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Baleia de quatro patas com cascos é descoberta no Peru

O fóssil de 42,6 milhões de anos é um elo perdido entre as imensas baleias contemporâneas e os mamíferos quadrúpedes que deram origem a elas.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 5 set 2024, 09h01 - Publicado em 5 abr 2019, 15h31

O que é, o que é? Tem quatro patas… E um rabo de enguia. Caça e come na água, mas volta à praia para ter filhotes. Seus dedos têm cascos nas extremidades, mas são ligados por membranas, como os de um pato.

Não, não é uma das criaturas fantásticas de Harry Potter. É uma baleia. Mais precisamente, uma baleia anfíbia de 42,6 milhões de anos atrás, cujo esqueleto foi encontrado nas planícies litorâneas do Peru. Na ilustração acima, você vê uma reconstituição artística do animal.

A descoberta, anunciada quinta (4) no periódico Current Biology, preenche uma lacuna relevante do registro fóssil: agora nós sabemos, com riqueza de detalhes inédita, como as baleias – que eram originalmente mamíferos terrestres quadrúpedes – se tornaram esses galalaus marinhos com corpo liso e nadadeiras que você conhece hoje.

A história começa assim: pouco após a extinção dos dinossauros, há 65 milhões de anos, os mamíferos que sobreviveram ao impacto do asteroide de Chicxulub finalmente puderam sair da toca.

Na época, eles eram todos minúsculos: se assemelhavam aos ratos ou musaranhos atuais, e tinham hábitos noturnos. Afinal, não era fácil sobreviver em um mundo repleto de T. Rex e afins: manter um perfil discreto era a melhor opção. E foi essa discrição que permitiu que eles sobrevivessem à tragédia.

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Agora, no cenário pós-asteroide, os ecossistemas estavam devastados: quase não havia plantas, nem herbívoros para comer as plantas, nem carnívoros para comer os herbívoros. Após 200 milhões de anos de opressão réptil, esse era o cenário perfeito para os mamíferos assumirem o comando da Terra. Eles se disseminaram geograficamente, aumentaram de tamanho e ocuparam nichos ecológicos inéditos.

O que nos leva às baleias. Há 55 milhões de anos, o traçado dos continentes era diferente. A Índia era uma imensa ilha, semelhante à Austrália atual, que ainda não havia se conectado com o resto da Ásia. A Caxemira, que hoje é uma região árida na fronteira da Índia com o Paquistão, era uma faixa de mar raso. E era ali que um quadrúpede do tamanho de um porco, chamado antracotério, ganhava a vida comendo peixe.

Um belo dia, uma barreira geográfica qualquer separou a população em dois grupos descontínuos. Um deles continuou na rotina. Engordou um bocado, abraçou o vegetarianismo e deu origem aos hipopótamos – que só migrariam para a África depois, há uns 35 milhões de anos segundo uma estimativa recente.

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O outro dos grupos descobriu que mergulhar cada vez mais fundo era uma ideia boa. Esse daria origem às baleias. Como o ambiente aquático é radicalmente diferente do terrestre, a pressão exercida pela seleção natural sobre as baleias aumentou. E aí as adaptações se acumulam muito mais rápido, em termos geológicos. Para se aprofundar em cada capítulo da evolução das baleias, dê uma olhada aqui.

De volta à nossa história: nós já conhecíamos diversos fósseis de baleias intermediárias. Algumas tinham quatro patas já bastante atrofiadas – sinal de que a vida terrestre estava ficando para trás. Outras, apenas duas mãozinhas de resquício, já bem semelhantes a nadadeiras. Você pode vê-las ilustradas nesta excelente página da Universidade da Califórnia em Berkley.

Nenhuma desses fósseis, porém, era tão informativo quanto o descoberto recentemente: “Os outros exemplares dessa época eram mais fragmentados, bem incompletos”, afirmou ao Guardian Oliver Lambert, cientista do Real Instituto de Ciências Naturais da Bélgica que liderou o estudo. “Nós não tinhamos evidências tão claras de sua capacidade de andar e nadar.”

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O fóssil peruano, além de completo, tem outra vantagem: estava no Peru. A presença de uma baleia primitiva extremamente distante de seu berço, na Índia, indica que esses animais já eram excelentes nadadores apenas 10 milhões de anos após seus primeiros passos na água.

Esse talento para road trips se reflete no nome científico: Peregocetus pacificus, que em latim significa “a baleia viajante que alcançou o Pacífico”.

O mais provável é que os antepassados anfíbios das baleias tenham chegado à costa oeste da América do Sul do jeito mais difícil: saindo da Índia, chegaram via Oriente Médio ao norte da África. Depois, atravessaram o Atlântico a nado e alcançaram ao litoral do Brasil. Só então foram parar na região dos Andes. Nem precisa dizer que essa migração levou milhares de anos e gerações.

O Vulfpeck, uma banda americana de funk e soul, gravou uma música chamada Darwin Derby em que o vocalista se pergunta: “Por que a baleia tem perninhas? Eu não sei.” Bem, agora você sabe.

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