Como águas-vivas conseguem sobreviver à pressão extrema do mar profundo?
Descoberta explica por que esses animais se desintegram quando trazidos à superfície e pode até ajudar a entender melhor o Alzheimer
Em 2022, uma equipe da Universidade de Xangai conseguiu fazer a expedição oceânica mais profunda até aquele momento. O submarino dos pesquisadores desceu cerca de 11 quilômetros nas Fossas Marianas para coletar amostras de água e rochas, sedimentos e pequenos animais.
Ao coletar uma pequena água-viva-de-pente que vivia a mais de 10 quilômetros de profundidade, uma surpresa: “Quando capturamos as águas-vivas no veículo ocupado por humanos, tudo parecia lindo, mas quando voltamos ao navio, elas haviam desaparecido”, disse a microbiologista chinesa Weishu Zhao, que estava na expedição, em nota ao site Science.org.
Os animais nativos do fundo do mar não sabem viver sem ser sob extrema pressão: seus corpos literalmente se desintegram ao chegar na superfície. E não é como a pressão de um prazo atrasado ou um chefe pentelho: no ambiente abissal em que vivem, a pressão é equivalente à sensação de 15 elefantes africanos sentados na palma da sua mão. Agora, os cientistas estão mais perto de entender como a estrutura aparentemente frágil desses animais é adaptada para isso.
Por um tempo, pensou-se que talvez a razão fosse a mudança drástica de temperatura, mas os animais se desintegram mesmo quando são mantidos frios. Agora, os autores de um estudo publicado na revista Science, argumentam que o fenômeno depende da composição de suas membranas celulares, que são feitas em grande parte de lipídios – moléculas gordurosas. São essas moléculas que se deformam facilmente quando há uma mudança de pressão atmosférica.
Para estudar as diferentes membranas celulares, os cientistas coletaram águas-vivas de diferentes profundidades e temperaturas ao redor do mundo. Uma tarefa que o Bob Esponja já nos ensinou que é, no mínimo, desafiadora. “Capturar uma água-viva-de-pente com um veículo operado remotamente é como capturar uma borboleta com uma retroescavadeira”, diz Jacob Winnikoff, bioquímico de águas profundas da Universidade de Harvard e autor principal do estudo.
No laboratório, os pesquisadores criaram membranas feitas exclusivamente de lipídios extraídos das membranas desses animais e as observaram o efeito microscópico de diferentes pressões. Em comparação com suas primas de águas rasas, as águas vivas de águas profundas têm cinco vezes mais de um tipo de lipídio chamado PPE.
São esses os lipídios mais resistentes às pressões extremas – e os primeiros a se desfazerem sob baixas pressões. Somente as pressões extremas das profundezas do oceano forçam o PPE a assumir uma forma relativamente cilíndrica, permitindo que ele forme uma membrana estável na medida certa.
“As membranas celulares não podem ser muito firmes; elas precisam ser fluidas para que as proteínas e as coisas se movimentem entre elas”, diz outro coautor do estudo, Itay Budin, biofísico da Universidade da Califórnia em San Diego.
O estudo das membranas das águas-vivas pode revelar não apenas suas limitações, mas também as nossas. “Esses tipos de lipídios estão em nossas células sanguíneas e nervosas, mas tem havido muita especulação sobre o que exatamente eles estão fazendo lá”, diz Winnikoff.
Assim como as gelatinas, as membranas dos nossos neurônios precisam da quantidade certa de fluidez para funcionar. Alguns estudos associaram deficiências em lipídios semelhantes ao PPE a doenças como o mal de Alzheimer. No futuro, aprender mais sobre a estrutura e o comportamento desses lipídios pode nos ajudar a entender o motivo.
As águas-vivas-de-pente, apesar do nome, não são exatamente águas-viva como as que vêm em nossa mente, com um formato semiesférico e tentáculos separados. Enquanto essas, em geral, são do filo dos cnidários, as estudadas são ctenóforas. O nome vem do grego: kteis, pente e pherō, portador. Elas são os maiores animais a se moverem com o auxílio de cílios, uma estrutura semelhante à muitos minúsculos tentáculos e que lembra um pente.