Depois de quase dois anos em revisão, o avião marcado por duas tragédias num intervalo de poucos meses volta à ativa. Entenda o que causou os acidentes e o que mudou na segurança da aeronave.
Texto Leonardo Pujol Edição Alexandre Versignassi
Ilustração Denis Freitas Design Carlos Eduardo Hara
ra para ser o maior sucesso da história da aviação. O Boeing 737 MAX nasceu como a versão mais moderna do jato mais emblemático de todos os tempos – a linha 737 da Boeing, que já voa há mais de meio século. O MAX chegou 14% mais econômico e com um alcance 20% maior. Então vieram as duas tragédias. Uma em outubro de 2018, na Indonésia. Outra em fevereiro de 2019, na Etiópia. Duas quedas logo após a decolagem, com 346 vítimas fatais. A aeronave terminou “aterrada”, ou seja, perdeu sua permissão para voar, até que a Boeing encontrasse uma solução para tornar o avião seguro.
A previsão inicial era a de que a suspensão do MAX durasse apenas três meses. Até lá, o que houvesse para ser resolvido seria resolvido. Mas não. O processo levou um ano e dez meses. O MAX retornaria, com reformas, só no final de 2020, após 4 mil horas de análises e 1.350 voos de teste.
Na véspera do retorno da aeronave, numa manhã nublada de dezembro, a Super embarcou em um “voo técnico” do 737 MAX, sem passageiros comerciais, realizado pela Gol como parte da última etapa de testes antes de a aeronave voltar ao batente.
Também conversamos com pilotos de diferentes companhias, especialistas do setor e executivos da Boeing e da Gol, única empresa a operar o jato no Brasil. Tudo para entender a extensão das mudanças – e como elas tornam o MAX seguro para voar novamente.
O voo saiu de Congonhas, em São Paulo, logo após as 11h. Destino: aeroporto de Confins (MG), sede da Aerotech, unidade de manutenção de aeronaves da Gol – onde os seus sete MAX foram preservados. Minha poltrona era a 18A. Pela janela, notei o céu carregado. Será que sofreríamos alguma turbulência na subida? A decolagem causava certa ansiedade nos convidados. Mesmo com o mau tempo, porém, o avião decolou suavemente, sem qualquer adversidade. Nada que surpreendesse, claro. Dias antes, Paulo Kakinoff, presidente da Gol, e outros executivos da empresa haviam feito o mesmo trajeto com suas famílias.
A viagem até Confins durou cerca de uma hora. Uma leve turbulência foi sentida na aproximação ao aeroporto, nada anormal para a quantidade de nuvens na cidade mineira. A aterrissagem foi bem-sucedida e o desembarque ocorreu praticamente dentro do hangar da Gol.
Lá estavam os outros 737 MAX. É curioso notar que aquela aeronave era a terceira geração do velho 737 – um cinquentão de fuselagem estreita, lançado em 1967 com capacidade para 124 assentos e autonomia de quase 3,2 mil quilômetros. Com o passar do tempo, firmou-se como um dos aviões mais seguros da história. Por isso mesmo, 30 anos depois, em 1997, a Boeing lançou uma versão modernizada da aeronave. Era levemente alongada e com motores mais potentes. A autonomia aumentara para 5,4 mil quilômetros e a capacidade instalada do 737 NG (Next Generation) era de 189 assentos. Tornou-se um best-seller no mercado. No total, foram produzidas mais de 10 mil unidades de 737 – incluindo o clássico e o NG.
O MAX foi lançado em 2016. Tratava-se de uma resposta ao A320neo, remotorizado da Airbus que disputa a mesma fatia de mercado do 737. O novo Boeing nasceu com capacidade para até 210 lugares e autonomia de 6,5 mil quilômetros, o que permite voos sem escala do Recife a Portugal (6 mil km), por exemplo – um feito para um avião pequeno e econômico se comparado aos mastodontes de corredor duplo.
Isso mais a economia de combustível. Num voo entre Manaus e Miami (4 mil km), um 737 NG com 186 passageiros queima 19,7 mil litros de querosene. O MAX, 16,9 mil. Esses 2,8 mil litros a menos de combustível significam uma economia em torno de R$ 10 mil por voo. Multiplique isso por cinco voos semanais de ida e volta, e o que temos é uma economia de R$ 2,6 milhões por ano. Por essas, o MAX se tornou o avião mais encomendado da história: a Boeing recebeu 5 mil pedidos pelo avião – o equivalente a metade de tudo o que a linha 737 tinha vendido em mais de 50 anos.
O maior responsável pela economia de querosene foi um novo motor, o LEAP, desenvolvido pela GE e que também equipa o A320neo. A questão: foi justamente por causa dele que surgiram os problemas do MAX.