O avanço da soja no cerrado brasileiro, mapeado pela Nasa
Imagens feitas pela agência espacial americana acompanham como o cultivo do grão se intensificou – e transformou o oeste da Bahia num tapete
Para superar os Estados Unidos e se tornar o principal produtor de soja do mundo na última safra, o Brasil expandiu por anos as lavouras destinadas ao grão. Só entre 2000 e 2014, a área destinada a plantar essa commodity no interior do País – em estados como Bahia, Piauí e Maranhão – cresceu 87%. Boa parte dela abrigava vegetação nativa, originalmente.
Pelo fato de áreas desmatadas da Amazônia serem protegidas por uma moratória desde julho de 2006, o bioma mais visado pelo avanço do agricultura em larga escala acabou sendo o cerrado. Hoje, a produção de grãos por lá é quatro vezes maior que a da Amazônia.
Laerte Guimarães Ferreira, pesquisador da Universidade Federal de Goiás (UFG), afirmou à Revista Época em 2017 que quase 50% da cobertura vegetal original do cerrado deu lugar a plantações nos últimos 40 anos. A soja representa, atualmente, 90% de todos os cultivos das savanas brasileiras.
O cerrado se estende por 18 estados e representa cerca de 22% do território nacional, somando mais de 2 milhões de quilômetros quadrados. Estima-se que só 8,21% disso esteja, atualmente, fora dos limites da expansão agrícola. Menos de 2,85% da área ocupada pelo bioma corresponde a unidades de conservação de proteção integral, que não podem ser usadas para atividade econômica.
A Nasa, agência espacial americana, montou um mapa para registrar o passo a passo dessa expansão – que você pode ver abaixo. Os pontos verdes mostram o tamanho das plantações de soja no cerrado antes da moratória para a Amazônia, entre 2001 e 2006. Já os pontos em roxo surgiram depois que a medida já estava valendo, de 2007 em diante (os dados vão até 2013).
Uma carta pública assinada pela ABC (Academia Brasileira de Ciências) e pela SBPC (Sociedade Brasileira de Progresso para a Ciência) em abril de 2017 argumenta que o cerrado é o tipo de savana mais ameaçado pela atividade humana em todo o mundo. Também é o mais rico em espécies – o Ministério do Meio Ambiente fala em mais de 1000 tipos diferentes de pássaros e mamíferos. Ironicamente, nós conhecemos melhor os mamíferos de savanas africanas, como elefantes e girafas, que os tamanduás, antas e quatis que vivem por aqui.
“Áreas outrora ocupadas pela vegetação nativa são agora ocupadas, sem planejamento, por pastagem, agricultura, silvicultura, mineração e expansão urbana, em muitas situações resultando na expropriação dos territórios das populações indígenas e tradicionais”, afirma a carta. A principal reivindicação era de que pelo menos 20% de áreas se tornassem protegidas por leis de conservação.
Matopiba e o foco da expansão
A imagem que você vê acima retrata a região conhecida por Matopiba, nome formado pelas siglas de quatro estados do norte-nordeste: Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Ela foi feita pelo instrumento MODIS (Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer), que está à bordo do satélite Aqua, da Nasa, em setembro de 2018. No destaque está a região oeste da Bahia, parte do Matopiba que conta com maior número de propriedades focadas na produção de soja.
A área denominada Matopiba tem 6 milhões de habitantes e 340 mil quilômetros quadrados de extensão. Entre 2010 e 2015, as exportações da soja cultivada por lá mais que dobraram: foram de 3,5 milhões de toneladas anuais a 7,1 milhões de toneladas. Na safra do verão de 2014, a região foi responsável por quase 10% dos grãos produzidos no país – algodão e arroz são outras culturas expressivas.
Em maio de 2018, o Ibama (Instituto Nacional de Meio ambiente) multou 78 pessoas que plantavam, comercializavam ou financiavam atividades em áreas embargadas na região. A multa, que soma R$ 105,7 milhões, será cobrada de empresas importantes do agronegócio nacional, como Cargill e Bunge.