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Os satélites da Nasa e as queimadas na Amazônia: entenda a confusão com os dados

Informações divulgadas pela agência espacial americana confirmam ou negam o maior número de focos de incêndio no norte do Brasil dos últimos dias? A resposta é: confirmam. E nós explicamos por quê.

Por Guilherme Eler
Atualizado em 12 mar 2024, 14h43 - Publicado em 22 ago 2019, 19h25

Desde o começo do ano até o momento em que você abriu este texto, o Brasil pegou fogo mais de 75 mil vezes. O número de queimadas deste ano é 84% superior ao registrado no país no mesmo período de 2018. E a maior parte dos incêndios, cerca de 52% do total (ou quase 40 mil focos), aconteceu em uma mesma região: a Amazônia. 

As informações listadas acima foram reunidas pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e podem ser acompanhados em tempo real no site do Programa Queimadas. Esse trabalho de coleta de dados sobre os focos de incêndio existe há 7 anos e é amparado por um conjunto de satélites, que flagram tudo de cima. Os responsáveis pelas imagens são, basicamente, três satélites operados pela Nasa. Eles se chamam Terra, Aqua e Suomi NPP (não contamos os satélites polares e os geoestacionários, que você pode conhecer melhor neste link).

Tanto o Terra (em órbita desde 1999) quanto o Aqua, que está no espaço desde 2002, levam à bordo o sensor MODIS, que analisa propriedades das nuvens, mudanças no uso das terras e, sobretudo, queimadas. A órbita do satélite Terra faz com que ele atravesse o céu do Brasil no sentido norte-sul, cruzando a linha do Equador pela manhã. Já o Aqua começa no sul e termina no norte, passando pelo Equador durante a tarde. Isso significa que as duas versões do MODIS produzem dois conjuntos de imagens sobre a superfície terrestre todos os dias, atualizando os dados com maior frequência.

Como destaca o Climatempo, foi o satélite Terra/MODIS, operado pela Nasa, que detectou uma grande quantidade de fumaça “vinda da Bolívia e de Rondônia” à caminho do sul do Brasil no dia 17 de agosto. A fumaça, antes concentrada do sul do país, teria ganhado Paraná e Mato Grosso do Sul e alcançado São Paulo no dia 19 de agosto – justamente quando a tarde ficou escura na capital paulistana. Você pode ver o caminho percorrido pela fumaça enquanto avançava pelo interior estado de São Paulo na imagem abaixo.

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Avanço da fumaça pelo estado de São Paulo, captado pelo satélite Terra, da Nasa (Terra/MODIS/Nasa/Reprodução)

O outro satélite da Nasa mobilizado na detecção de focos de incêndio, o Suomi NPP, usa o instrumento VIIRS para fazer suas imagens. A tecnologia está em órbita desde 2011 e, no último dia 20 de agosto, também registrou o deslocamento de fumaça captado pelo satélite Terra. É a imagem que você vê no início deste texto – ou no tweet abaixo.

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A imagem captada pelo Suomi NPP, que preserva as cores originais e mostra os efeitos da fumaça e das queimadas, tem foco em Amazonas, Mato Grosso e Rondônia – e apareceu em um artigo da Nasa desta quarta-feira (21), que você pode ler neste link. A nota da Nasa ressalta que “não é incomum observar queimadas no Brasil nessa época do ano, por conta de altas temperaturas e baixa umidade. O tempo dirá se o número de incêndios este ano será recorde ou ficará dentro do limite esperado”.

Como o texto da agência espacial americana ressalta, nem todos os incêndios (seja na Amazônia ou outro lugar) são causados pelo desmatamento. Por causa do calor e da falta de chuvas, focos espontâneos também podem despontar – sobretudo entre os meses de julho e agosto, quando o tempo é mais seco. Mas isso não justifica nada: atear fogo ainda é a principal maneira de se realizar a limpeza do terreno para a criação de pastos ou para o plantio da próxima safra.

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Prova disso é que, de acordo com uma nota técnica do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) que usa dados coletados do Inpe, os dez municípios da Amazônia com mais focos de incêndio também tiveram as maiores taxas de desmatamento do período.

Estima-se que essas cidades “são responsáveis por 37% dos focos de calor em 2019 e por 43% do desmatamento registrado até o mês de julho”. O número de incêndios que aconteceram até agora, contando apenas a Amazônia, é 67% maior do que o ano de 2018 acumulou no mesmo período. Ainda segundo o Inpe, o mês de agosto foi o mais crítico: dois em cada três focos (65,1%) foram detectados no bioma da região norte do país.

Dados da Nasa e as queimadas no Brasil

Além das imagens dos satélites Terra e Suomi NPP, outro conteúdo produzido pela Nasa – em 16 de agosto – sobre os incêndios no Brasil ganhou destaque nas redes sociais nos últimos dias. Trata-se de uma nota do site do Earth Observatory, mantido pela agência espacial americana, de nome “Fires in Brazil”, que fala sobre imagens de incêndios no norte e centro-oeste do Brasil em 11 e 13 deste mês.

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Por causa de imprecisões no texto, já corrigidas pela Nasa, o conteúdo virou argumento para quem afirma que a temporada de queimadas no Brasil está mais amena do que em anos anteriores. Antes das atualizações, o texto afirmava que o número de incêndios na Amazônia estava abaixo da média dos últimos 15 anos.

O texto destaca, agora, que “as observações de satélite mostram número de incêndios na Amazônia próximo à média em comparação aos últimos 15 anos”. E completa: “embora a atividade esteja acima da média no Amazonas e, em menor escala, em Rondônia, está abaixo da média nos estados do Mato Grosso e Pará, segundo a Global Fire Emissions Database, projeto que compila e analisa dados da Nasa”.

 

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Artigo do site Earth Observatory, da Nasa, escrito em 16 de agosto, sobre queimadas no Brasil. Logo abaixo da imagem, nota-se uma menção sobre a atualização do conteúdo em 22 de agosto. (Nasa/Reprodução)

A confusão aconteceu porque a fonte citada pela Nasa, a Global Fire Emissions Database, havia parado de reunir dados sobre queimadas em 2016. Além disso, seus cálculos consideravam não apenas a porção de Amazônia presente no Brasil, mas também as áreas de floresta que se estendem por Colômbia, Peru, Bolívia e outros territórios. Por conta dessas aproximações, esses dados dificilmente seriam tão precisos quanto os dados do Inpe, por exemplo, que são atualizados diariamente – e divididos por estado e país. A última atualização dos conteúdos de cada estado que consta na Global Fire Emissions Database foi feita em 28 de abril de 2019.

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O equívoco de interpretação que o texto permitia fez com que, na tarde desta quinta-feira (22), a nota sobre o fenômeno fosse atualizada pela Nasa. Além de uma menção à extensão completa do bioma amazônico, foi incluída também a seguinte frase, entre parênteses: “Perceba que ainda que o título do gráfico mencione o ano de 2016, dados relativos a 2019 estão listados em todos os gráficos com uma linha verde. Passe o mouse pelo quadrado verde abaixo do gráfico para isolar os números de 2019”.

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Captura de tela do site da Global Fire Emissions Database, atualizado na tarde de 22 de agosto (Global Fire Emissions Database,/Reprodução)

Quem acessa o site após atualização, como mostra a imagem acima, passou a observar um texto diferente do original – o mesmo aconteceu com os reloginhos que mostram a incidência de queimadas, que agora estão com o ponteiro no vermelho. O conteúdo destaca que fatores como as temperaturas de superfície (SSTs) no oceano Pacífico tropical e do Atlântico Norte na primeira metade de 2019 eram maiores do que a média detectada por satélites no período entre 2001 e 2015. Combinando as temperaturas nos dois oceanos, a Global Fire Emissions Database diz estimar um “alto risco de incêndios” para quase todas as regiões da Amazônia durante o período de secas de 2019. Segundo o banco, os estados de Amazonas e Pará são os que têm o maior risco. O site destaca, por fim, que suas estimativas feitas a partir do ano de 2016 “são preliminares, e precisam ser interpretadas com cautela”.

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