Qual foi o primeiro animal com cauda?
Se você exige um típico rabo de vertebrado, a resposta está em um peixe que viveu há meio bilhão de anos. Uma definição mais ampla do acessório nos permite voltar mais no tempo.
Peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos formam o grupo dos vertebrados, que possuem todos coluna vertebral e crânio. O rabo é uma extensão da coluna, e aparece nos embriões de todos os vertebrados – inclusive dos que perdem o acessório ao longo da gestação, como os humanos (ficamos só com o cóccix).
O fóssil de vertebrado mais antigo conhecido é da Pikaia gracilens – um peixe com jeitão de enguia, cauda em forma de flecha e cabeça com duas antenas. A pikaia vem do Folhelho de Burgess, uma formação geológica no Canadá que guarda rastros de uma explosão na biodiversidade ocorrida há 508 milhões de anos, no período Cambriano. O leitor que busca uma resposta mais simples pode adotar a pikaia como o mais remoto rabo de vertebrado inequívoco conhecido.
Isso não significa que a pikaia seja uma ancestral direta dos seres humanos e demais vertebrados – a interpretação mais correta é que nossos ancestrais multicelulares cambrianos provavelmente eram animais marinhos parecidos com a pikaia. A evolução funciona como uma árvore que se ramifica, com espécies se dividindo em novas espécies nas pontas enquanto galhos mais antigos são extintos. Esqueça a ideia clichê de linha reta, em que um chimpanzé (ou qualquer outro animal) se torna humano em passos sucessivos.
Antes do Cambriano, no período Ediacarano – o primeiro no registro fóssil a exibir vida multicelular abundante –, acredita-se que a maioria dos animais não se movesse e coletasse nutrientes filtrando a água, de modo que seus corpos eram bem diferentes dos nossos e não exigiam estruturas de locomoção.
“Embora várias formas tenham surgido nesse intervalo, muitas são estranhas – têm formas de disco, rosquinha, gorro, etc. – e algumas lembram grupos que existem hoje, como cnidários, moluscos e artrópodes”, explica Fernanda Quaglio, paleontóloga da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “O que caracteriza a biota de Ediacara, de maneira geral, é que são formas geralmente filtradoras – e, portanto, péssimas candidatas para terem rabo.”
Evolução não é algo que ocorre do dia para noite, é claro. Se havia algo como a pikaia no cambriano, não se pode descartar que já existissem ancestrais rabudos no ediacarano. O problema é encontrar e interpretar corretamente esses fósseis.
“Temos dois conjuntos de fósseis que poderiam ser candidatos, mas com dúvidas”, diz Quaglio. “Um desses conjuntos consiste pequenas esferas de relevo irregular, que são associadas a embriões, com padrões que poderiam representar metazoários (ou seja, animais). Considerando que nem todos os animais têm rabo – pense em uma ascídia ou espoja –, não podemos ter certeza, mas nada impede de terem sido representantes de grupos com cauda.”
Se o leitor não se importar com uma definição mais ampla de rabo – que inclua, por exemplo, os flagelos das bactérias ou mesmo de uma célula móvel como os espermatozoides –, aí as origens dessa estrutura se perdem no tempo. Balançar uma coisa comprida para se mover é uma criação de bilhões de anos.
As algas do gênero Euglena, por exemplo, consistem em uma única célula eucariótica, bastante complexa, com um rabinho oscilante na ponta e uma região pigmentada vermelha logo acima desse flagelo responsável por detectar luz. Quando ela está no escuro, o olho primitivo dá o sinal para o flagelo balançar até um local iluminado, onde a alga fará fotossíntese.
A cor vermelha é oriunda de carotenoides, as mesmas moléculas que dão cor para uma cenoura ou abóbora.
Sim: ela fabrica a própria comida como uma planta. Mas se move como um animal para perseguir a luz. O mundo microscópico é cheio de truques alienígenas para nós.
Fonte: Pergunta de @sou.bilingue, via Instagram