Pergaminho medieval revela primeiro mapa conhecido do céu noturno
O documento contém parte do famoso catálogo de estrelas de Hiparco, astrônomo que viveu há mais de dois mil anos. Entenda.
Hiparco, que viveu de 190 a.C. a 120 a.C., é muitas vezes considerado o maior astrônomo da Grécia Antiga. Historiadores acreditam que ele foi o primeiro a mapear estrelas pelo céu inteiro, criar modelos dos movimentos do Sol e da Lua em relação à Terra e descobrir a precessão do nosso planeta – um fenômeno que consiste na lenta oscilação do eixo de rotação (ele se desloca um grau a cada 72 anos).
Pesquisadores procuram o tal catálogo de estrelas de Hiparco, o primeiro mapa conhecido do céu noturno, há séculos. Agora, uma equipe de pesquisadores da França e do Reino Unido diz ter encontrado parte dele escondida em um pergaminho medieval. O estudo foi publicado no Journal for the History of Astronomy.
O manuscrito veio de um mosteiro na Península do Sinai, no Egito, mas a maioria de suas 146 folhas são agora de propriedade do Museu da Bíblia, nos Estados Unidos. As páginas contêm textos cristãos escritos nos séculos 10 e 11, mas o documento é um palimpsesto: um pergaminho cujo texto foi raspado para que pudesse ser reutilizado.
Peter Williams, pesquisador da Universidade de Cambridge (Reino Unido), e seus estudantes queriam descobrir quais textos antigos estavam escondidos no pergaminho. Para isso, analisaram as páginas em 2017 usando a técnica de imagem multiespectral, que consiste na criação de imagens de um mesmo objeto a partir de diferentes comprimentos de ondas eletromagnéticas (com raio-X ou infravermelho, por exemplo).
Eles encontraram material astronômico em nove páginas e descobriram (com a datação por radiocarbono e pelo estilo do texto) que as páginas provavelmente foram escritas nos séculos 5 ou 6. Entre elas, estão mitos sobre a origem das estrelas, partes de um poema do século 3 a.C. que descreve as constelações e informações sobre a Coroa Boreal.
Os pesquisadores acreditam que estas informações são de Hiparco por conta da forma que elas estão expressas – e de sua precisão. A equipe ainda estudou as coordenadas indicadas no pergaminho e descobriu que as observações foram feitas por volta de 129 a.C. – época em que o astrônomo grego estava na ativa.
Eles calcularam isso a partir do fenômeno da precessão: essa oscilação do eixo da Terra implica na mudança lenta da posição aparente das estrelas no céu. O gif abaixo ajuda a entender melhor o fenômeno:
Segundo Victor Gysembergh, autor principal do estudo, as imagens multiespectrais de palimpsestos abrem uma nova fonte de textos antigos. “Só na Europa, existem milhares de palimpsestos nas bibliotecas. Este é apenas um caso, muito empolgante, de uma possibilidade de pesquisa que pode ser aplicada a milhares de manuscritos com descobertas incríveis todas as vezes”, explica à revista Nature.