Maconha: qual a diferença entre legalização e descriminalização?
O STF descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal. E agora? Vem entender o que isso significa na prática, e qual a diferença entre descriminalização e legalização.
Na última terça-feira (25), o Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. O julgamento começou nove anos atrás, e agora o Brasil é o maior país do mundo a colocar o uso da droga fora do âmbito criminal.
Mas o que isso significa na prática? Descriminalizar é a mesma coisa que legalizar? Agora pode fumar em público? Já dá para comprar pelo iFood? E na padaria, vai ter? Longe disso.
Legalizar X descriminalizar
Descriminalizar e legalizar são coisas bem diferentes. Na Lei de Drogas (nº 11.343, de 2006) brasileira, é crime produzir drogas, mas não portar ou produzir as substâncias de forma caseira para consumo próprio.
O problema, desde 2006, era que não havia critérios objetivos para diferenciar o porte para consumo próprio do tráfico de drogas. A lei diz o seguinte: “para determinar se a droga destina-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente”.
Em outras palavras, o enquadro como tráfico ou uso pessoal depende do contexto, que fica aberto à interpretação. Um estudo feito pelo Insper mostrou que, nas abordagens policiais do estado de São Paulo, essa falta de regras faz com que pessoas negras sejam consideradas traficantes em situações que brancos não seriam.
Agora, o que foi estabelecido é que o porte de até 40 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas em casa não configura crime. Mas essa descriminalização não quer dizer que o uso e a produção da droga foram legalizados. A maconha continua ilícita.
Isso quer dizer que o comércio da erva continua sendo enquadrado como crime de tráfico de drogas. A única coisa que muda é a aplicação da Lei de Drogas, que não tinha critérios objetivos para decidir quem era traficante de maconha ou não, e agora tem.
Drogas legalizadas, como o álcool e o tabaco, tem sua produção e seu consumo regulamentados pela lei. A maconha não se enquadra nessa categoria, e seu uso em público continua proibido.
Na prática
Quem for encontrado portando maconha vai ter a droga apreendida, deve comparecer em uma audiência jurídica e pode ficar sujeito a sanções administrativas, penalidades previstas em lei para quem a violar. Um exemplo disso são as multas de trânsito.
No caso da maconha, o usuário pode ter que comparecer a cursos educativos que advertem sobre os perigos da substância. Como o usuário não está cometendo um crime, não há registro de antecedentes criminais.
A decisão do STF passa a ter efeito prático assim que a ata do julgamento for publicada, o que ainda não aconteceu.
Os novos critérios não são absolutos. Os juízes do STF concordaram que outros elementos podem ser usados para diferenciar o traficante do usuário, dependendo do caso. As circunstâncias da apreensão, o jeito que a droga estava armazenada ou registros de vendas podem apontar para o crime de tráfico, mesmo que a quantidade esteja abaixo dos 40 gramas.
Luís Roberto Barroso, o presidente do STF, disse que a decisão pode valer retroativamente para pessoas condenadas pela Justiça em casos que agora não seriam considerados criminais. Essa revisão de pena não seria automática, ocorrendo só se a defesa da pessoa apresentar um recurso para a Justiça.