Nova técnica revela idade dos Manuscritos do Mar Morto
Usando datação de radiocarbono e inteligência artificial, pesquisadores estabelecem nova cronologia para os manuscritos que deram origem à Bíblia.

Os Manuscritos do Mar Morto são um conjunto de textos encontrados nas cavernas de Qumran, em Israel. Eles contém os trechos mais antigos da bíblia hebraica – a fonte canônica do Antigo Testamento cristão.
Não à toa, pesquisadores estudam esses textos desde a década de 1950, quando foram descobertos, como uma forma de entender a origem das escrituras sagradas do judaísmo e cristianismo. Atualmente, os Manuscritos estão no Museu de Israel, em Jerusalém.
Uma das formas de pesquisá-los é por meio da paleografia, a área da ciência que estuda a escrita antiga. Ela é responsável por traduzir manuscritos cuja caligrafia não é compreensível nos tempos atuais, e também por estudar a evolução da escrita à mão. As características de um determinado manuscrito podem revelar quando e onde ele foi produzido.
Agora, pesquisadores do projeto The Hands That Wrote the Bible (As Mãos Que Escreveram a Bíblia), da Universidade de Groningen, criaram uma espécie de robô paleógrafo. Usando amostras dos manuscritos, eles treinaram um modelo de Inteligência Artificial capaz de analisar os microdetalhes do traço da tinta.
A IA, chamada Enoch, avalia o tamanho, curvatura e geometria dos caracteres. Isso permite chegar a uma precisão e detalhamento que um paleógrafo humano, sozinho, não conseguiria atingir. Dessa forma, a IA estima a idade dos manuscritos.
Comparando os resultados do Enoch com a datação de radiocarbono de alguns manuscritos – um método confiável para estabelecer a idade de objetos – a IA acerta com uma precisão de 30 anos para mais ou para menos. Dessa forma, pesquisadores podem usar o Enoch para refinar suas datações dos mais de mil Manuscritos do Mar Morto.
Ainda mais antigos
Para começar, os pesquisadores analisaram 135 manuscritos. Muitos deles são mais antigos do que se imaginava – em especial, os manuscritos do tipo hasmoneanos, que atualmente são datados dos anos 150 a 50 a.C. O mesmo vale para os manuscritos do tipo herodianos. O estudo sugere que esses manuscritos surgiram em épocas próximas, no final do segundo século a.C.
Segundo os autores, essa nova cronologia pode impactar nossa compreensão do desenvolvimento político e social no leste do Mediterrâneo durante os períodos Helenístico e Romano (do final do quarto século a.C. até o segundo século d.C.). A datação pode fornecer novas informações sobre o surgimento de grupos religiosos por trás dos Manuscritos do Mar Morto e dos primeiros cristãos.
O estudo também fornece evidências sobre os possíveis autores de dois livros bíblicos. A datação de radiocarbono e o Enoch estabeleceram o manuscrito 4QDanielc (4Q114) como o fragmento mais antigo conhecido do Livro de Daniel, datado do segundo século a.C. Embora os pesquisadores não saibam exatamente quem terminou o Livro de Daniel, estima-se que isso tenha acontecido no início dos anos 160 a.C. Dessa forma, é possível estabelecer uma cronologia mais precisa do livro.
Para o Livro de Eclesiastes, o estudo verificou que o fragmento mais antigo é o manuscrito 4QQoheleta (4Q109), datado do terceiro século a.C. A datação condiz com a visão histórica mais aceita, que diz que o autor anônimo do livro teria vivido no período Helenístico.
Os resultados foram publicados hoje (4) no periódico PLOS One.