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O Mr. Robot da vida real

Consultor e roteirista da série, Kor é o responsável por garantir que tudo o que você vê em Mr. Robot seja possível na vida real.

Por Felipe Germano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 23 out 2020, 11h02 - Publicado em 26 Maio 2017, 16h46

Se um dia você for preso em uma cadeia americana, e estiver planejando fugir, tem um jeito de fazer isso sem cavar túnel nem nada. Basta sair pela porta da frente. Mas, claro: você vai precisar de uma ajudinha de alguém de fora. Primeiro, alguém que use uma conexão bluetooth para hackear o computador de bordo de uma viatura que faça parte da frota do seu presídio. Se o hack der certo, uma linha de código pode ficar escondida na memória da máquina. Quando a viatura se aproximar da penitenciária, o computador de bordo vai se conectar automaticamente com a rede de Wi-Fi da penitenciária. Nisso, o código escondido consegue “pular” para dentro da central da prisão.

O código maroto, então, dá uma ordem para a central: abrir todas as celas e portões. Se a ação for em massa, dificilmente os guardas conseguirão segurar todo mundo. É só não dar bobeira que você estará de volta às ruas. Parece coisa de Hollywood… E é.

O processo todo passou na série Mr. Robot. Mas o hackeamento não é completamente fictício. Em tese, ele funcionaria em prisões americanas da vida real – com a diferença de que não é tão simples criar códigos que abrem portas de cela de segurança máxima. Mas vamos dar o desconto: a precisão técnica de Mr. Robot é um artigo raro no mundo do entretenimento. E o responsável por isso é o programador Kor Adana, que ocupa o cargo de roteirista e consultor tecnológico do programa; em outras palavras, ele recebe para bolar hacks inacreditáveis, completamente ilegais – e funcionais.

O trabalho de Kor é tão complexo quanto seus hacks. Ele precisa tornar críveis até os momentos mais irreais, quando o assunto é tecnologia e anarquismo. Isso porque a trama de Mr. Robot gira em torno de Eliot, um jovem e perturbado analista de segurança digital que se vê no meio de uma empreitada hacker com objetivo tão sinistro quanto complexo: apagar os servidores que mantêm os registros financeiros do mundo todo. Eliot quer fazer com que o planeta inteiro acabe com $ 0,00 na conta bancária, de modo a eliminar a desigualdade.

Claro que ele conta com artifícios de roteiro para tornar essa empreitada, impossível no mundo real, plausível no mundo virtual – na série, todos esses dados são armazenados por uma única empresa, facilitando um pouco o processo. Mas só um pouco. “Fazer isso com uma abordagem realista, que poderia de fato acontecer, é a minha luta diária”, conta Kor. “Todo tipo de ato destrutivo é conversado entre os roteiristas, mas há sempre uma noção de que, quando alguém aparece na sala com alguma ideia, eu que tenho que dizer `olha, você não sabe exatamente como fazer isso, esses são os passos necessários¿, ou simplesmente falar que seria impossível.”

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Vingança dos nerds

Tal preciosismo pode parecer exagero, já que algo bem além de 99% do público é incapaz de compreender programação avançada. Mas não. Mr. Robot tem como objetivo conquistar o público mais nerd possível. E isso já é uma revolução em si. “Você tem que ir contra anos de indústria que vêm construindo uma ideia errada. Ninguém nunca ligou, ninguém nunca se importou”, afirma.

Para atingir o nível de precisão que considera satisfatório, Kor testa os macetes com uma equipe própria de hackers, e foca em detalhes inéditos. “Cada linha do código que aparece nas telas da série é correta. Depois de escrevê-las, treinamos com os atores, para que eles teclem de maneira certa e sincronizada. Ninguém ali está apertando um botão que não é o certo”, conta.

“A gente só pode mostrar as telas com linhas por alguns segundos, por conta do tempo. E eu preciso ter certeza que tudo que eu mostrar são as coisas mais importantes e interessantes daquele hack em questão. Não dá para contar todos os passos, mas – pessoalmente -, eu adoraria.”

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Histórico

O Mr. Robot da vida real
(Kor Adana/Divulgação)

“Kor Adana” é um nome artístico. O nome dele, de origem turca, é Korhan Gurocak. E Korhan, praticamente, nasceu hacker. A coisa toda começou quando ele ainda era adolescente, na Detroit dos anos 1990. Kor descobriu como funcionava um orelhão: cada moeda inserida no aparelho resultava em um som que era transmitido para a operadora telefônica. A combinação correta dos sons, que equivalia ao custo da ligação, dava o sinal verde, e a linha era liberada. Ótimo. Kor, então, construiu um dispositivo que imitava o barulho das moedas, na frequência exata, enganando o telefone – o que lhe rendia chamadas infinitas, para qualquer lugar do mundo.

Kor não inventou isso – Steve Jobs também começou a carreira hackeando telefones para fazer chamadas de graça, junto com o amigo Steve Wozniak. Diferentemente da dupla de fundadores da Apple, Kor seguiu pelo caminho hacker, mas não exatamente no Lado Escuro da Força. Cursou segurança de redes na universidade e começou a trabalhar na Toyota fazendo testes de penetração em sistemas. Exatamente como o Eliot de Mr. Robot, seu trabalho era proteger grandes empresas.

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Depois de quase seis anos trabalhando com TI, ele resolveu explorar sua outra paixão: escrever. Kor saiu da Toyota em 2012 e começou a trabalhar como roteirista em produtoras até que, em 2014, caiu dentro da televisão pública americana USA Network como assistente de diretor executivo da série médica Rush. Não rolou, a série foi cancelada e, no fim do mesmo ano, o recolocaram em outra série do mesmo canal, o então embrionário Mr. Robot, também como assistente.

Foi aí que veio a sorte grande. Sam Esmail, o diretor, soube que Kor tinha um background com tecnologia, e concluiu que Kor deveria ser mais do que um mero assistente. O programador, então, foi promovido ao cargo que tem hoje: consultor de tecnologia e membro do time de roteiristas. E deu bem certo. A equipe da série já foi indicada para seis Emmys (levando dois deles) e a cinco Globos de Ouro (garantindo outros dois).

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Mr. Robot tornou-se uma série umbilicalmente ligada à comunidade hacker, com Kor Adana no papel de cordão umbilical. Muitas das técnicas mostradas nasceram em conferências – a própria cena da cadeia veio de um encontro anual de programadores, a DEF CON. Como contrapartida, Kor espera que a série ajude a mudar a imagem dos hackers. “Há um estigma muito grande, tentamos deixar claro que nem todos os hackers querem ver o mundo pegar fogo”, diz. E que nem todos os hackers são como o senso comum imagina. O elenco de Mr. Robot é especialmente plural, com hacker mulher, hacker muçulmano, hacker transexual. Kor assina embaixo: “Gostaria de inspirar mulheres a mexerem com tecnologia”.

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