Introdução de bactéria no Aedes reduz em 77% transmissão de dengue na Indonésia
Nessa abordagem experimental, que já foi testada no Brasil, um microorganismo retarda a multiplicação do vírus no mosquito. Os resultados obtidos no sudeste asiático são o maior sucesso até hoje.
Cientistas que estudam uma abordagem promissora contra a propagação do vírus da dengue acabam de obter resultados animadores. No teste mais completo realizado até agora, a transmissão da doença foi reduzida em 77% em uma cidade da Indonésia após a introdução de mosquitos infectados com uma bactéria do gênero Wolbachia.
A dengue chega a nós a bordo de fêmeas do mosquito Aedes aegypti e infecta de 100 a 400 milhões de pessoas a cada ano, principalmente em regiões tropicais e subtropicais do planeta (como o Brasil). A doença não tem um tratamento específico, e a vacina é recomendada apenas para quem já foi infectado antes.
Uma iniciativa que tenta combater o problema é o projeto australiano World Mosquito Program (WMP). Eles desenvolveram uma abordagem experimental para combater a propagação da dengue, que consiste na introdução da bactéria Wolbachia em mosquitos Aedes aegypti.
A bactéria retarda a reprodução do vírus da dengue no organismo do mosquito. Melhor ainda é que ela é passada de geração em geração: uma vez introduzida na população, todos os Aedes nascerão com ela. Assim, é menos provável que o inseto se transforme em um vetor da doença e a transmita para nós.
Os cientistas infectam os mosquitos e os liberam em locais de teste. Eles já realizaram esse experimento em vários lugares – como aqui no Brasil e em Queensland, na Austrália (onde a dengue foi basicamente erradicada). Mas o sucesso na Indonésia foi inédito.
“Este resultado demonstra como a Wolbachia pode ser uma descoberta empolgante – uma nova classe de produto segura, durável e eficaz para o controle da dengue é exatamente o que a comunidade global precisa”, disse o pesquisador Cameron Simmons, diretor do Centro da Oceania no WMP.
A cidade de Yogyakarta, de 26 km2, foi dividida em 24 regiões pelos pesquisadores. Entre março e dezembro de 2017, eles introduziram mosquitos infectados com a Wolbachia em 12 desses grupos – chamados de grupos de intervenção. Os outros 12 grupos não receberam os Aedes aegypti infectados e se tornaram grupos de controle – que servem para fins de comparação com os grupos de intervenção.
A Indonésia registra cerca de 8 milhões de casos de dengue por ano – por lá, a doença é endêmica. Em todos os grupos de estudo, as medidas locais de controle de mosquitos não foram interrompidas durante a pesquisa.
Ao longo de 27 meses após a liberação dos mosquitos infectados, os pesquisadores recrutaram pessoas com idades entre 3 e 45 anos que apareceram com sintomas suspeitos nas unidades básicas de saúde da cidade. Então, eles testavam essas pessoas para identificar se estavam ou não com a doença. Foram 8.144 pessoas testadas no total.
Os resultados mostraram que apenas 67 pessoas nos grupos de intervenção foram diagnosticadas com dengue – 2,3% da população desses locais. Já nos grupos de controle, 318 casos da doença foram identificados – o que representa 9,4% da população.
No geral, a introdução dos Aedes aegypti infectados com a Wolbachia reduziu a propagação da dengue em 77,1% e não apresentou resultados muito diferentes entre os quatro subtipos de dengue existentes.
Os pesquisadores também notaram que, entre os grupos de intervenção, 86% menos pessoas acabaram no hospital por complicações da doença. Foram registradas 13 hospitalizações nessas áreas, enquanto os grupos de controle tiveram um total de 102.
“Este é um grande sucesso para o povo de Yogyakarta”, afirma Adi Utarini, pesquisadora do WMP. “O sucesso do teste nos permite expandir nosso trabalho por toda a cidade de Yogyakarta e pelas áreas urbanas vizinhas. Acreditamos que há um futuro possível em que os residentes das cidades indonésias possam viver livres da dengue.”