Cavalos usam uma grande variedade de caretas para se comunicar, diz estudo
Uma nova pesquisa catalogou mais de 800 expressões dos equinos e descobriu exemplos inusitados de expressão não-verbal.

Cavalos são animais sorridentes. Quando um sorriso é acompanhado de um balançar de orelhas ou de uma virada de cabeça, porém, o significado pode ser outro além de simples alegria.
Entre animais, a maioria dos movimentos faciais funcionam como uma forma não verbal de comunicação. Eles ajudam membros da mesma espécie a transmitir emoções ou outros sinais entre si, por exemplo.
Os cavalos são ótimos exemplos disso. Os movimentos das suas orelhas, por exemplo, são conhecidos entre pesquisadores como indicadores importantes do estado do animal. Agora, um novo trabalho sugere que as muitas caretas dos equinos também funcionam como uma espécie de “cavalês”.
“Os cavalos produzem um repertório rico e complexo de expressões faciais, e não devemos ignorar as nuances nelas se quisermos realmente compreender as experiências desses animais”, diz Kate Lewis, pesquisadora da Universidade de Portsmouth e autora da pesquisa, para o The Guardian. Segundo a cientista, o esforço de entender as caretas dos cavalos também pode ter outras aplicações, como melhorar o cuidado e o bem-estar desses bichos.
Os pesquisadores envolvidos no estudo, que foi publicado no Peer J, criaram as primeiras descrições do comportamento facial equino, mapeando em detalhes como os cavalos usam seus rostos para comunicar emoções como agressividade, curiosidade, atenção e brincadeira.
A equipe analisou 72 horas de observações filmadas para explorar quais movimentos faciais tendiam a ocorrer em cada contexto. Usando o Sistema de Codificação de Ações Faciais Equinas (EquiFACS), um repertório existente de movimentos faciais de cavalos, os pesquisadores catalogaram 805 expressões faciais usadas em 22 comportamentos distintos. Cada movimento facial foi associado a ações musculares específicas, permitindo uma codificação precisa e objetiva. A equipe também aplicou uma nova ferramenta estatística para analisar como essas expressões se agrupam em diferentes contextos sociais.
“Esta é a primeira vez que conseguimos documentar sistematicamente como os cavalos combinam movimentos faciais em expressões significativas”, diz Leanne Proops, professora de comportamento e bem-estar animal, em comunicado.
“A beleza do que fizemos aqui é que fomos sistemáticos na forma como documentamos as expressões faciais e que cobrimos uma ampla gama de comportamentos naturais”, diz Lewis. “Algo dessa magnitude nunca foi feito antes sobre os cavalos, e é realmente emocionante ver as sutilezas na forma como os animais se comunicam entre si.”
Caras e bocas
Os pesquisadores concluíram que a grande maioria dos movimentos faciais aconteciam em diferentes contextos, sem apresentar um único padrão específico. Porém, alguns eram mais propensos a aparecer em certos tipos específicos de interação.
Por exemplo: quando os cavalos interagem de forma pacífica entre si, não é apenas o movimento das orelhas ou o balançar do rabo que transmite o que estão sentindo. O estudo revelou que, durante encontros amigáveis, os cavalos costumam projetar o nariz para frente, sinalizando um estado de relaxamento e sociabilidade.
Mas se algo chama a atenção do animal, a expressão muda: as orelhas se voltam para frente e se aproximam uma da outra, indicando foco total – essa é uma reação parecida com a vista em outras espécies, como os cães.
Durante interações brincalhonas, os cavalos frequentemente abaixam o lábio inferior, levantam o queixo, abrem bem a boca e giram as orelhas para trás. Além disso, é comum que mostrem mais a parte branca dos olhos, empurrem o nariz para frente e mantenham a cabeça erguida ou levemente inclinada para a direita. É uma expressão marcante, que envia uma mensagem clara: “Isso é só brincadeira, relaxa, não é uma briga.”
Já em situações de agressividade, foi possível observar um conjunto completamente diferente de sinais faciais. Os pesquisadores notam que, quando o clima esquenta entre os equinos, as orelhas se achatam para trás, as sobrancelhas internas se elevam, as narinas se dilatam e a cabeça se abaixa, como um claro aviso para que o outro recue. Esse conjunto de sinais ajuda a evitar que conflitos escalem.
“Esses resultados destacam a importância de não se basear apenas em um aspecto do rosto, como as orelhas, para entender o que o cavalo está tentando comunicar,” explica Lewis. “Precisamos considerar como os diferentes movimentos faciais trabalham juntos para formar a expressão completa.”
A autora acrescenta que esse “rosto de brincadeira” não é exclusivo dos cavalos. Primatas e alguns carnívoros, como os ursos, também abrem bem a boca durante interações lúdicas. Esse comportamento serve para sinalizar que aquilo não é uma ameaça, evitando que a brincadeira vire confronto. “Essa expressão já havia sido descrita de forma anedótica em cavalos, mas agora conseguimos demonstrar que ela realmente existe e, o mais importante, que envolve os mesmos músculos que nos primatas,” explicou Lewis.
A descoberta sugere que esse tipo de expressão surgiu muito antes na história dos mamíferos do que se imaginava, ou pelo menos antes de cavalos e primatas seguirem caminhos distintos na árvore evolutiva.