Como viagens ao espaço afetam o cérebro de astronautas
Quando retornam de uma missão espacial, seus cérebros parecem mais idosos do que eram na ida. Mas o efeito não é definitivo
É impossível ir ao espaço e voltar da mesma maneira. O confinamento forçado, a vida em gravidade zero, a comida desidratada e a chance e assistir ao globo terrestre pela janela do módulo espacial, por exemplo, dificilmente vão ser apagados da memória tão cedo – e devem continuar dando um nó na cabeça dos astronautas mesmo anos depois. A mudança principal, no entanto, não é de perspectiva, mas biológica.
Diferentes estudos já mostraram que uma volta de foguete pode trazer problemas como danos aos ossos, à massa muscular e ao globo ocular, além de alterações no DNA causadas pelos altos níveis de radiação no espaço.
Os percalços em passar muito tempo em órbita se acusam, inclusive, logo após alguém colocar o pé fora do foguete. Nos primeiros instantes após voltar à Terra, astronautas podem enfrentar perda de equilíbrio e dificuldade de coordenação, por exemplo.
Uma nova pesquisa, publicada por cientistas da Universidade da Flórida na revista JAMA Network, pode ajudar a explicar por que esses efeitos imediatos acontecem. A explicação, claro, está relacionada à nossa central de comando.
O estudo analisou tomografias cerebrais de 15 astronautas (12 homens e 3 mulheres) da Nasa, que realizaram missões espaciais entre 2010 e 2015. Sete deles fizeram uma missão de tiro curto, que durou até 30 dias. Para os oito restantes, o tempo longe de casa foi bem maior: foram pelo menos 200 dias dedicados à Estação Espacial Internacional.
Segundo os cientistas, ao retornarem de missões espaciais, astronautas apresentaram mudanças na “substância branca” do cérebro em áreas como o controle de movimentos e o processamento de informações sensoriais. A parte cerebral conhecida como substância branca reúne pacotes de células nervosas que conectam diferentes áreas da massa cinzenta entre si e que mandam informações para a medula.
No estudo, a principal mudança foi o maior movimento de fluido intercranial, líquido que fica entre o cérebro e o crânio. Por causa dessa alteração, os cérebros dos participantes estavam, em geral, flutuando mais alto do que deveriam dentro do crânio depois da temporada vivida em microgravidade. Culpa do maior acúmulo de fluidos na parte de baixo do cérebro. Esse comportamento se mostrou mais comum no caso de astronautas que passaram períodos maiores no espaço ou aqueles envolvidos em mais de uma missão espacial.
Mudanças do tipo, segundo os cientistas, são um efeito que costuma aparecer com o processo natural envelhecimento. No espaço, porém, isso manifesta em maior velocidade. Ou seja: ir a uma missão espacial deixa seu cérebro com aparência ligeiramente mais idosa – pelo menos no que diz respeito ao movimento de fluidos. É bom notar que os efeitos passam dentro de algum tempo, é claro, e, depois disso, o balanço dos astronautas é o mesmo do que era quando deixaram o planeta (bem como a posição que seu cérebro ocupa dentro da cachola).
Em estudos futuros, os pesquisadores planejam analisar tomografias seis meses após as missões espaciais, como forma de entender se as mudanças persistem – e o quanto uma visitinha ao espaço pode cobrar da saúde. Entender esses impactos é essencial para nossos planos de percorrer distâncias cada vez maiores, como uma visitinha a Marte ou, quem sabe, uma temporada de turismo espacial.