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Alzheimer: cientistas descobrem um novo tipo genético da doença

Um novo estudo revelou um provável culpado direto de parte dos casos de Alzheimer: o gene APOE4 – quase todos os indivíduos com duas cópias dele desenvolvem o transtorno. Entenda.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 9 Maio 2024, 17h09 - Publicado em 8 Maio 2024, 16h00

Mais de 55 milhões de pessoas possuem demência no mundo todo, segundo dados da OMS, sendo que até 70% delas têm o tipo conhecido como doença de Alzheimer, a condição progressiva que danifica a memória e outras funções cerebrais. Apesar de ser amplamente estudada, a ciência ainda não sabe qual é a causa específica do transtorno.

Agora, um novo estudo traz informações valiosas: pelo menos parte dos casos de Alzheimer pode ter uma enorme influência da genética – a ponto de que apenas um par de genes específicos pode ser a causa de parte dos casos da doença, e não apenas um fator de risco (como se pensava até agora).

A variante do gene em questão é conhecida como APOE4, localizado no cromossomo 19. Ela não é novidade para a ciência: há mais de 30 anos sabe-se que possuir o versão APOE4 desse gene – e não a variante APOE3 ou APOE2, mais comuns – está ligado a um maior risco de se desenvolver Alzheimer. Ter duas cópias, então (uma herdade do pai e outra da mãe) aumenta ainda mais as chances da doença aparecer.

Agora, porém, cientistas do Instituto de Pesquisa Sant Pau, na Espanha, analisam esse gene mais a fundo e propõe que ele não é só um fator de risco, mas a causa em si. Primeiro, a equipe estudou quase 3.300 cérebros doados para pesquisa. Descobriram que, dos 273 órgãos provenientes de doadores que tinham duas cópias do gene APOE4, quase todos (95%) os cérebros tinham sinais de Alzheimer.

Depois, os pesquisadores analisaram os dados médicos de mais de 10 mil pessoas, e, dessa amostragem, identificaram cerca de 500 pessoas com ambas cópias da variante em questão. Desse grupo, novamente quase todos indivíduos passavam a ter um nível anormal de beta-amilóide em seus corpos quando passavam dos 65 anos. 

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A beta-amilóide é uma proteína que está relacionada a casos de Alzheimer – embora não se saiba como, nem p, ela se acumula nos cérebros de pessoas com a doença, formando “placas” que são inclusive visíveis através de exames de imagem. Das 500 pessoas com os dois genes APOE4, 75% tinham a confirmação do acúmulo de beta-amilóide em seus cérebros.

O que essa equipe de cientistas propõe, então, é que esses dados mostram com uma certa confiança que pelo menos parte dos casos de Alzheimer tem origem genética, ligada diretamente ao gene APOE4, que, quando em dupla, seria a causa da doença, e não só um fator de risco. Essa conclusão foi publicada na revista Nature.

Isso não significa que todos quadros de Alzheimer sejam culpa desse gene. O que a equipe afirma é que esse estudo comprova uma forma distinta da doença, totalmente genética, que explicaria cerca de 15% dos casos totais de Alzheimer. Os outros 80% ainda entram naquela caixinha de casos que a ciência não sabe explicar o porquê – o mais provável é que eles sejam casos de origem multifatorial, ou seja, com várias causas, incluindo genética (outros genes, além do APOE4, já foram identificados como fator de risco para a enfermidade).

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A diferença dessa nova forma de Alzheimer proposta, então, é que ela tem basicamente uma única causa: o tal gene APOE4.

Outra diferença crucial entre essa forma de “Alzheimer genético” e outros casos da doença cujas origens ainda são desconhecidas é o tempo e a progressão do avanço da destruição neurológica. Segundo a equipe, quem tem duas cópias do gene APOE4 começaram a apresentar sintomas mais cedo, até 10 anos antes do que quem tem tipos distintos de Alzheimer. Ou seja: é uma versão aparentemente mais agressiva da enfermidade.

O novo estudo também levanta questões mais abrangentes. Cerca de 2% de toda população mundial tem duas cópias do gene APOE4. Se o que os cientistas espanhóis propuseram está certo, isso significa que quase todas essas pessoas vão desenvolver Alzheimer com o avanço da idade. Teoricamente, então, daria para prever se alguém vai ter ou não essa versão doença só com um exame genético. Mas calma: como foi o primeiro estudo a sugerir isso, não se apresse. Nada de sair tentando descobrir se você é uma dessas pessoas.

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Especialistas afirmam que é preciso que outras pesquisas reforçam a conclusão desse artigo antes de se pensar em fazer um mapeamento genético da população – até porque a resposta de quem tem dois genes APOE4 não ajudaria muito, já que, até agora, não há nada que possa ser feito para impedir o aparecimento do transtorno com o envelhecimento. Saber com antecedência só causaria sofrimento e ansiedade antecipados.

Mas a descoberta também pode ajudar a tentar encontrar novos tratamentos para a doença, já que agora, pelo menos para parte dos casos, parece haver um alvo específico, o gene APOE4. Uma das possibilidades é editar o tal gene e “trocá-lo” pela variante APOE3 – sim, a edição genética existe e é uma das técnicas consideradas mais promissoras da medicina, inclusive para Alzheimer.

Mas o estudo também teve suas limitações. Por exemplo: quase toda base de dados utilizada veio de pessoas brancas e com ascendência europeia. Não se sabe se esse impacto genético se repete em pessoas de outras etnias, por exemplo.

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