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A Copa de 1958 não existiu: o falso documentário sobre o título do Brasil

Criado para expor a manipulação histórica, Konspiration 58 virou exemplo do poder da desinformação – e da facilidade com que acreditamos numa boa mentira.

Por Manuela Mourão
2 nov 2025, 08h00

Em 2002, a Suécia parou diante de um documentário que prometia reescrever a história do futebol mundial. Konspiration 58, transmitido pela emissora pública Sveriges Television, afirmava que a Copa do Mundo de 1958 – a do primeiro título do Brasil, que consagrou um jovem Pelé como herói nacional  – nunca havia acontecido. 

Segundo o filme, o torneio não teria passado de uma produção cinematográfica da CIA, encenada em Los Angeles, com a cumplicidade da FIFA e do governo sueco. Tudo parece legítimo: a produção é lotada de entrevistas, provas e imagens de arquivo. 

Ex-jogadores suecos, como Agne Simonsson e Kurre Hamrin, prestavam depoimentos ambíguos. E o historiador Bror Jacques de Wærn, apresentado como ex-funcionário da Agência Nacional Sueca, aparecia emoldurado por pilhas de documentos e mapas solares, afirmando que “as sombras dos jogadores no campo” não coincidiam com a latitude sueca.

As “evidências” eram meticulosas: ângulos de luz impossíveis, que faziam as sombras dos jogadores no chão dos gramados inacreditáveis, edifícios ao fundo dos estádios que não existiam na Suécia – mas sim em Los Angeles – chuteiras com design anacrônico, e uma tese final irresistível: a Suécia, carente de recursos em plena Guerra Fria, teria aceitado o plano americano em troca de investimentos econômicos.

O público acreditou. Só nos créditos finais a verdade veio à tona: Konspiration 58 era uma mockumentary, ou seja, um documentário falso, construído com os códigos do jornalismo investigativo para expor a fragilidade da percepção humana e o poder da desinformação.

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Mockumentary (do inglês mock – “zombar”, e documentary – “documentário”) é um gênero audiovisual que imita os formatos e convenções de produções audiovisuais jornalísticas para contar uma história fictícia. Um exemplo é a série The Office, comédia que popularizou o estilo. Em obras mais “sérias”, como Konspiration 58, o mockumentary serve como crítica à forma como acreditamos e reproduzimos o que parece real sem checar a veracidade.

O diretor Johan Löfstedt idealizou o projeto com uma motivação que ia muito além do futebol. Sua intenção era revelar os mecanismos do revisionismo histórico: um novo olhar sobre eventos do passado com uma nova interpretação ou novas evidências. 

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A História não é escrita em pedra, claro. Há sempre o esforço para rever conceitos à luz de novas descobertas. O revisionismo não é de todo ruim: nos ajudou, por exemplo, a entender que Monteiro Lobato era racista. Mas há muita gente que pratica isso da maneira errada.

Löfstedt viu isso acontecer com o movimento negacionista do Holocausto, e queria ilustrar como teorias conspiratórias se sustentam, muitas vezes, apenas na aparência de rigor analítico. Se parece jornalismo, tem entrevistas de jornalismo e pesquisas investigativas jornalísticas, como não é jornalismo?

Bom, acontece que o filme era uma armadilha intelectual: oferecia ao espectador a ilusão de lógica, dados e ceticismo – os mesmos instrumentos usados por conspiracionistas para distorcer a realidade. A sacada de mestre do diretor e da equipe que participou do projeto Konspiration 58 foi unir falsas apurações para convencer o espectador.  

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“Não acredite em tudo o que vê na tela”, dizia a última frase antes dos créditos. Mas o aviso veio tarde demais. Assim como nas redes sociais de hoje, a mentira já havia se espalhado antes da checagem.

Mais de vinte anos depois, o impacto de Konspiration 58 ainda ecoa. O filme virou material didático nas escolas suecas, exemplo de como a manipulação audiovisual pode parecer verossímil mesmo quando é completamente inventada. Professores o utilizam para ensinar pensamento crítico, checagem de fatos e leitura de fontes – um antídoto contra as fake news.

“É uma loucura assistir a essa filmagem real sob o contexto de que é falsa e sentir o cérebro deslegitimar o que se vê, mesmo depois de revelada a farsa”, diz Joey Engelman, um produtor de conteúdo que faz a curadoria de vários outros mockumentaries para seu perfil de Instagram.

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Mas há quem ainda acredite, ou melhor, desacredite da existência da primeira Copa que veio para o Brasil. Um pequeno grupo de adeptos mantém viva a teoria de que o Mundial de 1958 foi uma farsa, e usam o filme como base para outras conspirações sobre esportes, política e mídia.

Ficou curioso? Dá para assistir ao filme clicando aqui

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