Por que a Nasa quer construir um reator nuclear na Lua?
A energia atômica na Lua ainda deve demorar – mesmo que a Nasa queira cumprir o objetivo até 2030.

Na semana passada, a Nasa anunciou que pretende lançar um reator nuclear capaz de gerar pelo menos 100 quilowatts de eletricidade – o suficiente para alimentar mais de 400 casas brasileiras por um mês – na superfície da Lua até 2030. O anúncio foi feito por Sean Duffy, secretário de Transportes e, agora, administrador interino da agência espacial.
A ideia é que essa energia seja usada para futuras missões de exploração espacial. Atualmente, sondas como as Voyagers (que são usadas desde os anos 1970) funcionam à base de fontes semelhantes a baterias, os reatores de fissão nuclear podem, em teoria, gerar muito mais energia, superando inclusive a alternativa de painéis solares – que apresentam desvantagens especialmente em locais onde a luz solar é escassa.
Um dia lunar equivale a cerca de 28 dias terrestres, com duas semanas de luz solar intensa e duas semanas de escuridão profunda e fria, em que as temperaturas caem a até -240°C. Sistemas baseados em energia solar, como os usados na Estação Espacial Internacional, simplesmente não funcionariam de forma eficiente durante esses períodos noturnos.
Um reator de fissão – pequeno o suficiente para ser transportado por um foguete, mas poderoso o suficiente para sustentar uma base lunar – mudaria esse cenário. Ter uma fonte de energia independente do Sol seria essencial para a presença humana na superfície lunar, disse a Nasa.
A proposta de Duffy não surgiu do nada. Desde 2022, a Nasa tem financiado projetos conceituais para reatores lunares de 40 quilowatts. Empresas como Lockheed Martin, Westinghouse e Intuitive Machines tentaram desenvolver protótipos com menos de seis toneladas de peso – o limite estipulado para caber num foguete moderno. Nenhuma conseguiu, no entanto.
Agora, a Nasa sugere a construção de um reator de 100 quilowatts de geração de energia e até 15 toneladas de carga útil – a agência espera que empresas como SpaceX ou Blue Origin possam entregar um sistema funcional nos próximos cinco anos.
Ainda que seja, em teoria, algo viável, os especialistas duvidam do prazo apertado divulgado pela Nasa. “É um cronograma muito agressivo e, francamente, irrealista para algo que é bom e deveria acontecer”, disse Kathryn Huff, ex-funcionária de energia nuclear do Departamento de Energia e agora professora de engenharia nuclear na Universidade de Illinois. “A intenção é fornecer energia a um posto avançado. Então, parece um pouco tolo fazer isso sem ter um posto”, para o The New York Times.
Um reator nuclear na Lua teria funcionamento diferente dos da Terra porque precisaria ser compacto e leve para caber em um foguete, além de só ser ativado após a chegada ao destino. As condições lunares, como a ausência de ar e água e as temperaturas extremas, dificultam o controle térmico do reator, exigindo o uso de grandes radiadores para dissipar o calor. Um dos maiores desafios técnicos é desenvolver materiais que resistam às altas temperaturas envolvidas na conversão de calor em eletricidade.
A pressa dos EUA não é apenas tecnológica. Há uma dimensão geopolítica na jogada. Em maio, China e Rússia anunciaram planos conjuntos para estabelecer uma base lunar com um reator nuclear até meados da década de 2030. O temor é que essas nações criem “zonas de exclusão” ao redor de suas instalações, limitando o acesso norte-americano a regiões estratégicas, como o polo sul lunar – onde há gelo, possível fonte de água e combustível.
Embora o Tratado do Espaço Exterior de 1967 proíba a apropriação territorial de corpos celestes, ele permite o uso pacífico de recursos para o benefício de todos na Terra. É um vácuo legal que vem sendo preenchido por acordos como os Acordos de Artemis, liderados pelos EUA e já assinados por mais de 50 países (China e Rússia não estão entre os signatários). Nesses acordos, o conceito de “zonas de segurança” ao redor de instalações lunares começa a ganhar forma e tensão.
Além disso, o que motiva essa nova corrida à Lua é a promessa de riquezas e sustentabilidade de longo prazo no espaço. A Lua contém reservas significativas de água congelada, hélio-3 e metais raros (todos elementos valiosos para a manutenção de missões humanas e robóticas).
Além disso, um reator nuclear na Lua serviria como prova de conceito para tecnologias que serão essenciais em Marte, onde o Sol brilha menos e os desafios de sobrevivência são ainda mais difíceis.