Peixe-pulmonado da América do Sul possui o maior genoma animal já sequenciado
Genoma do peixe-pulmonar sul-americano é 30 vezes maior que o de um ser humano – e pode ajudar a compreender a evolução das espécies.
Em 2018, uma equipe de cientistas de seis países anunciou que havia decodificado o genoma animal mais longo já encontrado: o axolote. A salamandra mexicana conhecida por sua fofura incomum tem 32 bilhões de pares de bases em seu genoma. Três anos depois, em 2021, alguns dos mesmos pesquisadores anunciaram um novo recorde de genoma grandão: o peixe-pulmonado-australiano.
Na época, contamos a história em detalhes aqui. O genoma do peixe-pulmonado-australiano tem 43 bilhões de pares de bases. Isso é 14 vezes maior que o de um ser humano, e 30% maior que o do axolote.
Agora, uma equipe liderada pela Universidade de Constança (Alemanha), e que inclui pesquisadores da Universidade Federal do Pará, descreve um novo recordista. O genoma do peixe-pulmonado da América do Sul (Lepidosiren paradoxa) tem mais que o dobro de pares de bases que o anterior. O estudo foi publicado hoje (14) na revista Nature.
O que é um genoma?
O genoma de um organismo é a sequência completa de seu DNA. É como o caderno de receitas para fabricar uma espécie.
O DNA é composto por pares de bases feitos de componentes que talvez você se lembre de ouvir falar na escola: adenina (A), timina (T), guanina (G) e citosina (C). Adenina e timina são uma dupla, guanina e citosina são outra.
A ordem em que essas duplas aparecem é um código que “explica” à célula como fabricar certas proteínas: anticorpos, enzimas digestivas, alguns hormônios, a queratina dos seus cabelos etc.
Cada espécie tem o seu caderno de receitas, e alguns são mais longos do que se esperaria. Estão cheios de explicações e rodeios que, até onde sabemos, não são nem utilizados. O tamanho do genoma não está diretamente relacionado à complexidade daquela espécie.
Afinal, o organismo com o maior genoma já mapeado é uma samambaia nativa de ilhas do Pacífico, que tem 160 bilhões de pares de base. Dá pra afirmar, sem medo de errar, que isso não faz dela mais complexa que os humanos, que têm “só” 3 bilhões de pares de base em seu genoma.
Uma explicação bem completa dessa história pode ser lida aqui.
Qual é o animal com o maior genoma do mundo?
O peixe-pulmonado da América do Sul (Lepidosiren paradoxa) tem 91 bilhões de pares de bases no seu genoma. Há apenas três linhagens de peixes pulmonados no mundo: na América do Sul, Austrália e África. O peixe americano tem o dobro de bases dos peixes australiano e africano.
As espécies de peixes pulmonados são consideradas “fósseis vivos”, por serem surpreendentemente estáveis ao longo de centenas de milhões de anos. São animais que conservam características das espécies ancestrais de todos os vertebrados atuais, especialmente do momento em que algumas espécies de peixes começaram a se adaptar para viver fora d’água.
É daí que vem o nome “pulmonado”: ele é um dos poucos peixes que possuem um pulmão primitivo capaz de auxiliar na respiração. Quando os níveis de oxigênio na água são baixos, ou quando o peixe faz muito esforço, ele pode subir para a superfície e sugar ar por suas narinas. Em condições normais, porém, ele respira pelas brânquias, como um peixe comum.
Quando os peixes pulmonados foram descobertos pela primeira vez, no século 19, essas características fizeram com que os cientistas da época classificassem o peixe erroneamente como um anfíbio. “Em uma perspectiva genômica, [ele] é genomicamente um meio caminho entre um peixe e um vertebrado terrestre”, disse Siegfried Schloissnig, autor do estudo, em 2021 à revista NewScientist.
E por quê alguns animais têm genomas tão enormes?
Seres vivos com genomas gigantes ainda são um mistério para a ciência. Não se sabe por que exatamente algumas espécies possuem tanto DNA – possivelmente, o tamanho do genoma não causa nenhuma vantagem ou desvantagem evolutiva para elas, então ele só continua assim ao longo dos milênios.