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Esqueça as esponjas: o primeiro animal foi a carambola-do-mar

Análise genética inovadora questiona relações evolutivas estabelecidas entre espécies – e tira das esponjas o posto de primeiro animal da história

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
11 abr 2017, 20h03

Há muito, muito tempo – não em uma galáxia distante, mas no nosso planeta – não havia seres vivos com mais de uma célula. Toda a agitação era invisível, ocorria na escala microscópica. Até o dia em que um protozoário visionário percebeu que trabalhar em grupo era uma ótima forma de dominar o mundo.

Surgia o primeiro representante do reino animal – ou, em outras palavras, o primeiro ser vivo formado por mais de uma célula. A ciência (e os livros didáticos) são quase unânimes em afirmar que esse pioneiro foi um tipo primitivo de esponja marinha, e o registro fóssil não discorda: há indícios da presença de antepassados de Bob Esponja nos oceanos há no mínimo 580 milhões de anos.

Agora, uma pesquisa da Universidade Vanderbilt, nos EUA, quer virar a Fenda do Biquíni de ponta-cabeça. O título de primeiro animal da história iria, na verdade, às… geléias. Sim, o bichinho da foto acima, que só tem esse nome gelatinoso em inglês: em português são chamadas carambolas-do-mar (filo Ctenophora). Saber quem veio primeiro não é mero capricho – ter a carambola na base do reino animal muda a maneira como cientistas entendem o desenvolvimento de estruturas essenciais para todos os animais, como o cérebro e o sistema digestório.

A “culpa” dessa possível reclassificação é dos avanços recentes na tecnologia de análise de material genético, que estão dando a biólogos novos critérios para organizar a árvore da vida.

O problema é o seguinte: por mais de um século, a “hierarquia” do reino animal foi definida com base na complexidade relativa de cada espécie. Assim, as despretensiosas esponjas – que não fazem muita coisa além de filtrar água e curtir o conforto de uma pedra no fundo do mar – foram consideradas o primeiro passo de uma evolução que levaria aos mamíferos, passando por águas-vivas, minhocas, tubarões, tartarugas e todo o resto.

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Nas últimas décadas, a filogenética (estudo genético da relação evolutiva entre grupos de organismos) permitiu que biólogos olhassem além dessas características superficiais e macroscópicas – e “lessem” direto no DNA dos animais quem deu origem a quem, independente do grau de parentesco aparente entre cada espécie.  

Resultado? Vira e mexe, a classificação tradicional entra em choque com as novas descobertas. E pesquisadores passam anos acumulando evidências genéticas para resolver essas divergências e encontrar provas cabais a favor de uma ou outra espécie que disputam uma determinada posição na história da evolução biológica.

“O método atual da filogenética é coletar grandes quantidades de informação genética, analisar essa informação, traçar uma rede de relações e argumentar que determinada conclusão está correta por causa da precisão inédita da análise”, explica Antonis Rokas, co-autor do estudo. “Isso funcionou muito bem em 95% dos casos, mas levou a diferenças aparentemente irreconciliáveis nos 5% restantes.”

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A disputa entre esponjas e geléias é um desses casos polêmicos. Mas Rokas e seus colegas querem devolver a paz ao mundo conturbado da biologia evolutiva, e no artigo científico publicado na semana passada se dedicaram a resolver não só esse como 16 outros dilemas parecidos. Para lidar com essas disputas acirradas, foi desenvolvido um método de análise que pode, segundo eles, levar a filogenética a um novo patamar. “Nessas análises, nós só usamos genes que são compartilhados por todos os organismos”, contou Rokas. “O truque é examinar as sequências de genes de diferentes organismos para ver quem eles ‘identificam’ como seus parentes mais próximos.”

Só para dar um exemplo, em outro round interessante arbitrado pelos pesquisadores de Vanderbilt, ficou provado que os jacarés são mais próximos dos pássaros que das tartarugas – que parece relembrar outra descoberta evolutiva mais antiga: de que as galinhas, e não os répteis, são os “dinossauros do presente”.

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