Tudo que comemos causa câncer. Tudo cura câncer também.
Não é piada, é sério. Um estudo feito por pesquisadores de Harvard e Stanford mostram por que é preciso tomar muito cuidado quando se lê notícias sobre saúde fora de contexto.
Café causa câncer. Café cura câncer. Causa, cura, causa, cura, caura, cusa.
Eu sei. Está confuso acompanhar as pesquisas sobre a relação entre os alimentos e a saúde. A cada dia bomba no Facebook uma manchete diferente, muitas vezes em direta contradição com a manchete anterior (e sim, algumas dessas manchetes são aqui da SUPER). E, enquanto isso, ovo, bacon, manteiga, soja, queijo, sal, óleo vão revezando-se nos papeis de herói e vilão, para nossa confusão.
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Dois médicos americanos, das universidades de Harvard e Stanford, recentemente ajudaram a jogar luz sobre o problema, com um estudo bem bolado. Para começar, eles pegaram um livro de culinária, selecionaram aleatoriamente algumas receitas e listaram 50 ingredientes lá encontrados. Aí fizeram uma extensa pesquisa na literatura médica para encontrar todos os estudos relacionando o consumo de cada uma dessas 50 comidas com a incidência de câncer. O resultado pode ser sintetizado assim:
Para entender o gráfico acima, imagine que cada um dos pontinhos é uma pesquisa que relaciona a ingestão de um alimento ao risco de ter câncer. Essas pesquisas são feitas assim: os cientistas dividem um grupo de pessoas em dois. Um deles ingere o tal alimento, o outro não, e então os dois grupos são acompanhados por um longo período, de anos, para que os cientistas possam contar o número de pessoas que teve câncer e o número que não teve. Se os dois grupos tiverem incidência idêntica da doença, o pontinho aparece bem em cima dessa linha preta no meio do gráfico. Se o alimento estiver relacionado a um índice menor de câncer, o pontinho fica à esquerda da linha – e à direita se estiver relacionado a um índice maior.
O que os cientistas conseguiram mostrar é que pontinhos individuais no gráfico não significam praticamente nada. A imensa maioria das pesquisas mostram que comer cebola reduz a incidência de câncer – e, no entanto, é possível encontrar uma pesquisa que mostra que ela aumenta muito esse risco. Se pegarmos pesquisas isoladas, é possível afirmar que praticamente todas as comidas causam câncer – e também que todas as comidas curam câncer (a tabela mostra apenas os alimentos sobre os quais se encontrou dez pesquisas ou mais).
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O objetivo do estudo não é mostrar que pesquisas científicas são inúteis, claro. Elas não são. Ao longo dos anos, vários pontinhos individuais vão se acumulando, e padrões vão aparecendo. Por exemplo, olhando o gráfico acima fica fácil constatar que azeite de oliva, cenoura e tomate pelo jeito protegem mesmo contra o câncer – enquanto que bacon, açúcar e pão parecem ser nocivos. O problema é que cada bolinha do gráfico é anunciada pela mídia como se fosse a verdade inteira, sem contextualização nem análise crítica. E isso não é culpa só dos jornalistas. Os cientistas também têm uma tendência de fazer afirmações bombásticas – porque sabem que dessa maneira seu trabalho repercute mais.
Aqui na SUPER, sabemos que o público adora sair clicando na última novidade, tipo manteiga não causa mais infarto, ovo não é mais ruim para o colesterol, ou água emagrece – e certamente não resistimos à tentação de oferecer essas coisas. Tentamos ao menos incluir nos textos um pouquinho de contextualização, mostrando como cada pesquisa é feita e comparando os resultados com estudos anteriores. Mas quer um conselho? Não confie demais em ninguém, nem mesmo em nós. Procure ler o maior número possível de pesquisas e tente não se influenciar demais por dados tirados do contexto. Em ciência, nada é definitivo. E, por via das dúvidas, tente não exagerar com nada – vai saber o que vão descobrir amanhã sobre os seus hábitos de hoje…