O que está acontecendo com os índios isolados na Amazônia?
Um massacre indígena sob investigação mostra a fragilidade das comunidades totalmente separadas da sociedade externa - e a importância de preservá-las
O Ministério Público Federal no Amazonas está investigando o que pode se provar a maior chacina indígena do século 21: um grupo isolado de índios do Vale do Javari, no extremo oeste da Amazônia brasileira teria morrido no mês de agosto, assassinados por garimpeiros com armas de fogo.
A região entre rios Jandiatuba e Jutaí, perto da fronteira com o Peru, fica a mil quilômetros de Manaus e é de difícil acesso. Lá vivem mais de dez de grupos de índios voluntariamente isolados da sociedade externa. Sabemos muito pouco sobre a maioria deles – um dos grupos chegou a ficar famoso graças a uma foto aérea. Sobre a comunidade da qual fariam parte as vítimas, só se sabe que vem sendo chamados de “Índios flecheiros”.
As mortes chegaram a ser confirmadas pelo MP na última sexta-feira, mas depois a informação foi corrigida: só está confirmado que há investigação e que dois garimpeiros foram detidos e liberados depois de prestar depoimento. A Funai, responsável pela denúncia, disse em comunicado que, por enquanto, não foram encontradas “provas materiais” que comprovem as mortes – apesar de ter julgado que há motivo para investigação.
Entre tantas incertezas, são os próprios índios que tem pedido a palavra. Sua principal denúncia são os fechamentos das bases de monitoramento da Funai, que servem exatamente garantir que os índios tenham recursos, especialmente em situações de estado de emergência, e a omissão do órgão ao lidar com a situação.
“Esse Massacre dos Flecheiros, que foram mortos pelos garimpeiros que entraram na região ocupada pelos isolados, nós soubemos por relatos de nossos parentes indígenas. E o Estado diz que não está acontecendo. A Funai diz que não tem prova. […] Mas as informações que chegam dos parentes é que os isolados foram massacrados”, diz o depoimento de Paulo Marubo, coordenador da União dos Povos Indígenas do Javari.
“Como os isolados não sabem se defender no mundo brancos, a gente está aqui, pelo movimento indígena, para defender eles”, acrescenta. “Nós não fazemos um relatório técnico como os brancos: mas fazemos cartas, que, para nós, do movimento indígena, é o relatório dos índios. O que nos queremos agora é uma resposta do governo sobre a situação das invasões e das mortes dos isolados. […] Os isolados não morrem só de tiro, também de doenças. E se deixaram lá alguma roupa contaminada por gripe? Eles vivem num mundo diferente, não tem anticorpos, e podem pegar algumas doenças e morrer rápido. Se a gente diz isso para a Funai, a Funai quer um relatório técnico. Mas nós vamos falar por meio de nossas notas e nossas cartas”. O apelo completo de Marubo pode ser lido aqui.