Caçadores de poeira cósmica varrem telhados de catedrais
Toneladas de poeira estelar caem na Terra o tempo todo. Ela se esconde em telhados, calçadas e nas nossas casas. E pode render descobertas – desde que você seja muito paciente.
O universo é igual ao meu quarto: ambos tem poeiras que a gente nem se dá conta que existem.
A poeira cósmica inclui partículas de pó interplanetário, que são pedacinhos de cometas, asteroides e outros corpos com menos de 0,1 mm de diâmetro; e micrometeoritos, pedaços ligeiramente maiores, com até dois milímetros, que sobrevivem à entrada na atmosfera e caem na Terra.
Embora minúsculas, essas partículas compõem a maior parte da massa de materiais do espaço que vem parar na Terra anualmente. Quando caem na Terra, elas ficam presas nas folhas das árvores e nos telhados dos prédios, e até se misturam com a poeira que a gente varre do quarto.
Alguns modelos sugerem que 15 mil toneladas de poeira cósmica (o equivalente a 75 baleias azuis) atinjam nossa atmosfera por ano, e que 5 mil toneladas consigam atravessá-la e chegar à superfície.
Esses pequenos fragmentos podem nos dizer muito sobre a composição química de asteroides e cometas que vagam pelo espaço. E é por causa disso que Penny Wozniakiewicz e Matthias van Ginneken, dois pesquisadores da Universidade de Kent, no Reino Unido, aspiraram o teto da Catedral de Cantuária. No meio da poeira, eles estavam procurando vestígios estelares.
Os dois estavam atrás de um tipo específico de poeira extraterrestre: esférulas cósmicas. Por causa de sua forma distinta (que, você já pode imaginar, é esférica) elas são mais fáceis de identificar do que outros tipos de poeira. Mesmo assim, ainda é necessário usar um microscópio para ter certeza de que um fragmento veio realmente do espaço.
“Você tem que ser um pouco detetive”, afirma Van Ginneken em uma reportagem feita pelo The Guardian. Na hora em que entra na atmosfera, a poeira passa por um aquecimento extremo que altera muitos dos minerais. “É preciso descobrir a natureza da partícula original com base nas informações limitadas que temos”.
So Much (For) Stardust
Hoje, o melhor lugar para se recolher poeira cósmica é a Antártica – em termos de pó, ela é uma grande biblioteca abandonada. O continente gelado é o lugar mais seco da Terra, já que toda água por lá é gelo. Por lá, a poeira estelar e os meteoritos duram muito tempo e as amostras coletadas têm mais chance de conter material cósmico (afinal, quase não há poeira produzida por nós).
Mas isso não quer dizer que ela seja o único lugar. Em 2009, Jon Larsen, um músico de jazz norueguês, começou sua jornada como caçador de poeira cósmica. Ele analisava centenas de quilos de poeira em busca de algum fragmento espacial.
Em 2017, ele se juntou a astrônomos, incluindo Van Ginneken, para publicar um artigo na revista especializada Geology – mostrando que qualquer pessoa com um microscópio e muita paciência podia encontrar poeira cósmica na calçada.
Por mais que a poeira espacial possa ser encontrada em qualquer canto do planeta, é difícil recolhê-la para estudos – as pequenas partículas são facilmente contaminadas, o que pode atrapalhar as análises.
Mas ir para a Antártica é muito caro e difícil. Além disso, as condições podem ser ideais demais para serem verdade. Os telhados ampliam as oportunidades para investigar como essas minúsculas partículas interagem com diferentes ambientes do mundo real.
Telhados de catedrais são particulamente interessantes para caçar poeira cósmica, porque são grandes, geralmente inacessíveis e praticamente intocados – só sofrem influência das chuvas, da neve e da poluição da atmosfera.
Passar o aspirador de pó é a parte mais fácil da investigação. Depois de encher sacos e sacos de poeira (potencialmente) cósmica, os pesquisadores vão precisar analisar cada partícula sob um microscópio. Serão horas e horas e horas examinando esferas na esperança de que alguma delas tenha vindo do espaço.
Pelo menos eu quando varro meu quarto, posso jogar a poeira no lixo. Se bem que, parando para pensar, eu posso estar desperdiçando uma preciosa amostra científica.