Cientistas treinam inteligência artificial para achar vida em Marte
Algoritmo aumentou a chance de encontrar seres capazes de sobreviver dentro de rochas. Foi no Deserto do Atacama, mas pode ser em outros planetas também
Uma equipe de pesquisadores treinou uma inteligência artificial para mapear bioassinaturas em uma área de três quilômetros quadrados no deserto do Atacama, no Chile, e ajudá-los a encontrar organismos vivos em um dos lugares mais secos do planeta. A ferramenta funcionou – e pode revolucionar a busca por vida em outros planetas.
Uma bioassinatura é qualquer recurso, como um fóssil ou uma molécula, que forneça evidências de vida passada ou presente em um ambiente. Encontrar pistas do tipo em outro planeta é, claro, uma missão desafiadora. Veja só o caso de Marte. O rover Perseverance, da Nasa, pousou no Planeta Vermelho em 2021 para coletar amostras de rochas e solo marciano. Outra espaçonave deve resgatar o material e trazê-lo para cá, se tudo der certo, em 2030.
Rovers podem viajar distâncias limitadas e coletam poucas amostras. Por isso, é preciso escolher um local de pouso que tenha uma boa chance de apresentar bioassinaturas. No caso do Perseverance, esse lugar é a cratera Jezero, que teria abrigado um lago há 3,5 bilhões de anos – por isso, teria grande variedade de minerais no solo e, quem sabe, vestígios de micro-organismos que habitaram o planeta. Escolher esse local não foi fácil: isso demandou cinco anos de pesquisa e a avaliação de mais de 60 candidatos.
Mas a inteligência artificial poderia facilitar essa busca, como demonstrou o estudo liderado por Kimberley Warren-Rhodes, pesquisadora do SETI Institute da Califórnia, uma organização sem fins lucrativos cuja missão é entender a origem da vida no Universo.
Warren-Rhodes e seus colegas viajaram para o Deserto do Atacama em 2016. Esse lugar é um dos ambientes extremos da Terra que os cientistas consideram análogos a Marte – e estudam para determinar como e onde os organismos vivos prosperam. A equipe da pesquisadora do SETI Institute procurava, justamente, uma forma de vida insólita conhecida como endólitos: espécies de bactérias, fungos e outros seres capazes de sobreviver dentro de rochas com pouco (ou nenhum) acesso a oxigênio ou nutrientes do exterior.
Para procurar os endólitos, a equipe mapeou o ambiente juntando imagens de drones, análises geoquímicas e sequências de DNA – um conjunto de dados que imita o tipo de informação que outros pesquisadores estão coletando em Marte com equipamentos como o Perseverance, satélites orbitais e drones. Então, eles usaram um algoritmo para prever onde a vida era mais provável de ser encontrada no Atacama.
Os pesquisadores conseguiram reduzir sua área de busca em 97% e aumentar sua probabilidade de encontrar os endólitos em 88% com as orientações do algoritmo. Eles descobriram que esses organismos aparecem com mais frequência no Deserto do Atacama, em um mineral chamado alabastro e em áreas de transição entre um microhabitat e outro – como na junção entre alabastro e areia.
O Atacama é relativamente simples em relação aos habitats e aos tipos de vida que aparecem por lá – por isso, o novo método ainda precisa ser testado em outros ecossistemas com geologia mais complexa e maior biodiversidade. Seja como for, os cientistas afirmam: estes foram os primeiros passos para a detecção de bioassinaturas usando inteligência artificial.
O estudo foi publicado nesta segunda (6) na revista científica Nature Astronomy.