Coronavírus: roubo de papel higiênico e outros episódios insólitos da epidemia
Update: além de provocar um caos de abastecimento, o novo coronavírus pode ser a gota que faltava para o Japão entrar numa recessão brava.
O novo coronavírus já causou 1775 mortes – (16% mais do que na última segunda-feira, dia 10), e são quase 72 mil os casos confirmados. Foram apenas cinco mortes fora da China, mas já há contaminados em 29 países. A América Latina agora é a última região do planeta sem o vírus após o Egito anunciar o primeiro caso confirmado na África.
No dia 11, a doença causada pelo vírus ganhou um nome oficial – covid-19. Enquanto pesquisadores correm para desenvolver uma vacina e testam diversos tipos de medicamentos em busca de uma cura, as consequências da nova crise se espalham. Companhias aéreas como a American Airlines, a United Airlines e a British Airways suspenderam a maioria de seus voos para a China temporariamente. Mas não é só isso: apesar de não ser a primeira doença do tipo a causar epidemias graves – a SARS, em 2002, e a MERS, em 2012, também foram causadas por outros coronavírus – a covid-19 tem gerado algumas situações únicas, e inusitadas. Confira algumas.
Roubo de papel higiênico
Enquanto os números da doença disparam, o pânico sobe junto. Segundo uma análise da CNN, quase 700 milhões de chineses (metade da população) está sob algum tipo de restrição de deslocamento – sejam medidas auto-impostas ou estabelecidas por autoridades. E, como em outros episódios de epidemia, a demanda por suprimentos básicos chegou a níveis alarmantes – já que as pessoas passam a estocar comida e medicamentos, com medo do pior.
Em Hong Kong, a situação ficou tão crítica que um trio de homens chegou a roubar 600 rolos de papel higiênico na manhã desta segunda (17). Armados com facas, eles renderam um funcionário do transporte e levaram o equivalente a mais de 550 reais do produto em meio a falta nas prateleiras dos supermercados. Dois deles já foram presos, e a polícia procura o terceiro.
Outros itens também têm sumido do comércio local, como arroz, macarrão e álcool em gel. O problema se agravou quando Hong Kong anunciou que iria restringir o transporte entre a cidade e a China continental, o que levou ao medo de que o comércio também seria interrompido. Assim, a população foi às compras e, no desespero, levou grandes quantidades de produtos para estocar, causando a escassez.
Incapaz de suprir a demanda, o comércio local vem colocando restrições por pessoas nas vendas. O governo local, porém, reitera que a circulação de produtos entre Hong Kong e China continua normalmente e que não há necessidade de desespero.
O pânico pode até ser irracional, mas não é injustificado: em 2003, Hong Kong sofreu com o surto da SARS, que totalizou mais de 300 mortes na região. Assim como a covid-19, a doença sugiu na China continental, mas demorou a ser relatada por Pequim, o que gerou desconfiança entre o território autônomo e as autoridades chinesas. Na época, também houve escassez de produtos essenciais durante o surto.
Impacto econômico
Ainda não há como saber o impacto do surto de covid-19 na economia global. Mas não será pequeno, já que ela afeta a segunda maior economia do mundo, que equivale à 16% do PIB global. Um dos problemas aí é o seguinte: uma fábrica no Brasil que precise de peças chinesas, por exemplo, vai ter que parar de produzir caso essas peças não cheguem. E aí quem se complica é a nossa economia – sem produção, a fábrica pode dispensar funcionários, por exemplo. Sem falar que a China é o maior cliente das exportações brasileiras.
A situação do Japão, de qualquer forma, parece ser a mais complicada. É que o país conseguiu um feito. Após um aumento nos impostos sobre o consumo, o PIB japonês caiu estrondosos 6,7% no último trimestre de 2019 (o número saiu hoje, dia 17). Tudo isso sem um pingo do efeito do coronavírus – que só passou a afetar a economia japonesa a partir de janeiro de 2020.
Um trimestre de queda no PIB não mata ninguém. Mas dois seguidos configuram uma recessão econômica. Com a pancada da covid-19, é provavelmente o que vai acontecer com os nipônicos: além de ser grande parceiro comercial da vizinha China, o Japão também conta bastante com os yuans dos turistas de lá, que não têm mais entrado. Além disso, o país tem o segundo maior número de casos da doença – mas de uma forma pouco usual, como vamos ver aqui.
Vírus a bordo
O segundo país com mais casos não é um país. É um navio de cruzeiro, o Diamond Princess, que está ancorado no porto de Yokohama, no Japão. São 454 casos lá – bem mais do que na terra firme do Japão, que soma 66 casos (isso deixa o território japonês com um total de 520 casos, bem mais do que a nação que ocupa o terceiro lugar em número de infectados: Singapura, com 77).
Ainda há 3.257 pessoas à bordo, entre passageiros e tripulação. Todos estão em quarentena desde o dia 4 de fevereiro, quando um passageiro desembarcou em Hong Kong e apresentou sintomas. Desde então, as pessoas a bordo estão seguindo protocolos de prevenção, que incluem permanecer em suas cabines a maior parte do tempo e usar máscaras e roupas de proteção.
Aqueles que têm o diagnóstico confirmado desembarcam e são levados a hospitais em terra firme para tratamento. O restante permanece preso no navio até o fim da quarentena, com exceção dos americanos: os EUA resolveram evacuar seus cidadãos que estavam no cruzeiro, com exceção do mais de 40 que já haviam sido diagnosticados com covid-19. Outros países, como França e Reino Unido, estudam fazer o mesmo.
Não é a primeira vez que um navio é colocado em quarentena por conta de uma doença infecciosa. Mas a medida nunca foi tomada em proporções tão grandes – e nem por tanto tempo. Alguns especialistas em saúde pública inclusive vem questionam a efetividade da manobra, argumentando que manter pessoas saudáveis confinadas em um mesmo ambiente que pessoas infectadas pode promover o espalhamento da doença, e não contê-lo.
Além disso há relatos de que, embora os procedimentos de quarentena estejam sendo rigorosos entre os passageiros, grande parte da tripulação do navio está trabalhando sob risco – e alguns inclusive chegaram a ser infectados. De qualquer forma, o Ministério da Saúde do Japão anunciou que vai continuar com a quarentena até, pelo menos o dia 19 de fevereiro.