Uma linha do tempo dos conflitos no Afeganistão
Neste domingo (15), o Talibã tomou conta da capital afegã. Confira uma breve história dos conflitos e ocupações internacionais para entender o que acontece hoje no Afeganistão.
No último domingo (15), combatentes do Talibã tomou conta de Cabul, a capital do Afeganistão. O grupo extremista islâmico têm avançado por cidades afegãs desde maio, quando o governo americano começou a retirar suas últimas tropas do país.
E por “tomar conta”, entenda-se: o grupo Talibã ocupou instituições governamentais, fechou aeroportos e colocou tropas nas ruas das cidades. Tudo isso com pouca ou nenhuma resistência por parte do exército afegão. O presidente eleito do Afeganistão, Ashraf Ghani, abandonou o país no domingo, poucas horas antes dos guerrilheiros talibãs entrarem no palácio presidencial. Em termos práticos, o Afeganistão está sob o governo do Talibã.
Tudo isso ocorre após a saída do exército americano do território. Os Estados Unidos mantinham tropas no Afeganistão há quase duas décadas, desde o atentado às torres gêmeas. Trata-se da guerra mais longa na qual os Estados Unidos já se envolveu.
A situação evoluiu rápido, mas como foi que tudo começou? O Afeganistão passa por ocupações sucessivas e golpes de estado desde o final do século 20. Para entender o que está acontecendo agora no país asiático, preparamos uma linha do tempo resumida do que ocorreu no Afeganistão durante as últimas décadas.
Décadas de 1970 e 1980
A história dos conflitos e ocupações no Afeganistão pode começar a ser contada a partir da década de 1970. A monarquia afegã, que reinava até então, foi derrubada após um golpe de estado em 1973, que colocou Mohammed Daoud Khan na presidência do país. Acontece que o novo governo não agradou o Partido Democrático do Povo Afegão (PDPA), um partido de orientação marxista. Eles resolveram organizar um golpe contra o presidente.
Foi aí que começou a Revolução de Saur, em 1978. Em resumo, o PDPA tomou o poder, matou Daoud Khan e instituiu Nur Muhammad Taraki como o novo líder. As propostas do novo governo eram bem diferentes do cenário religioso ao qual associamos o Afeganistão: elas instituíam o ensino laico, reforma agrária e a participação feminina na política. Grande parte da população via essas medidas como uma ameaça ao islamismo.
Ocorreu um racha dentro do partido, o que levou a um novo golpe de estado no Afeganistão. Taraki caiu e Hafizullah Amin assumiu o poder. Mas ao contrário do governo anterior, que era aliado da União Soviética, a gestão de Amin não agradou os soviéticos. A URSS enxergava uma possibilidade de aproximação entre o Afeganistão e os EUA. Além disso, ela temia que o governo de Amin não conseguisse controlar os mujahidin: grupos rebeldes islâmicos que se organizavam no interior do país.
A URSS invadiu o território afegão em 1979, o que resultou no quarto golpe de estado em menos de 10 anos. Isso levou a um conflito entre os mujahidin e os soviéticos, que ficou conhecido como Guerra do Afeganistão.
É aqui que os Estados Unidos entram na história. Inimigo número um da União Soviética, os EUA decidiram financiar os mujahidin por meio da CIA. Os combatentes islâmicos recebiam armas e treinamento militar dos americanos.
A guerra com a União Soviética terminou em 1989, com a decadência da potência e retirada de seus exércitos do Afeganistão. A URSS continuou apoiando o governo afegão até 1992, assim como os EUA continuaram financiando os mujahidin até o mesmo ano.
Década de 1990
Desde a saída da URSS, o país foi tomado por conflitos entre o governo e os mujahidin. O Talibã nasceu nesse contexto, como um grupo derivado dos mujahidin, em 1994. Nesse mesmo ano, eles tomaram a cidade de Kandahar e, dois anos depois, a capital, Cabul. O Talibã passou a governar o Afeganistão.
A partir de 1996, o Talibã passou a impor uma série de leis islâmicas ao povo afegão. As mulheres estavam proibidas de frequentar escolas, trabalhar fora de casa, viajar sozinhas etc. Além disso, o consumo de cultura não islâmica, como música e programas de TV, era restrito. Em 1997, o Talibã renomeou o Afeganistão como Emirado Islâmico do Afeganistão. Apenas Paquistão, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos reconheceram o país.
Mohammed Omar, o então líder do Talibã, estabeleceu uma aliança com Osama bin Laden em 1997. Bin Laden é fundador da Al-Qaeda, outro grupo extremista islâmico derivado dos mujahidin.
Década de 2000
Em 11 de setembro de 2001, a Al-Qaeda liderou os ataques aéreos às torres gêmeas. Os EUA, durante o governo de George W. Bush, respondeu aos ataques com a Operação Liberdade Duradoura, que marcou a entrada do exército americano em território afegão. O objetivo era encontrar Osama Bin Laden, que estava sob proteção do Talibã em Cabul. Em poucas semanas, os EUA tomaram o poder da região.
O Talibã sai de foco em 2003, quando os EUA invadem o Iraque com o objetivo de derrubar o regime de Saddam Hussein. Em 2009, o presidente Barack Obama voltou a mandar tropas ao Afeganistão para combater a ressurgência do Talibã.
Dois anos depois, Osama Bin Laden foi encontrado e executado pelo exército americano. Com a ameaça neutralizada, os EUA começam a planejara redução das tropas internacionais e estudar o futuro do governo afegão. Barack Obama estabeleceu um plano de tirar todos os americanos do Afeganistão até 2016, mas isso não aconteceu.
Décadas de 2010 e 2020
Em 2017, Donald Trump assumiu o governo dos EUA e, consequentemente, teve que lidar com a situação do Afeganistão. A intervenção dos Estados Unidos no Afeganistão não era mais vista com bons olhos pelos americanos. Trump negociou com o Talibã e anunciou que iria retirar as últimas tropas americanas a partir do dia 1 de maio de 2021.
Em abril deste ano, o presidente Joe Biden anunciou que iria manter a data anunciada por Trump para a retirada das tropas do Afeganistão. Desde maio, o Talibã tem avançado pelos municípios afegãos, sem muita resistência do exército afegão. O grupo assume o controle das capitais provinciais do país em apenas duas semanas, e começa a negociar com o presidente Ashraf Ghani sobre quem vai governar o país.
Na semana passada, o serviço de inteligência americana publicou um relatório estimando que o Talibã iria tomar controle de Cabul em até 90 dias. Mas em menos de uma semana, no dia 15 de agosto, o presidente eleito abandonou o Afeganistão e o Talibã conquistou a capital do país.