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O que acontece enquanto você dorme

Nunca dormimos tão mal – e tão pouco. Os brasileiros estão dormindo 1h30 a menos, em média, do que na década de 1990, e 63% têm problemas de sono.

Por Anna Carolina Rodrigues e Bruno Garattoni
Atualizado em 24 jan 2019, 19h51 - Publicado em 6 abr 2014, 22h00

 

Ken Parks, de 23 anos, era casado e tinha uma filhinha de 5 meses. Morava com a esposa e a criança em Toronto, no Canadá. Até que um dia perdeu o emprego. Os sogros, com quem ele se dava extremamente bem, se ofereceram para ajudá-lo financeiramente. Então Ken pegou seu carro e foi até a casa deles. Quando chegou, matou a sogra a facadas e tentou enforcar o sogro.

Seria apenas mais um caso de crime em família, exceto por um detalhe: Ken estava dormindo, tendo uma crise grave de sonambulismo, quando fez tudo aquilo. Durante o julgamento, ele foi submetido a exames de eletroencefalograma, que apontaram grandes distorções em suas ondas cerebrais, típicas de sonâmbulos. Acabou absolvido – e, desde então, mais 68 casos do chamado ‘homicídio sonâmbulo’ foram registrados no mundo.

São casos extremos de distúrbio do sono. Mas dormir mal não tem nada de extremo. Na verdade, é a coisa mais comum do mundo – e está piorando. Hoje, os brasileiros dormem em média 1h30 a menos do que há 20 anos, segundo uma pesquisa feita pelo Instituto do Sono de São Paulo com 1.024 pessoas. São apenas 6h30 por noite, bem menos do que os entrevistados desejariam dormir (em média, 8h10). E 63% têm algum problema de sono.

Mas a ciência finalmente começou a decifrar os segredos desse mundo misterioso no qual ficamos mergulhados por quase um terço da vida. Novos estudos estão revelando por que estamos dormindo tão mal, como resolver isso e o que realmente acontece no corpo durante a noite.

Por que a gente dorme?

Dormir é uma delícia – mas, do ponto de vista da evolução, é um comportamento difícil de explicar. Para o homem das cavernas, dormir podia significar nunca mais acordar, pois a chance de ser atacado por um predador era grande. E, mesmo hoje, em que esse risco é muito menor, o sono continua sendo meio paradoxal, porque nos faz desperdiçar um terço do nosso tempo de vida consciente.

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O sono é uma das áreas mais jovens da ciência. Até a metade do século 20, os cientistas acreditavam que o cérebro se desligasse totalmente durante a noite, com o único objetivo de descansar. Hoje, sabemos que não é bem isso. Dormimos por três motivos: para economizar energia, para fazer manutenção do corpo e para consolidar a memória.

O primeiro é fácil de entender. Enquanto você dorme, seu corpo consome menos energia – pelo simples fato de você estar imóvel e relaxado. Se não dormíssemos, teríamos de consumir um número muito maior de calorias para sobreviver, o que seria extremamente difícil para os homens primitivos. Num mundo onde o alimento era escasso, dormir era fundamental para não morrer de fome – mesmo que isso aumentasse o risco de ser atacado por animais selvagens durante a noite.

A segunda função do sono tem a ver com os processos reparadores que seu corpo executa enquanto você dorme. Na década de 1980, cientistas da Universidade de Chicago comprovaram isso realizando um teste com ratos. Após duas semanas impedidos de dormir, os bichos simplesmente morreram. Eles tinham desenvolvido manchas e feridas que não saravam e, independente da quantidade de comida que ingerissem, só perdiam peso. Até que, de uma hora para a outra, apagavam e não acordavam mais. Morte. O mesmo estudo foi repetido no ano 2000, e a conclusão foi a mesma: não dormir mata. Mas os pesquisadores nunca tinham conseguido entender o porquê disso.

A possível explicação só veio no ano passado, em um estudo da Universidade de Surrey, no Reino Unido. Os cientistas mantiveram pessoas acordadas por 29 horas e perceberam uma alteração: o nível de células brancas no sangue delas aumentou bastante, atingindo a mesma quantidade registrada em pessoas feridas. As células brancas são o elemento central do sistema imunológico. Quando você fica sem dormir, ele dispara – o que, em tese, poderia comprometer a habilidade do organismo de combater infecções.

Não é só. “O organismo libera hormônios como cortisol e adrenalina, respostas típicas de situações de estresse”, diz a médica Luciana Palombini, do Instituto do Sono. E isso desencadeia uma série de processos já nas primeiras 24 horas. Primeiro, a pressão sanguínea aumenta. Logo depois, o metabolismo se desregula, e a pessoa sente uma vontade incontrolável de comer carboidratos (um estudo da Universidade Northwestern, nos EUA, constatou que quem dorme tarde e/ou mal tende a ingerir quase 250 calorias a mais por dia). Em seguida, se a pessoa continuar acordada, começam as alucinações. Sim, alucinações.

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Veja o caso do estudante americano Randy Gardner. Em 1965, ele aceitou participar de uma experiência na Universidade Stanford – na qual ficou 264 horas (exatos 11 dias) sem dormir. É a maior experiência de privação do sono já registrada cientificamente; e teve efeitos terríveis sobre o pobre Randy. A partir do terceiro dia, ele começou a perder a capacidade de raciocínio, a ficar paranoico e enxergar coisas que não existiam. Ao final da experiência, Randy dormiu 14 horas seguidas. Segundo apontaram testes na época, não ficou com nenhuma sequela do experimento.

Mas não dormir, ou dormir mal, pode estar na raiz de doenças neurológicas gravíssimas. Num estudo recém-publicado, pesquisadores da Universidade de Rochester, em Nova York, mostram que o cérebro aproveita o sono para fazer uma limpeza – descartando células mortas e moléculas da proteína beta-amiloide, cujo acúmulo impede as conexões entre neurônios e provoca Alzheimer, doença incurável que leva à perda de memória. O que nos leva à terceira função do sono: gravar – e destruir – as suas memórias.

A tranquila

Anna, 25, jornalista, 1,71 m e 68 kg

Sonolenta durante a adolescência e parte da vida adulta, se encontrou depois que passou a trabalhar como freelancer e escolher os próprios horários. “Costumo dormir às 2h e acordar às 10h.”

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Conclusões
1 Pega no sono rapidamente, dentro do esperado (o ideal é que a pessoa leve no máximo 10 minutos para adormecer). 2 Respiração correta, sem nenhuma interrupção. 3 Sono bem dividido entre todas as fases. Exemplo de noite bem-dormida.

O obeso

Eduardo, 36, taxista, 1,78 m e 136 kg

Está muito acima do peso. Por isso, tem bastante gordura na região do pescoço – o que provoca apneia (interrupções da respiração enquanto a pessoa dorme). “Acordo mais cansado do que quando vou dormir”.

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Conclusões
1 Caso gravíssimo, com 620 interrupções na respiração durante a noite. 2 Na pior delas, Eduardo fica espantosos 108 segundos sem respirar – e o nível de oxigênio no sangue despenca. 3 É a pessoa que mais dorme, mas não descansa.

O agitado

Jorge, 32, editor de arte, 1,69 m e 73 kg

Tem o hábito de dormir e acordar bem tarde. Mas seu grande problema é a qualidade do sono. “Após umas cinco horas dormindo, sempre desperto. Meu sono é todo picado.”

Conclusões
1 Sono extremamente tumultuado. Jorge se mexe sem parar, alterna rapidamente entre as fases do sono – e desperta 182 vezes ao longo da noite. 2 Por isso, sonha pouco (e apenas uma vez). 3 Ele não sabia, mas tem apneia – e fica até 30 s sem respirar.

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O insone

Leon, 24, estudante, 1,80 m e 86 kg

Começou a ter dificuldade para dormir há quatro anos, quando entrou na faculdade. Atualmente, dorme às 3h – e acorda para trabalhar às 7h. Ou seja, não dorme praticamente nada. “Nem eu aguento meu mau humor”.

Conclusões
1 Embora tenha um déficit crônico de sono, demora muito para dormir. 2 Passa boa parte do tempo em sono profundo (fase mais importante para a manutenção do corpo), sinal de que está exausto. 3 Fica pouco tempo acordado, e sonha muito.

Sono, sonhos e memória

O seu cérebro não fica ‘desligado’ enquanto você dorme. Longe disso. O sono é neurologicamente agitado, com quatro etapas que se sucedem e se repetem durante a noite (veja no infográfico da página 49). A mais interessante é justamente a quarta, identificada pela sigla REM – “movimento rápido dos olhos”, em inglês. É o momento em que a pessoa mais descansa, e também é a fase em que ela sonha -movendo os olhos rapidamente, como se estivesse vendo coisas.

Quando uma memória se forma na sua mente, o cérebro constrói uma relação semipermanente entre os neurônios envolvidos com aquilo. Por exemplo. Vamos supor que você vá a um churrasco. Está fazendo um sol insuportável, o churrasqueiro deixa queimar a carne, você fica com fome. Mas nem tudo foi ruim – você conheceu uma nova pessoa, Maria, que se tornou sua amiga. Essas experiências todas ativam uma enorme quantidade de neurônios no seu cérebro – os que registram a sensação de calor, os responsáveis por processar cheiros (no caso, de carne queimada) e vários grupos que analisam todas as características da Maria, como sua altura, formato do rosto, voz, cor dos olhos, etc.

E o cérebro fortalece as ligações entre essa rede de neurônios. É como se eles ficassem “amigos”. Passam a se comunicar mais facilmente entre si. Aí, quando você se lembrar de algum detalhe do churrasco ou da Maria, aquele mesmíssimo conjunto de neurônios será acionado – e todos os detalhes daquele dia voltarão à sua mente. É assim que a memória humana funciona.

Mas ela também age enquanto você dorme. Sabe quando você vivencia algo durante o dia, e aquela memória reaparece – muitas vezes exagerada ou distorcida – durante os sonhos? Acontece com todo mundo. Um estudo feito pelo psicólogo inglês Mark Blagrove constatou que os acontecimentos costumam aparecer nos sonhos pelo menos três vezes: na primeira, na quinta e na sétima noite de sono após vivenciados. Mas por quê? E por que as memórias surgem distorcidas, às vezes apimentadas com fantasia e coisas que jamais aconteceram? Existe uma teoria para explicar isso.

É a hipótese da homeostase sináptica (SHY, em inglês), criada por dois psiquiatras da Universidade de Wisconsin. Apesar do nome complicado, o conceito é simples: durante o sono, o cérebro desfaz algumas das conexões entre neurônios, ou seja, ele apaga memórias. O corpo libera ácido gama-aminobutírico, uma substância que enfraquece as relações entre os neurônios e deleta algumas das memórias adquiridas durante o dia. Objetivo: liberar ‘espaço’, capacidade cerebral, para que você continue sendo capaz de aprender coisas novas.

Essa tese foi reforçada por uma pesquisa do National Institutes of Health (laboratório do governo americano), que este ano descobriu algo intrigante. Durante o sono, os neurônios do hipocampo, região cerebral que coordena a formação de memórias, disparam “ao contrário”. Ou seja, eles emitem sinais elétricos na direção oposta de quando a pessoa está acordada. Para os cientistas, isso é um indício de que há memórias sendo apagadas.

Para determinar quais lembranças são menos importantes e podem ser deletadas, o cérebro vê se elas têm ligação com outras informações já armazenadas na sua mente. É por isso que, se você e a Maria tiverem algum conhecido em comum, a chance de que você se lembre dela é maior. Senão, o cérebro irá apagá-la. “Esse processo funcionaria como um desfragmentador de disco no computador, arrumando as nossas memórias”, explica a neurologista Dalva Poyares, da Unifesp.

Esse apagamento supostamente acontece na terceira fase do sono, que antecede os sonhos. Ou seja: quando os sonhos começam, é possível que o cérebro ainda esteja sob influência da destruição de memórias, ou haja resíduos incompletos delas – e isso explique o teor de fantasia nos sonhos. Mas não existem estudos comprovando a relação. Já a conexão entre sono, memória e aprendizado é fartamente conhecida. Diversas experiências demonstraram que nossa capacidade de aprender é maior de manhã, logo após acordar, do que de noite.

Dormir ajuda a aprender. Mas não é só isso. Também é possível aprender… dormindo. Nos anos 70 e 80, essa promessa era muito usada por charlatães, que tentavam vender cursos de inglês “durante o sono”. A pessoa escutava uma fita com lições do idioma enquanto dormia e supostamente acordava sabendo falar inglês. Não funcionava, claro. Mas um estudo feito pela Universidade Northwestern constatou que é, sim, possível manipular – e reforçar – o aprendizado de uma pessoa enquanto ela dorme.

Na experiência, 50 voluntários foram expostos a uma longa sequência de imagens. Cada imagem vinha acompanhada de um som específico (como o barulho de uma explosão, por exemplo). Feito isso, os voluntários foram dormir. Só que metade deles recebeu um estímulo durante a noite. Quando eles atingiram a terceira fase do sono, os cientistas tocaram os sons que tinham sido associados às imagens. No dia seguinte, todo mundo acordou e os voluntários fizeram um teste de memorização. Quem tinha sido exposto aos sons conseguiu se lembrar de mais imagens, e em ordem mais correta.

“Estímulos externos durante o sono podem ter influência (sobre o aprendizado)”, diz o psicólogo Ken Paller, líder do estudo. “A nossa pesquisa mostra que a memória é reforçada, com a reativação de informações durante à noite”, explica o psicólogo Paul J. Reber, coautor da experiência. Ou seja: não é possível aprender algo do zero enquanto se dorme. Mas é possível reforçar, dormindo, a memorização de algo que se aprendeu acordado.

Vale lembrar que a experiência da Northwestern envolve informações triviais (uma sequência de imagens). Não há comprovação, ao menos por enquanto, de que esse efeito se estenda a aprendizados mais complexos, como idiomas ou as disciplinas da faculdade. Não vale a pena dormir ouvindo uma fita com a voz dos seus professores. Melhor garantir uma boa noite de sono. Só que isso está ficando cada vez mais difícil.

Medieval versus moderno

Um estudo da Universidade de Virgínia estudou a rotina das pessoas no século 15, e descobriu que as pessoas costumavam dormir em duas etapas. Primeiro, elas dormiam do entardecer até a meia-noite. Aí acordavam, ficavam despertas por uma ou duas horas e depois voltavam a dormir até o dia clarear. Isso foi comprovado na prática pelo psiquiatra americano Thomas Wehr, do National Institute of Medical Health.

Nos anos 90, ele confinou um grupo de voluntários em alojamentos sem luz elétrica. Eles eram obrigados a realizar atividades durante o dia, com o sol, e descansar durante a noite, por causa da ausência de luz. Após algumas semanas nessa rotina, algo curioso aconteceu: os voluntários passaram a apresentar o mesmo tipo de sono segmentado da Idade Média. E estavam sempre super-relaxados – descobriu-se que, no intervalo entre esses dois sonos, o corpo liberava prolactina, o mesmo hormônio que causa a sensação de relaxamento após o orgasmo.

Hoje em dia, dormimos de outra forma, em apenas um bloco. Isso é um subproduto da revolução industrial, que elevou a jornada de trabalho a 16 horas por dia – e limitou quando, e quanto, as pessoas poderiam dormir. Até hoje, dormir durante o dia é visto com preconceito. “Precisamos descansar. Descanso faz parte da vida. Ele ajuda nossa produtividade, melhora nosso humor e nos deixa mais criativos”, diz a psicóloga americana Sara Mednick, autora de estudos que mostram o efeito positivo da soneca. “As pessoas tomam café para ficarem acordadas e quando chega a noite tomam um remédio para dormir. Será que esse é mesmo o melhor jeito de encarar uma semana de trabalho?”

Por isso, cada vez mais gente toma remédios para dormir. No Brasil, os três medicamentos tarja-preta mais vendidos (Rivotril, Lexotan e Frontal) são ansiolíticos, que acalmam e ajudam a dormir – e, juntos, vendem quase 15 milhões de caixas por ano. O problema é que eles, como todos os remédios que induzem sonolência, podem causar dependência.

A indústria farmacêutica ainda não conseguiu desenvolver uma droga para dormir que seja totalmente eficaz e tenha risco zero. Mas continua tentando. Sua nova esperança é o suvorexant, um remédio que inibe a hipocretina, um neurotransmissor responsável pela vigília. Ou seja: em vez de induzir o sono, como os medicamentos atuais, simplesmente anula a substância que deixa a pessoa acordada. “Estamos entusiasmados, pois a expectativa é que esse remédio não seja viciante”, diz Belen Esparis, médica do hospital Mount Sinai, em Nova York, e uma das principais especialistas do mundo em sono. Mas o suvorexant foi barrado pela FDA (órgão do governo americano que aprova a comercialização de remédios), que pediu mais testes.

Uma solução mais segura, e possivelmente muito eficaz, é um aparelho chamado Somneo. Ele nasceu de pesquisas da Darpa (divisão de projetos avançados do Pentágono), que queria encontrar um jeito de fazer soldados ficarem até cem horas acordados sem sofrer. Não deu certo, mas levou à criação do aparelho, que usa várias técnicas para melhorar a qualidade do sono.

Trata-se de uma máscara que cobre o rosto, as orelhas e parte da cabeça e aquece levemente a região dos olhos – o que, estudos comprovaram, faz a pessoa adormecer mais rápido e passar mais rapidamente à fase de sono profundo. A máscara também permite ao usuário programar exatamente a quantidade de tempo que deseja passar dormindo. Ela tem sensores de eletroencefalografia, que monitoram a transição entre as fases do sono e determinam qual o melhor momento para despertar a pessoa – liberando uma luz que aumenta de maneira gradual. A ideia é que essa máscara seja distribuída aos militares em guerras. Mas, como muitas das tecnologias inventadas para uso militar, ela provavelmente acabará tendo uma versão comercial.

Uma possibilidade ainda mais ousada é manipular diretamente as ondas cerebrais, ajudando a pessoa a se manter dormindo ou pular para estágios mais profundos do sono. A técnica se chama ETCC (estimulação transcraniana por corrente contínua), e consiste em aplicar uma corrente elétrica bem fraca, por meio de eletrodos, em certas áreas do cérebro.

Cientistas da Universidade de Lübeck, na Alemanha, usaram a ETCC para fazer com que voluntários passassem mais rapidamente pelas duas primeiras fases do sono e ficassem mais tempo na terceira, mais profunda e relaxante. Uma experiência similar, desta vez na Universidade de Wisconsin-Madison, mostrou que é possível desencadear diretamente o sono profundo emitindo campos magnéticos sobre o cérebro.

Segundo os pesquisadores, isso significa que seria possível ter os mesmos benefícios fisiológicos de oito horas de sono em apenas seis. Isso seria o equivalente a um mês de vida acordado a mais por ano. Algo extremamente tentador para muita gente. E os voluntários não apresentaram efeitos colaterais. Mas as máquinas necessárias ainda são grandes, caras e seu uso constante pode ter consequências imprevisíveis a longo prazo. Não devem chegar ao seu quarto tão cedo.

Mas existe uma solução para dormir melhor. E não é remédio nem máquina.

A chave do bom sono

Você já deve ter ouvido as recomendações mais manjadas. Faça exercícios. Tenha uma alimentação balanceada. Tente evitar o estresse. Não tome café de noite. Maneire no álcool. Tudo isso é verdade – e é essencial para dormir bem. Mas a epidemia de insônia no mundo tem outra raiz.

O sono é coordenado por um hormônio chamado melatonina. Ela é produzida pela glândula pineal, bem no meio do cérebro, e é a chave do “relógio interno” que nos faz dormir e acordar em ciclos de 24 horas. A melatonina também está presente em outros animais, em plantas e até em micróbios. Ela é um mecanismo que a natureza criou para adaptar os seres vivos ao ritmo do Sol. Conforme começa a escurecer, o organismo começa a liberar mais melatonina – e você sente cada vez mais sonolência, até apagar. De manhã, com tudo claro, o nível de melatonina cai, e você acorda.

Essa é a ordem natural das coisas. O problema é que o mundo moderno, e em especial a tecnologia, estão bagunçando essa ordem. Depois que anoitece, continuamos a ver televisão e usar celular, computador, tablets, etc. A humanidade vive rodeada por telas que emitem luz. E isso desregula o ritmo do organismo. “Como o cérebro não sabe qual a diferença entre luz artificial e a do Sol, ele pensa que ainda é de dia”, diz Simone Petera, especialista em medicina do sono. Com isso, o corpo reduz a produção de melatonina, e a pessoa não consegue dormir bem.

Existe gente que toma melatonina em comprimidos para tentar dormir melhor. Ela não tem registro oficial na Anvisa, mas não é proibida – pode ser encontrada em lojas de suplementos nutricionais. Mas não é recomendada. “A melatonina não é uma pílula para dormir muito boa, pois o organismo já a produz naturalmente”, diz Belen Esparis. Se for tomada em doses erradas, pode atrapalhar o sono. Isso sem contar possíveis efeitos colaterais de longo prazo, como alterações no ciclo menstrual. O melhor a fazer é controlar a iluminação durante a noite – e com isso aumentar naturalmente o nível de melatonina no corpo.

As telas de TV e de gadgets emitem luz de um tipo parecido com a do Sol ao meio-dia. Ou seja: são especialmente ruins para o sono. Mas uma experiência feita pela Universidade de Basileia, na Suíça, constatou que a luz avermelhada, típica do pôr do sol, é muito menos danosa. E você pode regular suas telas para que elas tenham esse tom. Na televisão, basta selecionar o modo “Cinema”. Nos celulares e tablets Android, instalar um aplicativo chamado Twilight. E no PC e Mac, um programa chamado F.lux.

São todos grátis, ou seja, não custa experimentar (no iPhone e no iPad, só é possível instalar o aplicativo F.lux por meio de jailbreak – destravamento do sistema –, pois a Apple não autoriza o uso do programa). E nunca use lâmpadas de luz fria no quarto. Fazer esses ajustes deixa o ambiente mais agradável e dá resultado: o estudo de Basileia mostrou que as pessoas expostas à luz “quente” durante a noite produzem até 40% mais melatonina do que quem recebe luz fria.

Mas à noite o ideal é deixar as telas de lado e ler algo que não emita luz, como um livro ou revista. E, se mesmo assim o sono não vier, não se culpar por isso. Dormir meio mal, de vez em quando, é a coisa mais normal do mundo.

O que acontece no corpo durante a noite

Boca
A produção de saliva diminui e a boca fica mais seca, ambiente propício para a proliferação das bactérias bucais. É por isso que acordamos com mau hálito.

Pele
Quando dormimos pouco, o corpo libera mais cortisol, um dos hormônios do estresse. Em excesso, ele inibe a produção de colágeno, proteína responsável por deixar a pele bonita.

Cérebro
Faz uma limpeza – descartando células mortas e moléculas da proteína beta-amiloide, cujo acúmulo impede as conexões entre neurônios e provoca Alzheimer, doença neurológica que leva à perda de memória.

Músculos
Há liberação de hormônio do crescimento que, dentre outras funções, ajuda a reparar as fibras musculares. Por isso, dormir é fundamental para se recuperar de uma lesão ou após fazer musculação.

Fonte: Belen Esparis, diretora do Centro de Desordens do Sono no Mount Sinai Medical Center (Nova York)

Para saber mais

Dreamland: Adventures in the strange science of sleep
David K. Randall, W. W. Norton & Company, 2012.

Take a Nap! Change Your Life
Sara Mednick, Workman Publishing Company, 2006.

The Slumbering Masses: Sleep, Medicine and Modern American Life
Mathew J. Wolf Meyer, University of Minnesota Press, 2012.

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