Congresso dos EUA aprova lei que pode banir o TikTok no país
Projeto ainda precisa passar pelo Senado. Entenda a rixa entre o governo americano e a ByteDance, empresa chinesa por trás do app.
Nesta quarta (13), o Congresso dos Estados Unidos passou um projeto de lei que pode banir o TikTok caso a ByteDance, empresa chinesa dona do aplicativo, se recuse a vender ou abrir mão de sua operação no país. A proposta foi aprovada com 352 votos a favor e 65 contra.
O projeto é mais uma etapa em uma longa rixa do governo americano com o TikTok. Desde 2020, existem ideias de banir o aplicativo do país. O estado de Montana até chegou a fazer isso em 2023, mas a medida foi bloqueada.
A explicação dos congressistas é de que o TikTok estaria coletando dados de usuários americanos, e que o governo chinês poderia ter acesso a eles – o que seria um risco à segurança nacional. Outra preocupação é de que a rede social estivesse deliberadamente promovendo certos conteúdos como forma de propaganda política – como denúncias dos ataques israelenses em Gaza.
O TikTok negou que compartilha dados com o governo da China. Segundo eles, as acusações não têm embasamento – cerca de 60% da empresa pertence a instituições investidoras globais. Além disso, dentre os cinco membros do conselho da empresa, três são americanos. E , depois de um investimento de US$ 1 bilhão, os dados confidenciais de usuários dos EUA seriam armazenados em servidores operados pela Oracle, uma empresa americana de computação em nuvem.
Se a lei passar, a ByteDance terá 165 dias para vender a operação do TikTok nos EUA a um comprador que seja do agrado do governo americano. A venda teria que garantir que a ByteDance ou qualquer empresa chinesa não tenha mais controle sobre o TikTok ou seu algoritmo.
Ainda nesse cenário, caso a empresa não consiga ou se recuse a vender a rede social, o TikTok se tornaria ilegal nas lojas de apps (como Apple Store e Google Play) que distribuam ou atualizem o aplicativo em solo americano. O Departamento de Justiça pode punir qualquer empresa que trabalhe com o TikTok ou ofereça seu aplicativo para download. As multas para uma violação são pesadas, no valor de US$ 5 mil para cada usuário dos EUA que tenha “acessado, mantido ou atualizado um aplicativo controlado por um adversário estrangeiro”.
A votação ainda precisa ser aprovada no Senado, onde ela deve encontrar resistência, antes de chegar nas mãos do presidente Joe Biden para a decisão final. Biden já disse que, se a lei chegar em sua mesa, ele vai aprová-la.
“Esta legislação tem um resultado pré-determinado: a proibição total do TikTok nos Estados Unidos”, disse a empresa após a votação do comitê. “O governo está tentando privar 170 milhões de americanos do seu direito constitucional à liberdade de expressão. Isso prejudicará milhões de empresas, negará audiência aos artistas e destruirá os meios de subsistência de inúmeros criadores em todo o país.”
Oposição dos usuários
Usuários da rede, criadores de conteúdo e até outros políticos americanos expressaram seu descontentamento com o projeto.
O senador Rand Paul disse ao Washington Post na terça-feira (12) que se oporia a qualquer medida que viole a Constituição americana, e que o Congresso não deveria “tentar retirar os direitos à liberdade de expressão de 170 milhões de americanos”.
Usuários do TikTok foram alertados do projeto de lei através de um aviso em seus aplicativos. O alerta os incentivava a procurar seus respectivos representantes no Congresso para expressar sua opinião – criadores de conteúdo na rede estimularam seus seguidores a fazer o mesmo.
Como resultado, os telefones dos congressistas foram tomados por ligações de jovens reclamando da medida – alguns até decidiram suspender suas linhas telefônicas após tantas chamadas. Os políticos não gostaram nada disso, e disseram que esse é uma das provas de que o TikTok já estaria fazendo a cabeça dos usuários.
“Por que é que os membros do Congresso se queixam de ouvir os seus eleitores? Com todo o respeito, esse não é o trabalho deles?”, disse a conta oficial do TikTok no X (ex-Twitter). “170 milhões de americanos amam o TikTok e cada um de nós deveria se preocupar com nossos direitos.”
Pode isso, Arnaldo?
Os EUA podem proibir um app de operar em território nacional? Sim. Desde que o Congresso consiga provar que o TikTok é uma ameaça legítima e séria à privacidade e segurança nacional do país, e que não há outro jeito de resolver isso.
Chegar nesse ponto, porém, é algo difícil, pois vai de encontro ao direito dos americanos previsto na Primeira Emenda da Constituição deles: “O Congresso não fará nenhuma lei (…) restringindo a liberdade de expressão ou de imprensa.”
“Na minha opinião, isso é um banimento, eles só não estão chamando disso, e banir o TikTok é obviamente inconstitucional”, afirma Ramya Krishnan, advogada do Knight First Amendment Institute da Universidade de Columbia, em entrevista à Vox.
A opinião de Krishnan também é reflexo de outros advogados e especialistas em direito. Apesar de não ser considerada um banimento completo – visto que há a possibilidade da ByteDance se desvincular do TikTok – a lei funcionaria basicamente como tal.
Não só: segundo o projeto, o presidente dos EUA, seja qual for daqui para frente, teria amplos poderes para proibir outras plataformas de mídia social baseadas em seu país de origem ou em sua concepção de ameaça. Alguns congressistas expressaram preocupação em dar ao chefe do Executivo o poder de decidir o que os americanos podem ver em seus celulares.
“Não posso assinar um cheque em branco para algum futuro presidente que poderia facilmente transformar esta legislação em arma”, disse a deputada Sydney Kamlager-Dove.
Próximos capítulos
Vender o TikTok não seria tão fácil, para começo de conversa. Com 170 milhões de usuários nos Estados Unidos, o valor da rede seria bem alto, com poucas empresas dispostas a pagar. Alguns dos compradores potenciais são as gigantes da tecnologia que conhecemos: Microsoft, Google e Meta (dona do Facebook, Instagram e WhatsApp). O problema é que o tamanho dessas empresas poderia fazer com o que o governo americano entrasse com medidas anti-monopólio.
O ex-presidente Donald Trump, que no passado defendeu o banimento do TikTok, disse que mudou de ideia. Apesar de concordar que a rede é uma ameaça à segurança nacional, ele afirma que a decisão só aumentaria o poder do Facebook: “O que eu não gosto é que sem o TikTok você pode tornar o Facebook maior, e considero o Facebook um inimigo das pessoas junto com grande parte da mídia.”
E ainda que a ByteDance consiga encontrar um comprador para o TikTok, a China pode simplesmente barrar a venda. Essa transação cairia no rótulo de “exportação de tecnologia” e precisaria da aprovação do governo para acontecer. Ano passado, Pequim disse que seria contrária à suposta venda.
Arrasta pra cima
“Esta é a minha mensagem para o TikTok: rompa com o Partido Comunista Chinês ou perca o acesso aos seus usuários americanos”, disse o deputado Mike Gallagher, autor do projeto de lei.
Em sua apresentação, Gallagher afirmou que o projeto não daria poderes para “penalizar indivíduos” ou para “censurar discursos” – mesmo que, caso o banimento ocorra, usuários da plataforma perderiam sua rede social de preferência. Segundo ele, o TikTok está se tornando a “plataforma de notícias dominante para americanos com menos de 30 anos”, e que manter isso nas mãos de um controle estrangeiro adversário seria uma ameaça à segurança nacional.
Outros deputados expressaram preocupações com a inconstitucionalidade da medida – que, atualmente, mira uma empresa em particular. Enquanto empresas americanas também coletam dados sobre os usuários, não parece certo criar uma lei que não se estenda a outras redes.
“Precisamos de restrições nas redes sociais, mas precisamos que essas restrições sejam aplicadas de forma generalizada”, disse a senadora Elizabeth Warren.
Por enquanto, ainda não há previsão de quando a lei será votada no Senado. A novela entre Estados Unidos e TikTok ainda está longe de acabar.