Injeção semestral para prevenção do HIV tem 100% de eficácia em testes clínicos
O lenacapavir, que está na terceira fase dos testes clínicos, tem resultados melhores do que as opções atuais de PrEP – e podem reduzir o estigma de quem faz prevenção da AIDS.
Os medicamentos para Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) impedem o contágio pelo vírus HIV. No Brasil, o SUS distribui a PrEP em formato de comprimidos que devem ser tomados diariamente por pessoas que correm maior risco de serem expostas ao vírus causador da AIDS.
Os métodos de PrEP atuais são seguros e confiáveis – e são usados por mais de 83 mil pessoas só no Brasil. No mundo, são 1,6 milhão de pessoas, mas muitas relatam dificuldades na ingestão diária do comprimido, ou enfrentam discriminação para acessá-los ou armazená-los.
Agora, a farmacêutica Gilead testa o lenacapavir, uma alternativa injetável e semestral que se mostrou mais eficaz do que a combinação que é atualmente utilizada como PrEP, de tenofovir e entricitabina. Os testes estão na fase 3 – ou seja, a substância já foi testada in vitro e em animais antes.
Os testes em humanos serão feitos em quatro grandes etapas, e apenas a primeira já teve seus resultados divulgados. Nela, os cientistas contaram com 5.338 mulheres cisgênero de 16 a 25 anos na África do Sul e Uganda. No leste e no sul da África, as mulheres jovens são a população que sofre o maior impacto das novas infecções por HIV, e também enfrentam dificuldades sociais e estruturais para manter o regime diário de PrEP. O lenacapavir, por outro lado, é aplicado apenas duas vezes ao ano.
A injeção semestral de lenacapavir teve 100% de eficácia em impedir a infecção por HIV: entre as 2.134 mulheres que receberam o fármaco, nenhuma foi infectada pelo HIV. Também não foram identificados efeitos colaterais importantes. Em contraste, 55 das 3.204 mulheres que receberam formas alternativas de PrEP contraíram o vírus.
Os resultados foram tão otimistas que o conselho de monitoramento de segurança dos testes clínicos recomendou o fim da fase “cega” do estudo, em que as participantes não sabiam o que estavam tomando. Isso porque é antiético que os pesquisadores submetam as voluntárias a condições em que elas sabem que estão em desvantagem. Com o fim dos testes cegos, elas passaram a escolher qual medicação gostariam de tomar.
Atualmente, a segunda fase dos testes acontece na Argentina, Brasil, México, Peru, África do Sul, Tailândia e Estados Unidos. Dessa vez, o público é comporto por homens que fazem sexo com homens, homens trans, mulheres trans, e indivíduos de gênero não binário que têm relações sexuais com homens. É importante realizar testes com grupos diferentes porque podem ser observadas diferenças na eficácia do medicamento. Além disso, a modalidade de sexo (vaginal ou anal) também interfere nas formas de infecção.
Caso os resultados sejam positivos, a farmacêutica planeja lançar a injeção de lenacapavir como Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) nos Estados Unidos até o final de 2025. O laboratório afirma que oferecerá licenças a empresas que fabricam medicamentos genéricos, como forma de ampliar o acesso e de reduzir os preços.
“O lenacapavir para PrEP, se aprovado, pode oferecer uma nova opção essencial para a prevenção do HIV”, diz Linda-Gail Bekker, principal médica-pesquisadora da parte sul-africana do estudo, e ex-presidente da Sociedade Internacional de AIDS. “Embora saibamos que as opções tradicionais de prevenção do HIV são altamente eficazes, se tomadas como o prescrito, o lenacapavir para PrEP pode ajudar a solucionar o estigma e a discriminação que alguns podem enfrentar ao tomar ou armazenar os comprimidos de PrEP, assim como potencialmente ajudar a aumentar a adesão a esse tipo de tratamento”, acrescenta.
O lenacapavir já é registrado em outros países para tratamento da infecção pelo HIV-1 multirresistente, mas ainda não foi aprovado por nenhuma agência reguladora para a prevenção da infecção. A substância é um inibidor de longa duração da função do capsídeo do HIV-1, e impede a replicação do HIV a partir de múltiplos mecanismos de ação, afetando as principais etapas necessárias para o ciclo de vida do vírus.