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A trágica história do inventor do chantili

Vatel se matou por falta de peixe para servir o rei da França

Por Álvaro Oppermann
Atualizado em 12 jun 2018, 12h45 - Publicado em 31 dez 2004, 22h00

Era a décima terceira noite que François Vatel não dormia. Às 4 da manhã, levantou-se depois de duas horas insone no colchão. Foi checar se a encomenda de peixe para o banquete em homenagem ao rei Luís XIV, da França, já havia chegado. Na cozinha do castelo, um peixeiro o esperava com apenas duas cestas cheias. Era pouco. Vatel encomendara frutos do mar de todos os portos da França para a ocasião. “Isso é tudo?!”, desesperou-se. “Sim, senhor”, respondeu o peixeiro. “Não suportarei mais essa desgraça”, exclamou. Voltou para o quarto, trancou a fechadura e se matou com um punhal. Era 23 de abril de 1671, um sábado.

A tragédia do mestre de cozinha que morreu por falta de peixe é um dos episódios mais famosos da gastronomia. Rendeu até filme (Vatel – Um Banquete para o Rei, em que Gérard Depardieu interpreta uma versão romanceada do cozinheiro). Nascido em 1631, de família humilde, ainda menino Vatel virou aprendiz de confeiteiro. Chegou à corte aos 22 anos, admitido como auxiliar do cozinheiro de Nicolas Fouquet, o ministro de finanças.

Talentoso, ativo, organizado e extremamente ambicioso, Vatel em pouco tempo puxou o tapete do chefe e tomou seu lugar. Ele tinha um único objetivo: provar a Luís XIV que era melhor que o mestre da cozinha real. Numa das primeiras tentativas, em 1661, Vatel criou um creme batido doce e perfumado para impressionar a corte em um banquete. Infelizmente, o rei nem notou o quitute. O banquete também parece não ter trazido sorte a Fouquet. Logo depois, ele foi preso sob a acusação de conspirar contra o governo. Vatel esboçou uma revolta, mas foi solenemente ignorado pelos guardas. Antes que a ira real recaísse sobre ele também, se exilou na Inglaterra. Voltou para a França dois anos depois e foi trabalhar para o príncipe de Condé, no castelo de Chantilly. Lá, sim, seu creme doce caiu no gosto de todos. Satisfeito, Vatel batizou a iguaria com o nome do lugar.

As coisas correram bem para Vatel até o fatídico ano de 1671. Condé convidou o rei Luís XIV para um fim de semana de caçadas no castelo. O cozinheiro teve duas semanas para preparar a recepção. Estressado, passou 12 dias sem dormir. No dia da chegada do rei, apareceram mais convidados que o esperado. Vatel então notou que o faisão assado não era suficiente. “Minha honra está perdida”, comentou. O príncipe de Condé tentou consolá-lo: “Vatel, nunca houve um jantar magnífico como o de hoje”. Mas não adiantou. O cozinheiro estava cada vez mais preocupado com o banquete de sábado, o maior da sua carreira: filé de linguado, anchovas, melão com presunto de Parma, lagosta com molho de camarão, pernil de carneiro, pato ao molho de vinho Madeira e, de sobremesa, bombas de morango.

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Os gemidos de Vatel ao se apunhalar acordaram o castelo. Uma hora depois da tragédia, diversos pescadores começaram a chegar com suas cargas: houvera um atraso nos portos. À noite, o banquete foi um sucesso. Em respeito a Vatel, não serviram o linguado. Finalmente, o rei Luís XIV se rendeu aos dons do cozinheiro. Mas era tarde demais.

Para saber mais

Cozinha Bruta: o guia da gastronomia sem frescura
Marcos Nogueira, Superinteressante, 2017

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