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Com ajuda da Nasa, crianças brasileiras vão mandar experimento para o espaço

Conversamos com os estudantes de 7º ano – os primeiros de fora da América do Norte que terão a oportunidade de fazer ciência na órbita da Terra, na Estação Espacial Internacional

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
1 dez 2017, 16h02

Um tripulante da Estação Espacial Internacional (ISS) – em órbita a 340 quilômetros de altitude – sofre um ferimento grave e precisa de uma transfusão de sangue. O próximo foguete de abastecimento só chegará em um mês. Quem poderá salvá-lo?

Acredite se quiser: Pietro Labate, um paulistano de 12 anos de idade. Com a ajuda de outros seis colegas, todos do 7º ano do colégio particular Dante Alighieri, o pesquisador mirim idealizou um experimento científico de dar inveja em muito marmanjo universitário: enviar uma bolsa de sangue humano ao espaço para descobrir se, graças à ausência de gravidade e à baixa temperatura, o líquido dura mais tempo armazenado.

Nós achamos que o sangue não vai fazer hemólise porque o espaço é muito frio, a temperatura é muito baixa”, me explicou o pré-adolescente por telefone. “Já fizeram um projeto parecido em uma escola americana, mas ele não visava a transfusão.”

O experimento de Labate têm grandes chances de sair do papel: ele concorre com as propostas de outros dois grupos de estudantes pela oportunidade de embarcar em um foguete da SpaceX de Elon Musk em 2018 – e ser levado para a ISS de verdade, onde astronautas da Nasa, a agência espacial norte-americana, darão uma mãozinha na execução.  

Quem também está no páreo é Gabriela Barone, só um pouquinho mais velha: 13. Com outros oito integrantes, sua ideia é descobrir se um novo composto químico – o tungstato de prata, criado por um pesquisador brasileiro em 2013 – é um bactericida eficiente em condições de baixa gravidade.

A intenção original era usá-lo para atacar a Clostridium tetani, microorganismo causador do tétano. Mas a Nasa não gostou muito da ideia de levar um frasco cheio de bactérias realmente perigosas para o espaço – se ele quebrasse, não seria legal. “Era risco de biossegurança nível 2″, me conta Barone, com toda a propriedade de alguém com pós-doutorado. “Precisamos trocar, e escolhemos a Bacillus subtilis. Ela não causa doenças, não põe a vida dos astronautas em risco.”

A ideia de enviar experimentos feitos na escola para o espaço nasceu nos Estados Unidos há 14 anos, pelas mãos de um órgão chamado Centro Nacional para Educação Científica para Terra e Espaço (NCESSE). Todos os anos, milhares de estudantes de ensino fundamental desenvolvem, com a ajuda de seu professores, testes que só possam ser realizados em situações de baixa gravidade. Cientistas profissionais selecionam as melhores ideias e fazem a ponte com a Nasa para enviá-las para os céus.

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Nos dois primeiros anos, isso foi feitos com ônibus espaciais. Com o encerramento progressivo do programa, os experimentos das edições seguintes foram levados diretamente para a ISS. Depois de quatro ou seis semanas lá em cima, as amostras testadas são devolvidas para os colégios, e analisadas pelos próprios estudantes.

Até 2016, o programa havia sido limitado aos Estados Unidos e ao Canadá. Em 2017, graças aos esforços do engenheiro espacial Lucas Fonseca, ele desembarcou no Brasil. É a primeira vez na história que crianças de fora da América do Norte têm essa oportunidade.

Fonseca é líder do projeto Garatéa, cujo principal objetivo é colocar uma sonda brasileira na órbita da Lua até 2020. Enquanto isso não acontece, o brasileiro – que participou dos esforços da Agência Espacial Europeia, a ESA, para levar a sonda Rosetta à Marte – foca em objetivos um pouco menos ambiciosos. Incluindo os educativos.

Quando Fonseca soube que o Brasil teria essa chance inédita de participar, o prazo já estava curto: o programa dura nove meses, ao longo dos quais os professores dos colégios envolvidos são capacitados para orientar a elaboração de experimentos em microgravidade e então passam o conhecimento para frente em reuniões semanais com os alunos. A solução foi apelar para cerca de 300 estudantes do Dante Alighieri, colégio particular conhecido por educar a elite paulistana.

“Nós fomos à prefeitura e ao governo estadual”, explicou o engenheiro. “Mas eles não conseguiriam fazer tudo a tempo. O Dante já está acostumado, participa de feiras no mundo inteiro. Além disso, os estudantes de lá já estavam familiarizados com experimentos feitos com balões em grandes altitudes.”

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No final, os organizadores e o colégio conseguiram garantir a inclusão de algumas dezenas de alunos da Escola Municipal Perimetral, em Paraisópolis, e da ONG Projeto Âncora, da cidade de Cotia, na Região Metropolitana de São Paulo. Eles assistiram a todas as aulas e participaram dos grupos de projeto, sem distinções. Para o próximo ano, a intenção é organizar o programa com calma e colocar até meio milhão de estudantes da rede pública de São Paulo no páreo. Para isso, será preciso capacitar os professores a orientar os trabalhos com cursos a distância.

Os 335 alunos formaram 72 grupos, que apresentaram pré-projetos em uma feira realizada em 21 de outubro deste ano. Na ocasião, eles foram avaliados por cientistas e professores universitários brasileiros. O top 3 foi anunciado em 16 de novembro. Quem bate o martelo, daqui para frente, é a Nasa. A decisão será anunciada em 14 de dezembro, e o projeto vencedor embarca para os EUA no ano que vem.

Quem disputa a oportunidade com Pietro e Gabriela é o grupo de Laura D’Amaro, 12, que não se satisfaz com questões bioquímicas: já está pensando na colonização de Marte. Seu teste envolve levar uma amostra de concreto para o espaço, para misturá-lo e descobrir se ele mantém as propriedades já conhecidas em terra firme. “Se algum dia se conseguirmos viver em outros planetas, a gente vai poder ter um jeito de começar a construir as coisas por lá”, me explicou a estudante.

Impressionado, perguntei a Fonseca se ele havia dado sugestões aos pequenos. Mas ele garante que não. “Eu não interferi. As ideias foram muito além do que a gente imaginava. É claro que alguns grupos pensaram em analisar o crescimento de feijões, mas outros criaram experimentos ótimos, muito criativos. Não existia projeto melhor ou pior, só projeto mais ou menos adequado à realidade da ISS.”

Se os projetos tem um mérito, porém, não é necessariamente serem bons o suficiente para ir para o espaço: é deixar nos seus criadores a vontade de fazer mais ciência no futuro.”Vou te ser sincero”, me confidenciou Pietro pelo telefone, ao final da conversa. “Antes disso eu achava que a ciência era uma coisa que eu nunca ia usar. Agora eu vejo como ela é boa.”

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