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Descoberta caravela naufragada da frota de Vasco da Gama, cheia de tesouros

Tudo indica que o navio era o lendário Esmeralda, que foi ao fundo do Mar da Arábia levando consigo o tio de Vasco, Vicente Sodré, em 1503. É a primeira vez na história que se resgata um naufrágio do primeiro período das Grandes Navegações portuguesas.

Por Denis Russo Burgierman
Atualizado em 4 nov 2016, 19h11 - Publicado em 16 mar 2016, 21h00

Em 1499, Vasco da Gama virou um heroi nacional português, com título de nobreza e tudo, ao voltar para casa após encontrar o caminho por mar de Portugal até a Índia, de onde era possível trazer temperos valiosíssimos, pelos quais os europeus, cansados de comida sem gosto, estavam dispostos a pagar uma fortuna. Mas aí, em 1500, quase que tudo foi por água abaixo para os lusitanos. O rei de Portugal, Manuel I, resolveu enviar para a Índia uma frota de 13 navios liderada por um outro navegador, um certo Pedro Álvares Cabral (que no caminho aproveitou para dar um pulinho do outro lado do Atlântico e descobrir uma certa Ilha de Vera Cruz, depois rebatizada Brasil). A expedicão de Cabral foi um fracasso: atacada por tempestades e por rivais indianos e árabes, que não queriam abrir mão do monopólio do comércio com o Oriente, voltou para casa com apenas seis navios, um deles sem carga nenhuma. Centenas de portugueses morreram nas batalhas e nos naufrágios. Fora o preju.

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Foi aí que Manuel I resolveu engrossar. Montou uma nova expedição, armada até os dentes, novamente sob o comando do heroi Vasco da Gama, com navios capitaneados por seus parentes próximos, gente de confiança. O segundo-em-comando de Vasco era seu tio Vicente Sodré, irmão de sua mãe, um cavaleiro da ordem de Cristo que comandava o leme da caravela Esmeralda. E que se deu mal. Pois bem: depois de quase duas décadas tentando, um grupo de arqueólogos liderado pelo cientista marinho americano David Mearns afirma que encontrou no fundo do Mar da Arábia os destroços do Esmeralda, carregado de tesouros e de velhos segredos do mar.

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Vicente e seu irmão Brás Sodré receberam do rei Manuel I a missão de vigiar a entrada do Mar Vermelho, para proteger os comerciantes portugueses dos inimigos árabes e indianos, enquanto Vasco ia buscar as valiosas especiarias. Mas, segundo ficou registrado na história, eles resolveram desrespeitar as ordens reais. Perceberam que era mais lucrativo sair pelos mares saqueando os comerciantes do Oriente e guardando para si seus valiosos produtos. Só que acabaram quebrando a cara.

Em abril de 1503, Vicente e Brás estavam parados para reparos com cinco caravelas na ilha Al Hallaniyah, na costa do atual Oman, quando foram avisados por nativos que uma tempestade iria chegar e que seus barcos corriam perigo. Os irmãos Sodré correram para proteger as três caravelas menores, mas estavam confiantes de que os dois barcos maiores, o Esmeralda e o São Pedro, dotados de âncora de ferro, não corriam perigo. Deviam ter ouvido os locais. Os dois barcos foram triturados pelos ventos violentos das monções. Os tripulantes do São Pedro, que estavam mais perto da praia, conseguiram se salvar e resgatar parte da carga, mas o Esmeralda afundou com todo mundo dentro, inclusive o capitão Vicente Sodré. Seu irmão Brás também morreu em seguida, não se sabe se por consequência do naufrágio ou por outras causas. Sabemos dessa história toda porque um sobrevivente chamado Pero de Ataíde resgatou o que sobrou das armas reais e viajou com os navios restantes de volta a Portugal, onde denunciou a desobediência dos irmãos ao rei.

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Foi o relato de Ataíde que deu a David Mearns e à sua equipe na empresa Blue Water Recoveries a dica de onde o naufrágio poderia estar. Mearns já era famoso por desenterrar diversos navios afundados durante a Segunda Guerra Mundial. Ele visitou Oman em 1998 e encontrou indícios de que havia algo lá. Mas a burocracia de autorizar uma escavação marinha num sultanato árabe atrasou as escavações em vários anos. Só em 2014 a expedição pode ser feita. Os resultados acabam de ser publicados – e são impressionantes.

Não havia nem sinal do casco do Esmeralda. “Isso não é surpreendente, dada a ferocidade da tempestade, que certamente esmigalhou o casco, e à reação dos sobreviventes, que incendiaram o que restou da caravela”, diz o relatório. Mas muitos dos objetos à bordo foram retirados do mar.

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Havia, como sempre em naufrágios antigos, uma imensa quantidade de cacos de cerâmica – pratos, tijelas, jarros. O interessante é que nenhuma delas continha estanho, um material que foi usado intensamente nas cerâmicas portuguesas a partir de 1550. A ausência do estanho é portanto reveladora de que o navio é mais antigo que isso, como seria de se esperar caso aquele seja mesmo o Esmeralda, afundado em 1503. Outro indício importante tirado do mar por Mearns foi o sino do navio, com a inscrição “498” – provavelmente o que restou da data na qual o sino foi fabricado (1498). Até hoje, nenhuma caravela portuguesa naufragada no início do século 16 havia sido encontrada.

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Mas o maior tesouro achado na escavação foi uma moeda de prata raríssima chamada “índio”. Essa moeda foi cunhada por Manuel I para celebrar o feito de Vasco da Gama e fazia parte de uma série de duas: o “índio” e o “português”, que deveriam ser usadas justamente no comércio recém inaugurado com a Índia. Até hoje só se havia encontrado um “índio”, que está no Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro. Como a moeda foi cunhada em 1499 e circulou apenas até 1504, ela, além de ser uma raridade valiosíssima, é um indício quase incontestável de que o navio fazia mesmo parte da frota de Vasco da Gama.

Descoberta caravela naufragada da frota de Vasco da Gama, cheia de tesouros

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E, se é que restava alguma dúvida, os mergulhadores desenterraram também quase 100 balas de canhão, o que faz sentido a se julgar pela missão bélica que o Esmeralda e o São Pedro receberam de Manuel I. 35 dessas balas eram adornadas pela inscrição “VS”. Não há como saber com toda certeza o que as duas letras significam. Mas, se fosse para apostar, parece bem provável que tenha alguma coisa a ver com o nome do capitão do Esmeralda: Vicente Sodré.

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