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Alexandre Versignassi

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Blog do diretor de redação da SUPER e autor do livro "Crash - Uma Breve História da Economia", finalista do Prêmio Jabuti.

Vacinas X Covid: chegar é uma coisa, ultrapassar é outra

Não basta a chegada das vacinas. O mundo precisa vencer mais obstáculos para tirar o vírus de circulação. Veja na nossa carta ao leitor.   

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Atualizado em 18 jan 2021, 12h43 - Publicado em 11 jan 2021, 18h10

Complicado. O Reino Unido, que deu o pontapé inicial na vacinação, decidiu adiar a segunda dose. Todas as vacinas que você vê no noticiário requerem duas doses. A da Pfizer, primeira a ser adotada lá, exige um intervalo de até três semanas entre as injeções. Mas Boris Johnson resolveu aplicar a segunda só daqui a seis meses.

O governo britânico entendeu que não teria tempo de vacinar boa parte de sua população com duas doses – não há doses o bastante, ao menos para os primeiros meses de imunização. A nova variante do vírus, 70% mais contagiosa, poderia colapsar o sistema de saúde deles antes disso. Então, em vez de dar duas doses para menos gente, vão dar uma só para mais gente.

Bom, a dose dupla da vacina da Pfizer tem 95% de eficácia. A única, 52%. A Pfizer também diz que simplesmente não sabe se uma segunda dose após três meses pode ter algum efeito. Todas as pesquisas foram feitas usando o intervalo de três semanas. Ou seja: não dá para dizer que o Reino Unido tomou uma decisão racional.

Nos EUA, não se cogita adiar a segunda dose. Mas isso não significa que esteja tudo certinho por lá. O país foi o que melhor se preparou para um programa de vacinação em massa, encomendando 800 milhões de doses das vacinas mais adiantadas (o bastante para 400 milhões de pessoas, e a população dos EUA é de 330 milhões). Mas encomendar é uma coisa, receber é outra. E o ritmo de vacinação por lá está abaixo do esperado. O governo tinha prometido 20 milhões de vacinados até o final de 2020. Entregou 2,8 milhões, a um ritmo de 164 mil injeções por dia. Em janeiro, essa média subiu bem, para 350 mil/dia. Ainda falta chão, porém. Se dobrarem essa velocidade, a vacinação nos EUA só termina em abril de 2022.   

Enquanto lá fora faltam doses, aqui, você sabe, faltam seringas. Na licitação que fez no final de dezembro, o governo federal fechou a compra de meros 7,9 milhões de unidades, quando a ideia era adquirir 331 milhões. Bolsonaro alegou que estavam cobrando caro demais – numa amostra de que ignora a lei da oferta e da demanda, e o bom senso. E não haverá muito o que colocar nessas seringas tão cedo.

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A Fiocruz deve fabricar 210 milhões de doses da vacina Oxford/AstraZeneca. Mas essa quantidade só deve ser atingida no segundo semestre. E claro: o imunizante requer duas aplicações, então isso só cobre metade da população. Por isso mesmo, o Ministério da Saúde abriu uma trégua política e confirmou que a chinesa Coronavac estará no programa nacional de vacinação, com 100 milhões de doses.

Ainda assim, isso significa 150 milhões de pessoas, e há 210 milhões de brasileiros – como casos de reinfecção são raros, os 7 milhões de brasileiros que sabem que já pegaram Covid e estão bem hoje poderiam, em tese, ficar no fim da fila. Mesmo assim, há um caminho a ser percorrido. E sair dizendo que “se a vacina te transformar num jacaré, eu não tenho nada a ver com isso”, como fez, e faz, Jair Bolsonaro, não ajuda. Se a falta de doses é um problema, a falta de gente a fim de tomar consegue ser algo ainda pior para a saúde pública. Um em cada cinco brasileiros (20%) já diz que não pretende se vacinar (logo, não deve levar os filhos).

Se toda essa parcela se recusar de fato a tomar uma vacina, não vamos vencer a pandemia. Como a eficácia da vacina de Oxford é de 70%, e a da Coronavac, é de 50,4%, só com perto de 100% da população vacinada poderemos cogitar a imunidade de rebanho.

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O Instituto Butantã foi providencial ao estocar 6 milhões de doses da Coronavac, já que o imunizante pôde ser liberado imediatamente após a liberação da Anvisa, no dia 17 de janeiro. Horas após a liberação, porém, surgiu outro problema. O Instituto só tinha matéria prima para fabricar outras 4,8 milhões de doses. Tal matéria prima (chamada Ingrediente Farmacêutico Ativo no jargão técnico) vem da China. Com também faltam doses por lá, é possível que os novos carregamentos levam mais tempo que o esperado para chegar.

É isso. Seria ingênuo imaginar que o maior programa de vacinação da história da humanidade seria um caminho suave, rápido. Ainda há muito o que fazer  para que 2021 se torne mesmo o último ano da pandemia, e 2022 seja, de fato, o primeiro ano do resto das nossas vidas. O lado bom dessa história: há dez meses, quando tudo começou, havia pânico. Falava-se numa onda global de saques de alimentos, no fim da economia; muitos estavam certos de que o isolamento destruiria nossa sanidade mental.

Mas não. Seguimos de pé. Mais preocupados, mais sozinhos, mais saudosos – em muitos casos, de luto. Mas seguimos. E agora a gente sabe que não entrega os pontos no primeiro assalto. Bom 2021. E um feliz 2022.

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