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Como a vida de Konstantin Tsiolkovsky pode inspirar a sua

"Primeiro, inevitavelmente, a ideia, a fantasia, o conto de fadas. Então, cálculo científico. Ao fim, a realização coroa o sonho"

Por Salvador Nogueira
Atualizado em 9 abr 2017, 14h00 - Publicado em 7 abr 2017, 19h05

O sonho. Nada é mais importante do que o sonho. A ambição de criar algo, de contribuir com alguma coisa transformadora no mundo, a sensação de que temos uma visão a realizar. Todos temos essa sensação, num momento ou outro da vida. A história de Tsiolkovsky nos mostra que vale a pena nos orientarmos por esse tipo de sentimento. Não podemos desistir de um sonho porque ele nos parece absurdo. Vale a pena lutar por ele.

O próprio Tsiolkovsky é hoje tido no mundo inteiro com o pai da astronáutica – uma das revoluções tecnológicas mais extraordinárias do século 20, não tanto por seus aspectos mais sonhadores, como a exploração e a colonização do espaço, mas por suas aplicações práticas, com os satélites de telecomunicações e de monitoramento dos recursos naturais terrestres. E note que o cientista russo jamais chegou a construir nada. Apenas projetou, mas com tamanha confiança e precisão de cálculo que a ninguém que levou a sério a leitura de seus trabalhos pareceu que ele estava só vendendo o seu peixe temperado com o mais puro “especulol”.

Konstantin sabia de antemão que esse seria o caso, que não poderia levar a termo sua visão. Caberia a ele apenas entregá-la ao mundo e então permitir que ela adquirisse vida própria. Pouco antes de sua morte, ele escreveu: “Minha vida toda eu sonhei que pelo meu trabalho a humanidade pudesse ser avançada ao menos um pouco”. Também tinha ciência de que havia muito mais a fazer. “Minha vida inteira consistiu em reflexões, cálculos, trabalhos práticos e testes. Muitas questões permanecem sem resposta; muitos trabalhos estão incompletos ou não publicados. As coisas mais importantes ainda estão à frente.”

Note que a necessidade de que a própria humanidade alcançasse seu sonho não desestimulou Tsiolkovsky. Muito pelo contrário: sabedor de que seria difícil transformar sua visão em realidade, ele considerou seu trabalho – ainda que preliminar – parte integrante da construção do futuro, um futuro que só chegaria sem ele.

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Outros beberam dessa mesma fonte para tornar a astronáutica um empreendimento viável. Quando o americano Robert Goddard “redescobriu” algumas das descobertas de Tsiolkovsky e sugeriu que um foguete poderia ser usado para visitas à Lua, em 1920, ele foi ridicularizado por um editorial do jornal The New York Times. “Aquele professor Goddard, com sua ‘cátedra’ no Clark College e o estímulo da Instituição Smithsonian, não sabe a relação de ação e reação, e da necessidade de ter algo melhor do que um vácuo contra o que reagir – dizer isso seria absurdo. Claro, ele apenas parece carecer o conhecimento apresentado diariamente no ensino médio.”

Foi preciso esperar 49 anos para que o The New York Times corrigisse sua injustiça. Ironicamente, aconteceu em 17 de julho de 1969, um dia depois do lançamento da missão Apollo 11, que levaria a primeira tripulação à superfície da Lua. Uma pequena nota de 3 parágrafos resumia o editorial de 1920 e concluía: “Mais investigação e experimentação confirmaram as descobertas de Isaac Newton no século 17 e agora está definitivamente estabelecido que um foguete pode funcionar num vácuo tão bem quanto na atmosfera.  O Times lamenta o erro”.

Tsiolkovsky foi encarado com o mesmo tipo de ceticismo ignorante, mas, de certa forma, acabou protegido pelo mesmo isolacionismo que permitiu o desenvolvimento de ideias tão arrojadas para sua própria época.

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É notável como o pensador russo teve de driblar seu isolamento usando seu próprio intelecto em substituição à maioria das contribuições de outros cientistas para a compreensão da natureza. Ele basicamente “redescobria” tudo quanto era necessário para seguir adiante com suas ideias. Foi justamente essa característica que encantou Dmitri Mendeleev, um decano da ciência.

Além disso, Konstantin teve de lidar com a sua deficiência física –  a perda da audição na infância –, algo que não só dificultava seu desenvolvimento intelectual como prejudicou seu convívio social. Apesar de sonhar com lugares distantes e grandes viagens espaciais, Tsiolkovsky passou a maior parte da vida em seu casebre nas cercanias de Kaluga, onde era visto como uma figura estranha, bizarra e reclusa.

Nenhuma das dificuldades – fossem elas financeiras, sociais, familiares ou físicas – conseguiu se interpor entre Tsiolkovsky e seu sonho, hoje em grande parte uma realidade. Essa é uma eloquente demonstração de como nunca devemos abdicar de nossas ambições e de como elas podem não só nos trazer profunda satisfação pessoal como podem acabar ajudando a transformar o mundo.

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