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Tania Kiehl Lucci investiga como genes e ambiente influenciam o comportamento de gêmeos

Esta #MulherCientista já estudou o impacto da depressão pós-parto materna em recém-nascidos – mas hoje procura entender como genes e ambiente influenciam o comportamento de gêmeos.

Por Maria Clara Rossini
Atualizado em 6 set 2024, 09h27 - Publicado em 27 ago 2021, 15h55

Muitos pesquisadores passam por um momento crucial no início da carreira acadêmica. É quando eles têm um “clique” e percebem que são cientistas. Tania Kiehl Lucci se percebeu como psicóloga em um estágio que fez durante a graduação na PUC. Ela trabalhava em uma instituição de acolhimento de crianças, e em certo momento, finalmente sentiu que conseguia compreender os anseios dos bebês de oito meses.

A pesquisadora se especializou em desenvolvimento infantil. No mestrado, ela estudou mães com depressão pós-parto e o impacto que essa condição pode causar no desenvolvimento neuropsicomotor dos filhos. Diversos estudos internacionais apontam que a depressão materna pode atrasar a socialização, a fala e outros aspectos importantes do aprendizado e crescimento do bebê. Tania queria verificar por si própria.

A pesquisadora participou de um estudo em larga escala da USP, em que acompanhou 400 mães ao longo de quatro anos. 25% delas desenvolveram depressão pós-parto, uma incidência considerada alta quando comparada com outros países.

A maior surpresa foi que os pesquisadores não observaram grandes diferenças nos marcos de desenvolvimento de bebês de mães com e sem depressão. “A gente achou estranho no início, mas vimos esse resultado se repetir em diversos estudos do grupo de pesquisa . Isso pode mostrar uma resiliência dos bebês para lidar com a situação” diz Tania.

A ciência evolui assim: alguns resultados confirmam, e outros refutam teses. No doutorado, Tania continuou trabalhando com as mesmas mães da pesquisa sobre depressão pós-parto. Ela observou os níveis de certos hormônios nos exames de sangue que essa mulheres haviam realizado no dia em que os bebês nasceram. A pesquisadora verificou que as crianças das mães que desenvolveram depressão depois já vinham ao mundo com níveis elevados de cortisol, um hormônio conhecido por sua ligação com o estresse.

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É normal que a mulher tenha altos níveis de cortisol na gravidez, mas não que o hormônio passe para o bebê. A placenta serve como uma barreira para evitar a transmissão. Uma das hipóteses para explicar este fenômeno é que talvez as mães propensas à depressão tenham uma enzima que permite a passagem do hormônio ao filho.

Geralmente, a mãe só é diagnosticada com depressão dois ou mais meses após o parto. Mas a presença de maior concentração de cortisol salivar no recém-nascido pode indicar, com antecedência, que a mãe está sob o risco de desenvolver a condição.

Após o doutorado, Tania continuou estudando emoções e desenvolvimento infantil, mas focando suas pesquisas em irmãos gêmeos. Ela já trabalhava na USP quando sua orientadora Emma Otta criou em 2015 o Painel USP de Gêmeos, um grupo que pesquisa diferentes aspectos da gemelaridade.

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Apesar de serem frequentes no exterior, havia poucas pesquisas com gêmeos no Brasil. Um dos primeiros trabalhos do painel foi estimar a frequência de gêmeos na cidade de São Paulo: onze a cada mil nascimentos. Depois, do Brasil: nove a cada mil nascimentos.

Houve um aumento de 30% no nascimento de gêmeos na última década na cidade de São Paulo, o que pode estar relacionado à idade materna. Mulheres mais velhas têm mais chances de dar à luz gêmeos. Uma causa direta é o uso de técnicas de reprodução assistida, geralmente realizado por casais de idade avançada. Só que estudos realizados em lugares remotos, que não têm acesso à fertilização in vitro, também apontam que mulheres mais velhas tendem a ter mais gêmeos. Ou seja: pode haver uma variável biológica envolvida.

O Painel não se resume a quantificar nascimentos. Gêmeos são um prato cheio para a pesquisa em psicologia. Eles são uma forma de estudar a influência dos genes e do ambiente no comportamento humano. Os gêmeos monozigóticos (ou idênticos) são fruto de um único zigoto que se dividiu, então eles compartilham o mesmo DNA. Já os dizigóticos (fraternos) vieram de zigotos diferentes, então compartilham 50% do DNA.

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O primeiro passo das pesquisas é verificar se os gêmeos são monozigóticos ou dizigóticos. O método mais preciso é fazer um teste de DNA – mas também é o mais caro. Também não dá para simplesmente perguntar aos irmãos, já que apenas 60% deles acertam se são idênticos ou não. Uma alternativa é aplicar um questionário com perguntas básicas aos gêmeos – por exemplo, se as pessoas confundem os dois.

A precisão do questionário chega a ser de 99,6% da de um teste de DNA. O grupo do Painel USP de gêmeos validou um questionário para ser usado com gêmeos no Brasil e o estudo será publicado em breve.

O que se observa é que os gêmeos monozigóticos têm personalidades mais parecidas entre si do que os dizigóticos. Isso indica que alguns traços da nossa personalidade também têm origem genética, e não são influenciados apenas por fatores ambientais. Tania lembra de dois casos em que os gêmeos foram separados na infância e só se reencontraram depois de adultos. Em um dos casos, os dois irmãos estavam trabalhando com fotografia; no outro, os dois se tornaram músicos.

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As pesquisas do Painel tem o objetivo de promover a pesquisa com gêmeos sobre processos e comportamentos psicológicos, e abordam temas como cooperação, apego e relacionamento entre gêmeos, além de estudar comportamentos como vocalização, expressões faciais, entre outras características. O grupo de pesquisa realiza um encontro anual de gêmeos, onde compartilham os resultados de pesquisas em gemelaridade e coletam relatos e experiências dos irmãos. Hoje, Tania atua como especialista em laboratório e dá aulas no instituto de Psicologia da USP.

 

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