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O caso da mulher que bebeu 1L de shoyu por causa de um “detox”

Danos cerebrais sérios estão entre as consequências irreparáveis de seguir uma moda da internet para "expulsar toxinas".

Por Ingrid Luisa
Atualizado em 12 dez 2018, 18h54 - Publicado em 12 dez 2018, 18h44

Não é preciso ser nenhum gênio ou analista para acreditar, com bastante certeza, que beber litros de molho shoyu faz mal à saúde. Se você juntar lé com cré, vai presumir isso sozinho. Outras dietas e detox milagrosos da internet são tão absurdas quanto essa ideia – não fazem sentido nenhum e, mesmo assim, acabam seguidas por milhares de pessoas. No caso do shoyu, alguém teve que sofrer consequências graves para que as pessoas se lembrassem do óbvio: detox não funciona.

O caso

O incidente com o molho de soja foi relatado em um canal do Youtube chamado Chubbyemu – onde, desde 2015, um médico americano relata alguns dos casos mais impressionantes que ele ou colegas próximos já atenderam (sem, é claro, revelar a identidade do paciente).

De acordo com o doutor, uma mulher de 39 anos – chamada de “CG” – chegou a um pronto-socorro no Distrito Médico de Illinois tendo alucinações. Todos os indícios apontavam para uma deterioração da função cognitiva – ou seja, um problema no cérebro.

O marido dela, Julio, estava apavorado, pois, na ambulância, CG teve de ser ressuscitada após uma parada cardíaca. Durante a conversa com os médicos, Julio confessou que a esposa havia consumido um litro de molho shoyu naquele dia.

CG estava fazendo uma dieta e tinha lido na internet que tomar molho de soja iria retirar todas as toxinas de seu corpo. A “técnica” exigia que ela resistisse à tentação de beber água para que o detox funcionasse. CG era, possivelmente, ainda mais vulnerável a essa tipo de boato – ela, segundo o marido, tinha sido previamente diagnosticada com esquizofrenia paranoide, que exigiu até uma internação hospitalar. Sua dedicação à dieta era aparentemente intensa: a paciente perdera 11 kg em três semanas.

O problema é que, depois de tomar shoyu aos goles, CG começou a sentir o coração bater mais rápido. Segundo o médico, CG parou de falar inteligivelmente, depois perdeu a consciência. Seu marido, desesperado, chamou uma ambulância e, no caminho para o hospital, houve o episódio da parada cardíaca. Já no pronto-socorro, os médicos afirmaram que GC estava com hipernatremia aguda (excesso de sódio no sangue) .

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A paciente foi tratada ingerindo uma solução a 5% de dextrose (água com açúcar), o procedimento padrão em casos de hipernatremia. Mas o caso era grave: os médicos constataram que ela possuía 5 vezes sal do sangue do que a dose considerada letal, que é de 40 gramas.

Após o tratamento com dextrose, CG começou a melhorar, mas não conseguia ficar consciente de forma estável. Ela só teria recuperado a consciência, de fato, três dias depois de sua chegada ao hospital. Mas aí apareceram as sequelas: CG não conseguia mover seus membros e mostrou dificuldade para falar e engolir.

Diagnóstico: mielinólise pontina central, um tipo de lesão nervosa extensa no tronco encefálico. O cérebro da paciente ainda funcionava, mas não podia enviar normalmente impulsos nervosos ao resto de seu corpo, o que provocou danos irreparáveis. Ela não faleceu, mas hoje vive com disartria, disfagia e tetraplegia.

As razões químicas

Depois de ler essa tragédia, você pode estar curioso: o que exatamente acontece no organismo quando ingerimos grandes quantidades de sal?

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Bem, para explicar isso, vamos voltar aos boatos que a paciente leu. Eles diziam que molho de soja contém muito sal (o que é verdade), e que, em grandes quantidades, as “toxinas” em seu corpo seriam “puxadas” pelo sal, e ficariam grudadas nele até sua eliminação. Quimicamente, isso não faz sentido nenhum.

A água no nosso corpo está numa concentração de sal a 0.9%, o que podemos chamar de isotônico. O molho de soja é 20% sal. Após ingerir 1 litro de shoyu, o sangue de CG virou uma solução extremamente concentrada. Daí, a água das células, tecidos e órgãos do corpo sairam de onde estavam e foram para o sangue, para tentar diluir essa solução e resolver o problema. Mas, os órgãos dependem dessa água para seu funcionamento normal – principalmente alguns mega sensíveis e irrigados, como o cérebro. Essa osmose forçada pode ser letal para o organismo.

O tratamento com dextrose que CG recebeu fez com que os tecidos automaticamente absorvessem água, uma osmose reversa. Mas já era tarde demais. O dano causado pela contração cerebral (à medida que os vasos sanguíneos no cérebro começam a se comprimir uns contra outros pela saída de água) geraram consequências irreversíveis.

Shoyu é sal

O molho shoyu foi inventado pelos chineses para conservar alimentos. Uma função primordial desenvolvida por um de seus principais componentes: o sal.

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O molho de soja é preparado com grãos de soja fermentados com trigo ou cevada na salmoura. Também é usado como condimento, para dar um sabor especial a uma enorme variedade de pratos, devido ao seu sabor forte. Mas seu consumo deve ser moderado – e, em alguns casos, mantido aos menores níveis possíveis, principalmente para pessoas com problemas de pressão alta.

Beber molho shoyu puro não tira toxinas nem emagrece – mas pode, sim, matar. CG teve sorte. Em 2011, o periódico Journal of Forensic and Legal Medicine noticiou o caso de uma japonesa de 55 anos que se suicidou bebendo uma garrafa de molho de shoyu.

Por fim, vale lembrar que seu corpo não precisa de ajuda externa para eliminar toxinas. Ele é especialista nisso. E qualquer tentativa de “forçar” esse processo tem dois problemas: no mínimo, ela só não faz sentido algum. E, no máximo, pode levar você a óbito.

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