Astronauta da Nasa é acusada de ter cometido o primeiro crime no espaço
A bordo da estação espacial internacional, Anne McClain teria acessado a conta bancária da esposa sem permissão enquanto vivia um divórcio conturbado.
Nada de espaçonaves piratas ou cowboys durões tocando o terror pela galáxia. Esqueça o velho clichê do fora da lei espacial que filmes e séries de ficção científica cristalizaram em nossas mentes. Tudo indica que temos o primeiro crime cometido fora da Terra, e ele está longe de ser fruto de algum vilão. Não é nada do nível de um homicídio ou de um roubo. Foi um crime de natureza passional, burocrática. Mas mesmo assim um crime – se comprovado, é claro.
Tão inusitado quanto a própria história criminal é quem assina sua autoria. Anne McClain é militar condecorada e astronauta respeitada na Nasa. Antes de entrar para a agência, em 2013, já era tenente-coronel do exército dos Estados Unidos, tendo pilotado helicópteros de combate por mais de 800 horas na Guerra do Iraque. Na Nasa, ela é (ou era?) cotada para se tornar a primeira mulher a pisar na Lua em 2024.
Mas sua imagem construída em cima de uma carreira exemplar foi ofuscada por uma polêmica envolvendo a esposa, Summer Worden, que trabalhava para o serviço de inteligência da Força Aérea dos EUA. Conforme relatou o New York Times, as duas passaram boa parte do último ano em um processo conturbado de divórcio. A principal causa dos conflitos é um garoto de 4 anos, filho de Worden, que tinha um ano quando elas se conheceram.
Após se casarem, em 2014, McClain insistiu para adotar a criança. A mãe biológica resistiu, mas cedeu. No início de 2018, com o casamento já desgastado, a astronauta foi até um juiz pedir a guarda compartilhada do menino e a prioridade na escolha do lar, caso as partes não chegassem a um acordo no divórcio. Alegou que Worden tinha comportamento explosivo e não lidava bem com as finanças, por isso queria validar o vínculo parental na justiça.
A situação piorou quando, por volta da mesma época, ela postou em seu Twitter fotos com seu traje de astronauta ao lado do garoto. Worden ficou ainda mais ressentida: não queria que ela se passasse por mãe de seu filho em público. Meses depois, entrou com pedido de divórcio e, em outubro de 2018, McClain partiu para a estação espacial internacional (ISS).
Foi por lá que cometeu o suposto delito: acessou a conta bancária da esposa a bordo da ISS para checar as finanças. Worden descobriu que o acesso veio da Nasa e protocolou uma queixa junto ao inspetor geral da agência. De volta à Terra desde o final de junho, McClain prestou depoimento na semana passada e garantiu que estava apenas fazendo o que sempre havia feito, com permissão da ex-esposa.
Ela declarou que não foi avisada de que, depois das brigas, não deveria mais fazer checagens do tipo – e que fez o acesso usando a mesma senha que era dividida entre as duas. Tudo apenas para saber se havia recursos para pagar as contas e para cuidar do garoto. Mas, na visão de Worden, a ex teria ido longe demais: acusou-a de roubo de identidade e quebra de sigilo bancário. Se comprovados, será a primeira vez na história que crimes foram cometidos no espaço.
Autoridades estão investigando para descobrir se as acusações procedem, ou se tudo não passou de um grande mal-entendido conjugal. Fato é que, mesmo que até agora não tenham precisado acioná-los, as cinco agências espaciais envolvidas no consórcio da ISS já haviam criado procedimentos caso crimes fossem cometidos dentro do complexo orbital. E, daqui para frente, a tendência é que essas regras sejam cada vez mais necessárias.
É que a economia espacial está cada vez mais pujante, por isso um número crescente de agências espaciais e empresas privadas desenvolvem atividades no espaço. Países como China e Índia estão se tornando potências espaciais. E uma coisa é certa: onde o homem vai, ele leva encrenca junto. Temos a primeira investigação de um crime em órbita, mas com o voo espacial se tornando rotina, pode ter certeza que não será a última.