Cientistas encontram o melhor lugar do planeta para observar as estrelas
A vista mais linda do cosmos é o topo de um domo de 4 km de altitude no centro da Antártida, onde as temperaturas batem 90 ºC negativos. Partiu?
Achar um céu limpo e escapar das luzes da cidade é regra para quem procura observar as estrelas. Quanto menos luminosidade emana da superfície da Terra, mais fácil é perceber as luzes dos outros corpos celestes. Agora, cientistas identificaram um local onde a visibilidade do céu é superior até à do Atacama (o deserto chileno é uma região tradicional para construção de telescópios graças à transparência incomum da atmosfera).
Infelizmente, você não pode pegar o carro e dar uma passadinha lá no final de semana. O Domo (ou Cúpula) A é o ponto mais alto do Planalto Antártico. Ele fica a mais de 4 km acima do nível do mar, altitude em que a temperatura pode atingir 90 ºC negativos (acredita-se que o Domo A seja o ponto mais gelado do globo). Para completar o isolamento, o local fica praticamente no centro do continente gelado, a 1,2 mil km do litoral mais próximo e 4,2 mil km da estação de pesquisa brasileira na Antártida.
Pesquisadores da Austrália, China e Canadá posicionaram um telescópio no Domo A para estudar a visibilidade e condições climáticas do local. A pesquisa foi publicada no periódico Nature. O resultado não é animador para amantes da observação de estrelas, mas é extremamente importante para a astronomia. Um telescópio posicionado nesse local pode fornecer imagens mais nítidas e de objetos mais distantes do que qualquer outro observatório do planeta.
Justamente por ser de difícil acesso, o local apresentou um conjunto de características perfeitas para a observação astronômica. “A combinação de alta altitude, baixa temperatura, longos períodos de escuridão e uma atmosfera excepcionalmente estável faz do Domo A um lugar atraente para a astronomia”, diz o pesquisador Paul Hickson, da Universidade da Colúmbia Britânica, em Vancouver.
Um dos principais desafios da astronomia é minimizar a influência da turbulência da atmosfera terrestre nas observações. A umidade, os gases, as partículas de poluição e o calor terrestre fazem com que a luz das estrelas sofra distorções severas ao atravessar a camada de gás que envolve o planeta.
Os pesquisadores precisam levar em conta essa distorção da luz para fazer os cálculos. Isso é feito calculando a diferença entre o tamanho real e aparente de uma fonte de luz. Ela pode ser medida em arco-segundos, uma grandeza para tratar de ângulos muito pequenos. Um arco-segundo é 3.600 vezes menor que um grau. Por isso, sempre é bom posicionar os telescópios em locais onde a distorção seja menor – ou seja, menos arco-segundos. Assim, é mais fácil saber se um ponto de luz está vindo de apenas uma ou diversas fontes.
O deserto do Atacama, onde diversos telescópios estão localizados, apresenta uma distorção de 0,66 arco-segundos, o que é baixo em comparação a outros lugares do planeta. Pontos remotos da Antártida também abrigam observatórios e estações de pesquisa astronômica. É o caso do Domo C, localizado a 1.188 km do Domo A. A distorção por lá varia entre 0,36 e 0,23 arco-segundos.
O Domo A, no entanto, se destacou mais ainda nas medições. O telescópio posicionado oito metros acima do solo registrou entre 0,31 e 0,13 arco-segundos no local. É a melhor medição já registrada para um local localizado na superfície terrestre.
A visão é ainda melhor do espaço, claro. É por isso que telescópicos como o Hubble, estão fora da Terra, em órbita. Apesar de fornecerem observações mais precisas, é difícil atualizá-los com a tecnologia mais recente. “A vantagem de fazer observações a partir da Terra é que você pode sempre adicionar a tecnologia mais atualizada, enquanto no espaço tudo é atrasado. As tecnologias no espaço são atrasadas em dez anos ou mais quando comparadas às da Terra”, diz o professor Michael Ashley, da Universidade de Nova Gales do Sul, em Sydney. Além disso, implantar um telescópios terrestres sai de dez a cem vezes mais barato do que um espacial.
O Domo A já apresentava potencial, mas os valores exatos do local só foram calculados agora. É provável que você não consiga ir até lá para tirar fotos com o celular – mas pode ser que em breve tenhamos boas imagens e descobertas astronômicas dos projetos instalados no local.