida por membros da nobreza e, eventualmente, foi transferida para o Ducado de Savóia e, mais tarde, para Turim, na Itália, onde permanece até hoje.

Em 1988, um dos momentos mais marcantes do debate sobre a autenticidade do Sudário ocorreu quando três laboratórios independentes realizaram testes de datação por carbono-14. Os resultados indicaram que o tecido foi produzido entre os anos 1260 e 1390 – ou seja, na Idade Média.

A descoberta abalou os argumentos dos que viam o sudário como relíquia do século 1. Desde então, no entanto, alguns pesquisadores alegam que a amostra analisada poderia ter sido de uma parte remendada do tecido, o que poderia ter interferido no resultado. O debate segue em aberto.

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Agora, um novo estudo publicado na revista Archaeometry e conduzido pelo designer brasileiro Cícero Moraes reforça a ideia de que o Sudário não tem origem na Antiguidade e, mais do que isso, sugere que a imagem no tecido sequer representa um corpo humano real.

Utilizando técnicas de modelagem 3D e reconstrução facial forense, Moraes analisou as proporções do homem representado no pano.

“Quem trabalha com 3D e entende um pouco de anatomia, ao bater o olho na imagem do sudário, percebe algumas incongruências”, afirma ele à Super.

“No meu caso, inicialmente percebi um problema de deformação. Depois, ao analisar com mais atenção, notei que a anatomia não era compatível com a de uma pessoa viva. Um dos braços era maior que o outro, os membros estavam excessivamente retos — e o corpo humano não é assim.”

Segundo o designer, mesmo considerando que a imagem tenha sido distorcida por irregularidades no tecido, os desvios observados não correspondem a padrões anatômicos naturais. “O que encontramos é algo mais próximo de uma construção artística do que de uma representação fiel de um corpo.”

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Modelo tridimensional ajustado à figura do sudário, proveniente de imagem disponível em Wikimedia Commons e editado no software The Gimp.
(Cícero Moraes/Divulgação)

Em um vídeo publicado no Youtube, ele propôs um teste simples para ilustrar o ponto: “Qualquer adulto cuidadoso pode testar isso em casa, por exemplo, pintando o rosto com algum pigmento líquido, usando um grande guardanapo ou toalha de papel, ou até mesmo um tecido, e envolvendo-o ao redor do rosto. Depois, retire o tecido, espalhe-o em uma superfície plana e veja a imagem resultante”. 

Segundo ele, a distorção inevitável desse processo é conhecida como efeito Máscara de Agamêmnon – em referência ao artefato grego que lembra um rosto achatado. A ausência desse tipo de deformação no Sudário, afirma Moraes, é mais um indício de que a imagem não se formou pelo contato direto com um corpo real.

A conclusão de Moraes encontra respaldo em interpretações históricas sobre os rituais funerários da época. O professor André Leonardo Chevitarese, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explica que o uso de mortalhas panos usados para envolver o corpo antes do sepultamento era comum entre os judeus do século 1, mas pouco provável no caso específico de Jesus.

“Crucificados não eram enterrados”, afirmou à BBC News Brasil em 2023. “Simplesmente eram jogados em uma vala comum e o tempo se encarregava de fazer seus corpos desaparecerem. Era preciso ser suficientemente abastado para ter uma sepultura.”

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Segundo o historiador, a intenção das autoridades romanas ao executar alguém por crucificação era apagar qualquer memória daquele indivíduo. “O uso da mortalha era uma prática naquele contexto, mas o Jesus histórico não foi enterrado porque era pobre e porque foi crucificado”, ressaltou.

A Igreja Católica, por sua vez, nunca declarou oficialmente que o Sudário é autêntico, embora permita sua veneração como símbolo de fé. Para o Vaticano, trata-se de um objeto que pode inspirar reflexão sobre o sofrimento de Cristo, independentemente de sua origem exata. 

Arte funerária

Conforme aponta Moraes, as características rígidas do corpo representado no Sudário se aproximam mais de uma construção artística do que de uma representação anatômica fiel.

Ele observa semelhanças entre a imagem e a arte funerária produzida na Europa durante a Idade Média – período em que era comum retratar o corpo humano de maneira estilizada, refletindo crenças espirituais ligadas à morte e à vida após a morte.

Efígies esculpidas em túmulos medievais, por exemplo, costumavam exibir figuras com traços simétricos e rígidos, marcados por uma estética simbólica.

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Esses elementos, segundo o designer, também estão presentes no item religioso, sugerindo uma possível influência dessa tradição artística.

“O Sudário me parece uma arte religiosa que foi bem-sucedida, porque, diferente da arte tumular – que geralmente vem com elementos escritos e verbais explicando quem era a pessoa que havia falecido –, ele é não verbal”, afirma. “Muitas informações acerca da pessoa que faleceu estão implícitas na imagem.”

Para Moraes, esse caráter não verbal contribui para o impacto emocional da peça. “Ele causa fascínio e consegue, de alguma forma, fazer com que as pessoas se sintam tocadas por essa arte”, diz. “Nesse contexto, ele foi muito bem-sucedido.”

 

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